Ericeira
A história desta praia está quase no seu cinquentenário. Para trás ficará muito mais, pelo meio feitos miríficos do Progresso. Regressar à Ericeira só tinha um sentido - o de procurar lugares de antigamente, enveredar pela arqueologia das recordações, trazer cá para fora, irreconhecíveis de tanta poeira, todas essas múmias da sensibilidade. Desde logo, o Hotel, um poiso para outros bolsos mais tilintantes:
O mar era bravo, coalhado de colchões Repimpa, o surf ainda não nascera cá. O areal muito encolhido e povoado. O jagoz vagueava mais pelo norte, e a capelinha de Nossa Senhora da Boa Viagem é uma presença inequívoca entre as gentes da pesca.
Vieram abaixo muitos cafés de então. Muitas edificações. Foi necessário andar de lupa na mão, o velho cinema tinham-no abatido... Mas a Casa da Cultura Jaime Lobo e Silva continua no seu posto:
Embora a Ericeira fosse mais a brincadeira, o Nita, a Paula e o Carlos Gramanhas, tantos nomes que as décadas dispersaram entre a vida e a morte. E as ruínas do moinho no cimo da colina que sumiu na voragem da construção civil. As ruas em gravilha, o dia em que a bicicleta me atirou ao chão e o Dr. Peralta me tapou a rótula com seis pontos. E o Caga-Baixo, o homem mais pequenino do bairro. Tudo assim galopando a minha cabeça ao atravessar o Jogo da Bola
nessa tarde de sábado, como se ainda agora ali fossemos pelo jornal, por um sorvete, por umas ferraduras, que eram o almoço dos dias de praia numa Ribeira de Ilhas de água, areia e rocha e de muito poucos só.
Cantando e rindo a cantilena do imorredoiro Gabriel Cardoso - "Ericeira, onde o céu é mais azul / Das belas praias do Sul (...)".