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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Na Grécia, de comboio de Tessalónica a Atenas

João-Afonso Machado, 28.10.20

Meus caros conterrâneos, fui conhecer a distante Grécia, enquanto a pandemia ainda nos deixa circular no mundo. Uma viagem longínqua, cansativa, até ao extremo desse mitológico País. Estacionei a mochila em Tessalónica (a sua segunda cidade) e, rapidamente, acertei uma deslocação ferroviária, contornando os mares, até à capital Atenas.

Conviria ter presente, no mapa, os caprichosos recortes do território… que eu corri de norte a sul.

Como quer que seja, - fui. Cheguei a Atenas, mais de quatro horas no comboio, através de uma paisagem nada diferenciada, vale dizer, um fundo de montanhas despidas, nuas e secas, sem vivalma, como pano de fundo e, aos pés do viajante, uma estranha planície, por norma sáfara.

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Não que totalmente improdutiva. As máquinas agrícolas de grande porte davam nela em nuvens impenetráveis de poeira, e daí sairiam a ervilhaca, o milho, senão mesmo o algodão.

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Mas tudo – quão longe do nosso Minho ubérrimo! Além de alguns canais acastanhados de rega, ao longo de todo o percurso topei, apenas, um rio como nós os concebemos – largos e corredios de águas.

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E sempre fui congeminando de onde vinha a electricidade para aquelas depauperadas gentes, porque barragens, ali, - tão simples quanto no Sahara… Valer-lhes-á o baixo consumo de um povo que se amontoa, em mais da metade nacional, na histórica Atenas!

E o trem (dificuldade minha, chamar comboio a uma composição assim) prosseguia caminhos. Sem modernidades, apenas andamento. Nessa paisagem conformadamente igual, a planície, a ervilhaca, o milho, o hipotético algodão, ao longe o domínio dos deuses, os cumes carecas, o Olimpo, Zeus reinando entre os seus. Felizmente dormindo, sem disparar raios e coriscos… E o conta-quilómetros sempre a somar.

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De quando em vez, o trânsito por quaisquer urbes anunciadas em amachucados perímetros industriais e muita sucata. Nas estações ferroviárias, o amontoado de compridos atrelados de vagões de carga apodrecendo em ramais sem movimento. Mas que Grécia é esta? – perguntava-me – cheia de ferrugem e abandono, sem museus para tais antiguidades, sem vontade, assim desleixada…

E, no horizonte, o Olimpo (uma Serra da Estrela desarborizada mas levantada como uma árvore no meio do nada) e outros lugares montanhosos, privilégio de descanso dessa imensa genealogia de deuses helénicos. E, cá em baixo, a ervilhaca, o milho, quiçá o algodão dos seus veneradores.

Ora agora ou depois, o comboio parava em qualquer estação. Como em Larisa, cidade de algum peso; como em Tebas – a célebre polis de antes de Cristo, sábia, guerreira, - um quase tacanho apeadeiro. Estacado o comboio, lá ia sobrando o tempo para uma cigarrada fumada cá fora, na gare. Para umas fotografias também. À vista de maquinetas de reparações na ferrovia.

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Nesta Grécia sem parelha, perdida entre os muitos mares da sua história mediterrânica, ficou ainda a miríade de ilhas a que não cheguei. E sobre a estação final – Atenas?

Ora! Arredores à parte, a de V. N. de Famalicão mete-a num bolsinho. Mais não seja em traços arquitectónicos e limpeza do chão.

(Os gregos sabem o que passaram, e do que têm de se levantar. Vão lá cinco anos… Oxalá os portugueses não esqueçam, andaram muito perto de tal desgraça – de que se safaram graças a gente, à boa maneira da Antiguidade grega, agora ostracizada…)

 

(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 28.OUT.2020)

 

 

"No Dia Mundial do Alzheimer"

João-Afonso Machado, 30.09.20

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Muito me apraz aqui invocar o Dia Mundial da Pessoa com Doença de Alzheimer 2020. Conforme ele foi vivido entre nós, cidadãos famalicenses.

Falou mais alto, foi de rasgos, a Associação Casa da Memória Viva de V. N. de Famalicão, com quem me orgulho de colaborar; mediante duas iniciativas que levou a cabo: a primeira, no passado dia 21, uma sessão no auditório da União das Freguesias de V. N. de Famalicão e Calendário tendo por mote a apresentação do programa Estou Aqui Adultos. No fundo, um meio organizado para a ajuda de doentes afectados nas suas faculdades mentais por qualquer tipo de demência, e desprovido de teias burocráticas, a todos acessível e muito bem explicado em “pagelas” – panfletos – nas quais a nossa Polícia de Segurança Pública teve um papel maior.

