Na Grécia, de comboio de Tessalónica a Atenas
Meus caros conterrâneos, fui conhecer a distante Grécia, enquanto a pandemia ainda nos deixa circular no mundo. Uma viagem longínqua, cansativa, até ao extremo desse mitológico País. Estacionei a mochila em Tessalónica (a sua segunda cidade) e, rapidamente, acertei uma deslocação ferroviária, contornando os mares, até à capital Atenas.
Conviria ter presente, no mapa, os caprichosos recortes do território… que eu corri de norte a sul.
Como quer que seja, - fui. Cheguei a Atenas, mais de quatro horas no comboio, através de uma paisagem nada diferenciada, vale dizer, um fundo de montanhas despidas, nuas e secas, sem vivalma, como pano de fundo e, aos pés do viajante, uma estranha planície, por norma sáfara.
Não que totalmente improdutiva. As máquinas agrícolas de grande porte davam nela em nuvens impenetráveis de poeira, e daí sairiam a ervilhaca, o milho, senão mesmo o algodão.
Mas tudo – quão longe do nosso Minho ubérrimo! Além de alguns canais acastanhados de rega, ao longo de todo o percurso topei, apenas, um rio como nós os concebemos – largos e corredios de águas.
E sempre fui congeminando de onde vinha a electricidade para aquelas depauperadas gentes, porque barragens, ali, - tão simples quanto no Sahara… Valer-lhes-á o baixo consumo de um povo que se amontoa, em mais da metade nacional, na histórica Atenas!
E o trem (dificuldade minha, chamar comboio a uma composição assim) prosseguia caminhos. Sem modernidades, apenas andamento. Nessa paisagem conformadamente igual, a planície, a ervilhaca, o milho, o hipotético algodão, ao longe o domínio dos deuses, os cumes carecas, o Olimpo, Zeus reinando entre os seus. Felizmente dormindo, sem disparar raios e coriscos… E o conta-quilómetros sempre a somar.
De quando em vez, o trânsito por quaisquer urbes anunciadas em amachucados perímetros industriais e muita sucata. Nas estações ferroviárias, o amontoado de compridos atrelados de vagões de carga apodrecendo em ramais sem movimento. Mas que Grécia é esta? – perguntava-me – cheia de ferrugem e abandono, sem museus para tais antiguidades, sem vontade, assim desleixada…
E, no horizonte, o Olimpo (uma Serra da Estrela desarborizada mas levantada como uma árvore no meio do nada) e outros lugares montanhosos, privilégio de descanso dessa imensa genealogia de deuses helénicos. E, cá em baixo, a ervilhaca, o milho, quiçá o algodão dos seus veneradores.
Ora agora ou depois, o comboio parava em qualquer estação. Como em Larisa, cidade de algum peso; como em Tebas – a célebre polis de antes de Cristo, sábia, guerreira, - um quase tacanho apeadeiro. Estacado o comboio, lá ia sobrando o tempo para uma cigarrada fumada cá fora, na gare. Para umas fotografias também. À vista de maquinetas de reparações na ferrovia.
Nesta Grécia sem parelha, perdida entre os muitos mares da sua história mediterrânica, ficou ainda a miríade de ilhas a que não cheguei. E sobre a estação final – Atenas?
Ora! Arredores à parte, a de V. N. de Famalicão mete-a num bolsinho. Mais não seja em traços arquitectónicos e limpeza do chão.
(Os gregos sabem o que passaram, e do que têm de se levantar. Vão lá cinco anos… Oxalá os portugueses não esqueçam, andaram muito perto de tal desgraça – de que se safaram graças a gente, à boa maneira da Antiguidade grega, agora ostracizada…)
(Da rúbrica Ouvi nas Caminhetas, in Opinião Pública de 28.OUT.2020)