A pontinha de cinismo
A casa naquele alto, tinha vista para o rio e para o mar. Espreitava a capelinha, ficava perto da religião, e ouvia o trautear dos motores antigos, sempre simpáticos, nada metediços, quase sempre apontados aos mistérios do Sul. A casa era um posto avançado das gentes de cá, um fortim, e um eremitério, o paraíso.
Lembro-a assim, como se todos os dias saísse às compras à sombra das árvores na avenida. Até o Tempo dar nela como na camada de ozono.
Tudo se transformou. A casa viu-se cega e cavalgada por prédios maiores, asfixiantes, e definitivamente apartada do rio e do mar. Enlouqueceu. Deixou-se vender, conheceu muitas mãos no pouco asseio de sucessivos estabelecimentos comerciais. Até desistir e gozar hoje, com justificado cinismo, a atrapalhação dos homens em razão do seu destino naquele lugar que só o diabo quer.