Assim a movimentação seguinte, de sábado, 26 de Setembro, decorreu em parceria com a PSP. Tratou-se de distribuir à população – nessa manhã agitada de mercado – nas ruas do centro da cidade, bolsas porta-máscaras protectoras do Covid. Gratuitamente, é claro, como produto de uma parceria com as empresas Batist Medical, FVD, NAC Contabilidades E NPrint. Em cada abordagem, a entrega do equipamento e a prestação das necessárias informações para o utilizar.

A ACMV dispôs, como referi, do auxílio das forças de segurança pública. Neste quadro será sempre de realçar a extraordinária proximidade, sem dúvida vinda de trás, dos elementos policiais – in casu o Chefe Silva e o Agente Braga – e dos muitos cidadãos contactados, que todos se pareciam conhecer da mais sã convivência no dia-a-dia. Parceiros de sempre… Valeu a simpatia, o diálogo franco com quem passava – gente habituada, decerto, a políticos, burlões, vendilhões e outros pedinchas – para, às primeiras palavras, os destinatários se interessassem sem reservas acerca do que lhes era oferecido ruas abaixo, e conversassem e brincassem ou falassem dos seus receios.

O lema dessa manhã foi oportunamente apelidado Famalicidade é… pensar inclusivo e agir solidário. Há certos neologismos que caem mesmo bem! Famalicidade!... - a justaposição da urbe e da qualidade que todos queremos para ela. Do Largo Tinoco de Sousa até à Praça D. Maria II, muito foi comentado e distribuído. O concelho vive dias difíceis de pandemia, não como não deixar o nosso contributo. Mesmo porque, agora e sempre, saber tratar de nós é o caminho mais seguro para a protecção dos indefesos nossos familiares, vivendo lá em casa ou, até, em locais de apoio onde se resguardem.

Em suma, uma manhã de sábado assaz movimentada. E mais um passo que a ACMM deu, conforme os seus objectivos. Acreditem os famalicenses, mesmo bem ciente de quantas dificuldades se lhe atravessam ao caminho, a ACMM está cá para prestar a sua desinteressada ajuda. Digo-o com a independência de quem nela não detém qualquer representatividade ou poderes decisórios – sendo certo, abracei com os fundadores este projecto; e, acredito, com o empenho que vejo ser demonstrado, no devido tempo todos nos reuniremos em seu torno, como um inquestionável lugar de salvaguarda dos necessitados.

 

(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 30.SET.2020)

 

 

"Álvaro Marques - o edil"

João-Afonso Machado, 16.09.20

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Completaram-se agora 127 anos (o Tempo é, realmente, uma sanguessuga!), nascia em Famalicão Álvaro Folhadela Marques: foi a 4 de Setembro de 1893 e não demorou, pela falta prematura do seu Pai, a vida dos negócios da Família lhe fosse confiada e o obrigasse a assumir a gestão da Casa Folhadela & Cª.

 (Uma era tão tranquila – no fundo, tão recuada! – que ainda se vivia não aflitamente em mercancias de responsabilidade ilimitada – os compêndios jurídicos assim expliquem em detalhe o sentido desta afirmação…)

E esses os tempos de uma urbe famalicense ainda adolescente, a pedir vitaminação, forças para chegar a hoje e a amanhã. Quem lê os jornais de então, dá conta de um punhado de patrícios acima de tudo apostados em fazer crescer a terra e em musculá-la para que diante de ninguém baqueasse. Álvaro Marques era indiscutivelmente um deles. Talvez o maior.

Pelo menos, uma personalidade vincada, pragmática e decidida a fazer obra. Não se lhe conhecem outros compromissos políticos que não os com a sua gente. Teria a confiança da II República – no termo de muitas hesitações, isso é sabido, - depois de passar pela vereação municipal e alcançar – por nomeação governamental - o grau de Presidente da Câmara, em 1945. E nesse cargo se manteve, ininterruptamente, até à sua morte súbita, partida que pregou a familiares e conterrâneos em 30 de Outubro de 1957.

Mas esses 12 anos foram, na história da edilidade, a dúzia dourada das intensas novidades. Por tal forma que ainda agora a praça principal, diante dos Paços do Concelho, ostenta o seu nome. Sem que alguém o questione.

Vivia no alto da Rua Camilo Castelo Branco – lembro bem a sua casa – rodeado de jardins com portal para a Rua Direita. Tudo veio abaixo há décadas, ficaram fotografias e memórias, um pouco de saudade da nossa velha vila e uma correnteza de prédios a ocupar esse espaço. É claro, já Álvaro Marques debandara há muito para um destino melhor, tão certo quanto a meta que alvejava em cada uma das imensas vezes que apanhou o comboio e foi a Lisboa, à Administração Central, reclamar pressa nos melhoramentos planeados para Famalicão.

