E chegar lá?
É uma caminhada longa, penosos caminhos, floresta densa. E depois, a clareira. Antigas luras de raposas, tantas recordações de infância, e os penedos, sóbrios, hirtos, num silêncio sem fita métrica que o alcance. Um castelo? Um esconderijo? Uma fortificação? Nada disso, apenas a Natureza. Aqui, onde a rocha não sedimenta nem metamorfoseia, emergiu um dia, sabemos nós quando...
E poucos são os que chegam a estas penedias. Esconde-as o tempo. Escondêmo-las nós, na nossa aversão às devassas. Esconde-as o arvoredo, a cujo nascimento o granito assistiu, esconde-as a lenda, a fábula, o mistério das suas formas.
Porque Endovélico ainda era deus quando um dia descansou à sombra delas. Digo eu. Porque muitos foram as maltas de gatunos que se atalaiaram entre os blocos, de bacamarte apontado a qualquer triste almocreve. Porque não ia embora o cheiro das ginetas, quando - aqui d'El-Rei! - as capoeiras do vale levavam sucessivas razias nocturnas. Porque, também, ali emboscado o guarda-florestal (querido velho Amigo Luís! jamais esquecido!) de arma aperrada fazia a sua espera ao predador, o piopardo, como ele lhe chamava.
Relatos é o que por estas bandas mais se iguala à água das fontes - na sua fartura. Mas a vivência, a proximidade, o contacto, isso, por muito que muitos insistam, é reservado a muitos menos - a nós e aos nossos, tudo abrangendo a confiança e a amizade. Bens raros, esparsos, visiveis nos gestos e geralmente pouco palavrosos.