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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Um minhoto na Capital

João-Afonso Machado, 16.08.19

VARINO E BOTE DE FRAGATA.JPG

A combinação vinha de longe, meticulosamente preparada. Muito alimentada por sucessivos e desesperantes ataques meus de ignorância, sempre a embrulhar-me nos nomes das terras da Margem Sul. O Mar da Palha era absolutamente excessivo para a minha capacidade de compreensão. Tudo isso a levara, as pulseiras tremelicando num nervoso febril, a essa ideia, quase uma imposição, - correriamos as principais paróquias, navegariamos sob as pontes, até porque no Seixal fora recuperado um varino (- Um varino? O que é isso? - pensei eu caladíssimo), por tuta e meia disponível para todos os fins turísticos.

Embarcámos num início de tarde bastante ventoso. Simpatizei logo com o varino, a sua vela imensa, fui-lhe apresentado aos baldões da proa à popa e, de seguida, mandado sentar porque iamos partir e o Tejo, soprado pelos ventos, não é o cordeirinho que todos pensam. Nos seus calções tão marítimos, com uma t-shirt que era um mapa de Vila Franca de Xira para cá, a minha amiga saberia, com certeza, do que falava. Pelo menos, mexia-se lá dentro sem se bandear, como quem está em casa.

E meia-hora volvida, ante a gigantesca Vasco da Gama, vai de abrir o farnel, papar toda uma sande de chourição e uma mistela gasosa qualquer.

O Tejo, lá no meio, realmente não brinca. Aquilo são mesmo ondas e balanço, um duelo constante com o vento. A gente sente as tripas revolverem-se e, manda a prudência, nos cheguemos ao ar fresco no nariz, na boca, no espírito.

Por isso fugi para a proa, ante a expressão severíssima da minha amiga, sentada entre os demais, a sande de chourição quase finada mas já sem forças para me perseguir.

Mais à distância reparei, as suas cores amareleciam, esverdeavam, o olhar perdia vivacidade a cada oscilação do varino. Então, num derradeiro salto, agarrou-se à amurada e deitou às águas, muito sonoramente, todo o seu lanche de maruja calejada.

Ficou para morrer de vergonha e eu tive pena, tornei à sua companhia,

- Deixe lá, acaba de fazer a felicidade do cardume de tainhas que andar nas redondezas mais próximas...

 

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