(Sim, de comboio, sem avião, sem Mercedes, sem chauffeur, nem à partida, nem à chegada. Sozinho, em qualquer hotelzinho.)

Chamava-se a pessoas assim – “bairristas”. Um termo extinto na nossa imprensa: um termo, aliás, agora, em plena “globalização”, algo mal conotado. Na altura, o sinónimo de alguém que prezava, sobretudo, os interesses e o desenvolvimento da sua terra. E que punha esses objectivos acima dos seus, pessoais. Neste andamento, Álvaro Marques impulsionou a construção da cadeia no Talvai, dos passeios da Rua Adriano Pinto Basto e da Avenida – hoje – 25 de Abril; dos acessos à escola primária e à sua cantina e da edificação de muitos estabelecimentos do ensino básico no concelho; do embelezamento da actual Praça D. Maria II; e do imprescindível estádio futebolístico…

Mas muito mais: surgem, por então, novas artérias viárias; o “edifício de rendas económicas” da Rua Eng. Fernando Ulrich, a Avenida Humberto Delgado dos nossos dias; e “Bairro” que foi, deixou, e voltou a ser “do Cardeal Cerejeira”…

A coroar o bolo, o Mercado Municipal, a servir até ao ano transacto, e agora em remodelação. Todavia, seja ela como for, o Mercado Municipal sempre permanecerá sempre, talvez funcionando em moldes diferentes, - o mercado de Álvaro Marques.

Durante o seu prolongado mandato ocorreram os terríveis incêndios nos velhos Paços do Concelho. É também nele que o arquitecto Januário Godinho apresenta o seu vencedor projecto para um novo e arrojado edifício camarário. Álvaro Marques, porém, já não assistiria à sua inauguração, em 1961…

Nas caminhetas, os mais novos ouvem ainda, dos mais idosos, agradecidas invocações deste nosso edil. É de justiça! De resto, não numa caminheta, mas num restaurante, ouvi há pouco, de um deputado lisboeta, que Famalicão é um dos chamados “municípios-modelo”. Ainda bem!

 

Da rúbrica Ouvi nas caminhetas in Opinião Pública de 16.SET.2020)

 

 

"Minhotos arcoenses a salvar em Lisboa"

João-Afonso Machado, 09.09.20

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Quem se lembra do Tollan há de contar não menos de trinta anos. Muito rapidamente, - o Tollan era um porta-contentores britânico que, no Tejo, precisamente defronte ao Terreiro do Paço, colidiu em 1980 com um navio sueco. Virou-se ao contrário, o “bicho” era enorme, maior do que a maior baleia, e quatro tripulantes morreram no acidente. Ano após ano, de barriga para o ar, bizarreou a melhor fotografia da nossa Capital, sem que alguém soubesse tirá-lo dessa flutuação de cadáver. (E, muito provavelmente, as autoridades esperando alguma tempestade o levasse rio abaixo até às profundezas do oceano, contando não atropelasse, na travessia, qualquer cacilheiro ou outra embarcação…)

Em finais de 1983, com a sempre necessária ajuda germânica, o casco do Tollan foi finalmente removido. Criara, entretanto uma imensa geração anedotária: até em Vila do Conde a vanguardista arquitectura (Siza Vieira) do BPI, valeu ao edifício o epíteto de Tollan. Este é um exemplo, além do qual encontrei, recentemente, para as bandas de Alfama, um pequeno restaurante, o Tolan, de seu nome.

Eu não gosto de comer em casas complicadas.

Logo intui, não seria o caso do Tolan. Além do resto, uma efeméride, a nostalgia dos meus vinte anos… Assim determinei: almoçaria – almoçaríamos – nesse velho poiso. Umas excelentes pataniscas de bacalhau, adiantemos já. Com farinha, sim, mas com o gadídeo a dar-lhes corpo. (Vão saber o que é um “gadídeo”, espécie ictiológica com pera…) E com cebola quanto bastou e um senhor arroz a fazer-lhe companhia. Sem maçadores a palrar em redor. Alfama dormia a sesta. A invasão turística em trégua, rendendo preito ao meu bem-estar. Gosto de bons e diversos sabores, mesa sem salamaleques, preços que não me esganem o orçamento… Não preciso de restaurantes elitistas para saber estar como deve ser… E dou preferência aos de pinga não mais cara do que o prato, com pouca gente e pouco barulho, lugares simples mas acolhedores..

Somente a D. Glória, a patroa, sempre respeitosa e prestável, não deixava o sol iluminar-lhe o semblante. E havia nela uns restos de sotaque que não me enganaram. Já quase na sobremesa, sempre lhe fui perguntando – A senhora não é lisboeta, pois não?

