Greve total
Com eles a greve foi radical. Prolonga-se há já uns anos, sem termo à vista. Os ardinas calaram de vez os seus pregões. Abafados pelo vozear de uma cidade simplesmente transformada em multidão aos encontrões.
Como não ser saudosista? Foi para esquecê-los que alguém se lembrou de erigir a estátua do ardina? Cá em baixo, na Praça da Liberdade, em plena esquina dos Congregados - onde era um sem parar das suas sacolas e de títulos, nos idos dos matutinos e vespertinos...
O coração tripeiro batia diferente, então. Talvez mais jovialmente. E muito ritmadamente. Por exemplo, pela voz da Alexandrina do Portal, comunista dos quatro costados, garrida como os Avantes sempre presentes na sua banca de jornais. Mas quando a Câmara questionou a legalidade do seu estabelecimento (armado e desarmado todos os dias, à chuva ou ao sol, claro), não houve na Baixa quem não se pusesse do lado dela, ai de quem tirasse dali a Alexandrina! Levou-a somente a idade, em data que perdi, na certeza de ter sido muito bem recebida lá em cima.
Ou pelo plurigeracional hábito do lanche na Arcádia. No fim do dia, saídos do escritório do Patrono, ainda advogados estagiários, uma cervejita e um olhar em redor, a ver quem estava... Chegaria, entretanto, o eléctrico, a pardalada chilreando ensurdecedoramente nas árvores da Praça, bombardeiros implacáveis sobre as paragens dos transportes públicos. Era noite, urgia regressar. E sempre assim foi, até as manhãs e as tardes terem cessado na Praça. Numa greve geral e final.