Talvez com a rede das borboletas
Não era mais do que uma imagem, o pretendido. Quem diz imagem, diz memória, saudade, um movimento da alma. Algo a enchê-la como antigamente no Avenida, sentado à mesa sobre o passeio, a espreitar o mundo pela grande vidraça.
Era, há muitos anos, o café onde se sonhava a vida. Não o rodeavam prédios, nem o ensurdecia o ruído dos motores. Tal como os carros passavam agora comedidamente, e a luz do sol ia subindo ao longo do torreão sineiro da Matriz velha. Num ápice de imaginação, surgiu uma pequena lá perto, no adro, mais a sua bicicleta, foi um fogacho com quase cinco décadas, preocupada, apressada - Faz-se noite, são horas, os meus pais estão à espera...
O sol despedira-se do torreão. A pequena da bicicleta levou-a o Tempo. O mais foi o futebol na televisão, algo de incompatível com esse antigo sonhar. Facto inédito, o Avenida tornou-se barulhento.
Será por se tratar de um dia cinzento. Outros virão, talvez com uma rede de apanhar borboletas e uma pontinha de jeito. De argúcia, para, em silêncio, enredar o sonho, a imagem, uma lágrima qualquer de saudade.