Não, não era. Era – confirmando a minha ideia – minhota, dos Arcos de Valdevez. Iam lá quase quarenta anos… Abrira o restaurante com o marido, precocemente levado por um AVC, agora a crise, o negócio indo para o fundo, onde estavam os germânicos e os britânicos?... E as lágrimas a correrem-lhe nas faces…

- Oh! D. Glória, venha aqui! Fale connosco! Isso é nada! – A minha Amiga, estarrecida, multiplicava-se em ditos de encorajamento, algo que não vai muito comigo. Porque lendo (creio que o P. Varillon), soube perceber que o menosprezo do sofrimento é a pior ofensa que fazer se possa a um sofredor. Portanto, quando clamei, em voz alta, - D. Glória! – foi mesmo para a trazer à mesa e confirmar com ela, a vida é como o mais manhoso dos bodes.

Falámos muito, chegámos até a equacionar o seu regresso aos Arcos. De qualquer modo, futuros almoços ou jantares em Lisboa seriam prometidamente no Tolan, mesmo – ou sobretudo – com grupos maiores, gente em peso a encher-lhe a casa (e os meus desgraçados ouvidos…).

A D. Glória sentou-se connosco, desabafou, a minha Amiga foi mimoseada com um “tu” e com o tratamento de “amor”, “ó filha”, “minha flor”, and so on. Eu não, decerto por contenção imposta pela minha branca cabeleira, por qualquer atitude paternalista de que tivesse abusado…

Terminámos o almoço com uma excelente ginjinha, oferta da D. Glória. Não tarda regresso a Lisboa, e à sua porta não deixarei de bater. Os meus conterrâneos, indo à Capital, façam o mesmo. Por todas as razões imediatas e pelo nosso sangue minhoto!

Procurem a localização do Tolan no FB, que ele tem página nessa enciclopédia.

 

(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 09.SET.2020)

 

 

"Os bolarecos da D. Alexandrina"

João-Afonso Machado, 26.08.20

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Andando eu doentinho, era certo o mimo da minha Avó: as bolinhas de coco, ora brancas, ora amarelas, conforme enroladas em clara ou em gema do ovo. O coco! Esse fruto empedernido e capaz de, ao cair do alto do coqueiro, rachar a cabeça a qualquer paisano! Nas Áfricas longínquas, não ali, transformados em raspas brancas, niquinhos que cobriam essas bolinhas e lhe davam um sabor especial. Quase ninguém gostava de coco lá em casa, pelo que a lata de bolachas que a Avó enchia era minha e só minha, sujeita ao mais descarado ataque, sinal de reconhecimento pela sua inspiração culinária. Sem zangas… Mais a mais, a Avó era a minha madrinha….

Depois, os anos  tomaram o freio nos dentes, um certo dia à Avô o coração disse mais não, eu, rapaz novo, triste, inconformado, fui distraindo essa lacuna de modos diversos – um deles com as éguas da Casa, cavalgando as redondezas - deixando os anos galopar muito mais depressa, até sentir o peso do corpo e dos sessenta, o título de sexagenário, suponho saudável mas mais guloso do que nunca.

Contei-o já:  quando descobri e comprei o meu palácio em Famalicão topei em frente o restaurante Portuguesa, o meu spkear’s corner. Futebol, política e coisecas da terra. É onde regularmente almoço ou lancho e janto.

Não que seja um lugar de variadas sobremesas. Mas há ocasionais surpresas. A mais recente das quais, os bolarecos da patroa, a D. Alexandrina.

Um passo fundamental para a História famalicense. Evidentemente, não posso revelar a receita. Apenas direi, o doce é feito a partir de um tipo de bolos de feira, iguais aos que o nosso trolha de antigamente nos oferecia quase todos os dias, difíceis de rilhar, mais duros do que a dentição, bolo penoso de duração indeterminada na sua deglutição. Somente, ali aparecem moles e saborosos. Recheados de marmelada por dentro e polvilhados a coco por fora. As tais raspas, a caírem do prato, que a gente depois com os dedos apanha e saboreia. O bolareco da D. Alexandrina, das pedras do deserto transfigurou-se num doce o mais apetecível que este mundo nos consegue proporcionar.

O fenómeno atinge, aliás, maiores proporções. Numa rápida incursão histórica pela Ordens religiosas de cá, descubro o mosteiro de S. Francisco, em S. Martinho do Vale, muito empreendedor na confecção de hóstias. E nada mais! Ora, sendo a D. Alexandrina uma santa senhora, os seus bolarecos tem, inquestionavelmente, de ascender ao estalão e à qualidade da doçaria conventual. Ela não se importará, pode até mudar-se o nome do manjar – secretos de anjinho, por exemplo; ou maminha do mesmo

Depois será o costumeiro percurso: a feira dos produtos artesanais, o reconhecimento dos forasteiros, a glória Europas e Asias fora. E uma latinha deles para cá. Por este meu modesto contributo… Ou talvez não: é deixar a minha dilecta sobremesa na sua fonte. Lá continuarei a banquetear-me. Avante, Portuguesa! Casa nobre de acepipes únicos.

Era o que, no outro dia, uma gordalhufas exaltada proclamava na caminheta: pela próxima quarta-feira iria lá por uma saca toda de bolarecos. Ah, pois!

 

(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 26.AGO.2020)

 

 

"Vagas de calor"

João-Afonso Machado, 22.07.20

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Fui a Baião, mantendo o ritual de, na A4, atravessar a serra de Valongo em chamas. Como dispenso o ar condicionado, de janelas do carro abertas para arejar lá me sujeitei a um belo pedaço de fumo nas narinas, no corpo inteiro. É a época da romaria dos incêndios, assim será sempre, não há pandemia que lhe imponha o confinamento.

Enfim, Baião também esturricava, mas de puro calor ambiental. Felizmente o restaurante era amplo e fresco, os filetes de pescada óptimos e o branco da casa condizia com eles, espertíssimo, muito refrigerado. Verde, claro, note-se Baião ainda é Minho, ainda é da nossa Região Demarcada, mesmo que nos confins desta Província de eleição. Conquanto muitos o queiram já no Douro (dizia-me um homem de lá de Baião, até ao Douro vão mais cinco ou seis graus centígrados…), só porque em Lisboa o incluíram no distrito do Porto. O mesmo seria dizer, Cabeceiras e Celorico são Minho e Mondim é Trás-os-Montes, quando tudo é Basto e outra vez vinho verde…

Desci aos fundos do vale do rio Ovil. Cercado de granito (lá está, ali não topamos manifestações xistosas...), em plena Rota do Românico, naquela baixa rondando os 40º, uma pingadeira, uma sauna autêntica. Consegui, ainda assim, regressar a Famalicão, onde idêntico programa me aguardava. Pela noite fora…

Não fosse começar já a transpirar, aproveitaria para recordar com saudade as vagas de frio, a minha samarra, a mantinha nos pés. Mas, por amor de Deus, tragam a ventoinha, a vaga é, insuportavelmente, de calor – sem termo à vista. A sul, a rapaziada marimba-se no Covid19 e ruma aos magotes as praias. Por aqui, procura-se um nico de sombra e de aragem em qualquer bosque que, por acaso, não esteja a arder. Ou então, fecham-se as persianas, as vidraças e aguarda-se a chegada das estrelas para pôr o nariz fora de casa. Até lá, guiados pelo instinto, de liana em liana, corredor fora, por sucessivos copos de água na cozinha. Ou na nascente, como queiram.

Mas, em boa verdade, não será caso para dramatizar. A vaga de calor, dentro do bunker de cada um, é boa conselheira da leitura e da escrita, de qualquer filme que valha a pena. No pesado silêncio da canícula, as ideias às vezes chegam às conclusões. O trajar caseiro tropicaliza-se, a tanga transporta-nos aos Havais da nossa imaginação. E cessa a proibição de pôr os pés em cima do sofá. O panorama caminha aceleradamente para a descontração carioca, oh areais de Copacabana!

Somente, a vaga de calor leva-nos mais lesta o ânimo. Triste serão o de sábado, com o Famalicão de vitória já no bolso, a ceder um empate ao Boavista... São noites pior dormidas, uma tristeza que se abate sobre nós com o termómetro a fazer pressão, maldoso, e a gente sem posição, sem sono, sem vontade, com nada!

Por todo o Parque da Devesa, o olhar comprometido da ausência quase geral. Julho já cheirando vagamente ao seu estertor. Agosto a caminho. Quem irá para fora? Poucos, decerto. Mas, sendo o mês das nortadas, que ao menos a vaga de calor se ponha a andar para longe. Em Setembro? Nos tempos que correm tanto pode nevar como, uma vez por todas, frigirem os nossos miolos.

 

(Da rúbrica Ouvi nas caminhetas, in Opinião Pública de 22.JUL.2020)

 

 

"O «Vivas» na R. Vasconcelos e Castro"

João-Afonso Machado, 09.07.20

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Abriu em 1965, sob a batuta do Sr. Isac Vivas, como pensão e restaurante. O que fazia todo o sentido porque – os mais velhos estarão lembrados – ali, na Rua Vasconcelos e Castro, estacionavam as caminhetas oriundas de todos os pontos cardiais. Chegavam de Braga, de Guimarães, do Porto, de Santo Tirso, da Póvoa de Varzim… Ou para lá se dirigiam, e em Famalicão carregavam e descarregavam. Na dita artéria ou na vizinha Alves Roçadas. Por isso, a animação constante nestas bandas, com as muitas empresas de camionagem a marcar garrida presença: as do Abílio (a marca famalicense), do Marinho, do João Carlos Soares, a Pacence, a Ferreira das Neves… Haveria esperas, atrasos, a fome do almoço, pernoitas, até. Para tudo isso, o Vivas  chamava, convidava, ali ao lado, mesmo à mão de semear.

Tudo mudou. Veio a “Central”, vieram os autocarros, muito menos chocarreiros, corredores de longas distâncias, não raro de vidros fumados, já não há janelas que se abram, nem cabeças de fora num último adeus. Muito menos bagagem empoleirada no tejadilho daqueles foguetes de auto-estrada. A Rua Vasconcelos e Castro esmoreceu, perdeu movimento, e o Vivas teve de se adaptar. Transfigurou-se em café. E assim continuou vivendo, agora já na idade dos 55 anos.

Em 1994, entretanto, faleceu o Sr. Isac Vivas. Os filhos prosseguiram o negócio. Talvez, no ramo, o mais antigo de Famalicão.

Mas não é só. O Vivas soube manter, até hoje, quase tudo do antigo e saudoso café. Ali se regista o totobola e o euromilhões, ali se compram raspadinhas e se sonha com fortunas fáceis e repentinas. Ao balcão, enquanto o Sr. Carlos manipula a maquineta, os clientes numa ânsia de casas novas, da piscina, das viagens, do Ferrari. Ou talvez apenas de uma vidinha mais folgada, com nada de ais! e ralações.

No Vivas se lê o jornal ou toma uma meia de leite a empurrar a torrada. Demorando a manhã inteira, sem pressa, contemplativamente. De portas amplas para a rua, ainda ali se fuma um cigarro e se assiste e discute acesamente o futebol. No Vivas, os ecrãs são vários e tamanhões, apontando em simultâneo a muitos continentes e campeonatos.

Só agora, com este diabo da pandemia, o Vivas fechou temporariamente o seu bilhar. Um snooker, ainda de muitas tardes de uso e disputa. Mas continua com o que eu já considero uma arte, um requinte, algo difícil de encontrar por aí – uma boa caneca, fresquinha, de cerveja de pressão.

São assim os quietos momentos passados no Vivas, de olhar no passeio onde andarilham memórias antigas; ou lendo o jornal, ouvindo novidades que surgem aos soluços, sem altura certa, ora vindas daqui, ora de além; ou, quando não, assistindo a uma empolgante partida de futebol. Agarrando a caneca pela asa, como há décadas nas cervejarias do mundo académico. Sorvendo mais um gole como se me espreguiçasse até esses anos já tão longínquos. Impera a calmaria, o mundo perdeu subitamente a pressa. Ressalvando o cliente de quem se ouve a voz, convicto a tentar a sua sorte nos milhões…

 Aconteceu até um dia ali realizar parcialmente esse belo sonho de uma fortuna rápida – comprei uma raspadinha e ganhei vinte euros!

 

(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 09.JUL.2020)

 

 

A Monarquia pelo Minho - V. N. de Famalicão

João-Afonso Machado, 05.07.20

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No meu regresso a Famalicão, terra das minhas origens, depois de longos anos de ausência, fui reencontrando ou conhecendo pessoas, recriando ou criando novas amizades, enfim.

A breve trecho, já me organizava entre grupos vários e casas de comer e frequentava uma animada tertúlia das mais diversas proveniências políticas.

V. N. de Famailicão é uma cidade, um concelho, de trabalho e modernidade, onde não é provável encontrar alguém invocando vetustas raízes e tradições nobiliárquicas dos seus antepassados. É esse o contexto ideal para avaliar certas e determinadas convicções de princípios ou de ideologias.

Sem nada pedir ou perguntar, os meus conterrâneos, amigos de longa data ou mais recentes, vieram tendo comigo, versando o Ideal que jamais abandonei, e já era meu quando daqui parti para a minha vida profissional. Sabiam-me um indefectivel da Monarquia. E manifestavam, então idênticas convicções. Em alguns casos, reconheço, para imensa surpresa do meu lado. Mas – sempre sem nada pedir ou perguntar – fui ouvindo essas vozes todas. Gente inconformada, saudosa de uma História com o garbo de antigamente, revoltada com o Presente, descrente do Futuro. E espantosamente bem informada, de alma devota ao nosso Rei.

Assim reforcei contactos, criei até um grupo comparsa. Da boa conversa, de permanente renovação de fé. Pelo menos em dois restaurantes, começando pelos seus proprietários e prosseguindo nos comensais, o debate pauta-se pela sintonia – para Portugal, a Monarquia!

Ficou-me a crença, não é o tempo de institucionalizar, ou de programar o que seja, em função destas boas ideias. Mas apenas de deixá-las fluir. De resto, intentasse eu tal propósito, o meu anarquismo nato – invoco o saudoso Camossa Saldanha!... – em nada ajudaria a formar estruturas e hierarquias.

Não, por mim, e por aqui, será assim o nosso pensamento. A nossa fidelidade à Coroa. Afinal, o nosso Reino.

Chamem-lhe tolice. Mas à gente da minha terra não proponho mais do que prosseguir e sonhar um diferente devir. O que é muito mais do que pouco. Queremo-nos assumidos e somados para o dia do grande Ideal.

O qual, acreditamos, chegará. Paulatinamente, conforme vou sustentando perante os meus pares famalicenses, depois de uma IV República, necessariamente de transicção. Algo em que todos, creio, deviam pensar. Uma IV República que substituirá a sua desgraçada, miserável, antecessora, caindo sem parar de podridão. Uma República com outra gente, menos fechada, em que a El-Rei sejam proporcionados os meios de se apresentar como uma alternativa capaz de vencer o lixo maçónico que nos tolhe.

Para já, vai sempre crescendo a ala dos menos enérgicos, talvez, mas categoricamente afirmando – em caso de referendo voto na Monarquia...

 

(Publicado na Real Gazeta do Alto Minho, nº 24)

 

 

"Pintassilgos"

João-Afonso Machado, 25.06.20

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Fui e vim. De Chaves a Faro, pelo interior do País. Quase diria, através de um outro país, tão mais calmo, tão mais saudável. Foram seis cansativos dias de estrada que muito valeram a pena.

Curiosíssimo o culto, sempre crescente, em torno do marco do km 0 do percurso, em Chaves. Já com direito a uma rotunda só para ele. O mesmo acontece em Faro, no meco do km 738, igualmente venerado num altarzinho, um espaço em calçada de calcário, com o número célebre a negro gigantesco no chão. E, ao lado, o restaurante, as sardinhas esplendidamente assadas, o repouso após a travessia.

Por toda a estrada percorrida bem se notavam as viaturas equipadas para esta “chegadela” ao fim do mundo; e, sobretudo, dezenas e dezenas de grupos de motards, quer para norte, quer para sul, firmando a natureza turística da EN2, cativando já as atenções dos comerciantes locais.

No Pedrogão Pequeno, por exemplo, muito lá no fundo da Beira, o hotel “era deles”. De uma quantidade incontável de motas de grande cilindrada, estacionadas no seu parque. Aquilo era bando internacional, romaria maior do que a da Senhora da Agonia.

Claro que este roteiro, este passeio, não é só estrada. A estrada será mesmo o de menor importância, recordando tanta terrinha onde parei, peguei na máquina fotográfica e me entretive umas horas conhecendo ou reconhecendo.

Assim aconteceram momentos, às vezes pormenorzinhos, que me encheram e me fizeram sentir tão distante do quotidiano, Referiria, para ilustrar, as bôlas de Lamego, as vistas do Douro, os filetes de polvo de Tondela… A maravilha que é a pequena, esquecida, vila de Góis; as belezas de Castelo de Vide e os pintassilgos dos seus jardins. E fico-me por aqui, dispensando comentários acerca da imensidão alentejana, a travessia do mundo perdido que é a serra do Caldeirão, a marcar a fronteira com o Reino dos Algarves.

Prosseguirei retornando a Castelo de Vide e aos seus pintassilgos. Um dos mais alegres e coloridos pássaros canoros, uma maravilha por lá tão frequente quanto por estas bandas o nosso pardal. Foi essa a minha imediata comparação, uma lástima!, afortunadas as terreolas apintassilgadas.

E havia-os cá. Recordo sempre a minha Avó referindo os pintassilgos, a sua mescla de negro, amarelos e vermelhos, a arte de os apanhar vivos com visco – uma espécie de cola espalhada nos ramitos das árvores onde poisavam, e já não levantavam voo, agarrados àquele grude. Depois, o seu destino era a gaiola e o dever de trinar até envergonhar os canários.

Outros tempos. Engaiolá-los seria uma maldade. Gozá-los à solta, nos nossos espaços arborizados, um privilégio. Lembro também um falecido vizinho dos meus tempos no Porto, em plena cidade apanhando-os com redes quase invisíveis que embatucavam o seu voar. Depois, era dinheiro contado a sua venda ou a dos “traçados”, os filhos dos amores entre canários e pintassilgos.

Continuo na minha: para nada disso eu os queria cá. Queria-os somente para os ouvir, os fotografar, os apreciar, fosse na Praça 9 de Abril, fosse em Sinçães, acima de tudo houvesse-os na Devesa, com a todas as condições de sossego, alimentação e reprodução. Famalicão, a capital nortenha do pintassilgo! Além dos têxteis, a riqueza minhota única dos pintassilgos.

Hei de consultar os entendidos. Mas estou em crer, umas dezenas deles soltos na Devesa tornariam a nossa terra muito mais vistosa e cantante. Com passarinhos do tamanho de um badego, mas imensamente mais bonitos. Que nem uns loucos de volta das sementes de girassol – outra componente de cenário à maneira… – agora que a polícia apreende as fisgas e puxa as orelhas à catraiada sua detentora…

 

(Da rúbrica Ouvi nas caminhetas in Opinião Pública de 25.JUL.2020)

 

 

"EN2"

João-Afonso Machado, 10.06.20

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Ouvi nas caminhetas – Mas, afinal, o que é isso da Estrada Nacional 2? - E embatuquei. Fui estudar.

Conheci lições mais difíceis. Aprendi, e fiz um plano para a primeira oportunidade, que chegou agora. Estou de saída.

Ao tempo em que lerem estas linhas – a imprecisão resulta dos feriados próximos – se não houver novidade, andarei entre a Beira Baixa e o Alto Alentejo. Será quase uma semana de passeio, as minhas férias no exterior do Interior, e o decalque de rotas já conhecidas, há muito não transpostas, de mistura com umas tantas novidades. Falo, mais precisamente, da dita travessia da EN2, de Chaves a Faro.

Segundo me informei, a mais longa estrada europeia, e a terceira mundial. Para todos os efeitos, a versão portuguesa da famosa Route 66, que vai da ponta Leste à Oeste dos EUA. Atravessando quatro fusos horários, creio. Aqui, a gente é menos exuberante e, de resto, viaja de norte para sul – somos um país de simplesmente humanos… A obra tem a assinatura do Eng. Duarte Pacheco, ministro da II República.

A EN2 percorre, com bastante precisão, a espinha central do mapa nacional. Na problemática sanitária dos nossos dias, segue o percurso mais inocente, mais alheado da epidemia. É hoje uma rota corriqueira de peregrinação, – não religiosa – mesmo a pé, e já valeu, a quem a fez, alguns prémios literários. Deixo aqui a menção, bastante de cor, de alguns pontos do percurso. Em Chaves, descobre-se o célebre marco rodoviário que é o sinal de partida – está lá escrito: «Km 0»; e a referência a Faro, outros quase 800 para baixo. Assim, ouvindo-se dado o tiro do arranque, com passagem pelo Vidago, Santa Marta de Penaguião, Vila Real, Régua (prometi à minha “pendura” um desvio por S. Leonardo da Galafura, um dos mais exuberantes miradouros portugueses, sobre o Douro), Castro Daire, S. Pedro do Sul, Viseu, Penacova, Coimbra, Góis… A Beira vai em metade… Depois, Vila do Rei, Oleiros, a Sertã, Abrantes, a travessia do Tejo, a Ponte do Sor, o Alentejo imenso, S. Brás de Alportel, já nas serranias algarvias, e finalmente Faro.

Evidentemente, espero trazer ampla documentação e vasta fotografia de um Portugal que não é imenso (vem-me à ideia o meu filho mais velho, um aventureiro, e a sua travessia da Sibéria à boleia…) mas diversíssimo de região para região. Porque elas são muitas, envolvendo a paisagem, o clima, as gentes, os costumes. Resulta disto tudo a derivação para Castelo de Vide, Marvão e Portalegre, lugares de já tão distante memória.

Mais a mais, todos sabemos o que o Tempo é capaz, o que nos espera pela frente. Prenunciadamente, diferenças que desorientam, espasmos no GPS. Por tudo, o resultado de uma “prova” inconstante e difícil. Mas, creio, valerá a pena. Portugal é as vinhas do Douro, as serranias da Beira, o planalto, a solidão da Beira Baixa e do Alentejo. É um coração, um corpo de todos nós. É gente pobre, idosa, perdida entre as montanhas. Se dissesse ia conhecer o desconhecido, mentiria. Vou antes revivê-lo, voltar a sentir o distante de umas dezenas de quilómetros da azáfama litoral. E se trouxer provas dessa crua dualidade, duas em duas – o meu testemunho de povos tão perto, mas afinal tão distantes e diferentes; e o meu incentivo a que os famalicenses, em alternativa ao mar, vão conhecer os rios. Onde eles nascem e crescem e os nossos precisam de nós.

 

(Da rúbrica Ouvi nas caminhetas in Opinião Pública de 10.JUN.2020)