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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

"Lá longe, ao cair da tarde"

João-Afonso Machado, 19.05.20

Dos mais bonitos poemas e cantares do fado de Coimbra (e não venham com histórias, Coimbra tem o seu fado, o dos estudantes, - estudantes há muitos..., é por isso mesmo, - como só na Lusa Atenas podia ser fabricado), um desses mais bonitos poemas e cantares, dizia, está nas estrofes que se seguem, sendo que desconheço a autoria desta proeza escrita e pautada:

Lá longe, ao cair da tarde,

Vejo as nuvens de oiro

Que são os teus cabelos

 

Fico mudo ao vê-los,

São o meu tesoiro,

Lá longe, ao cair da tarde.

 

E vou lembrando aparições, no tom prolongado do fado, serenas aparições de gamos em pastos domésticos a cortarem-me as palavras, quase acreditando em divindades da Antiguidade greco-romana.

IMG_2730.JPG

Se calhar na avidez de uma vida diferente, anacrónica. Onde o que é impossível não seria. Num ocaso inesquecível, o início de uma nova era:

Lá longe, ao cair da tarde,

Quando a saudade

se esvai ao sol poente

 

Como canção dolente

De uma mocidade,

Lá longe, ao cair da tarde.

Seria o retorno de andanças antigas. E a paz do olhar da mulher mais bonita.

(Passeiam-se meninas lindíssimas, namoradeiras, nesta vista tão vesga, voltaria ao namoro delas as vezes que fosse preciso.)

E ao resto, seriam caminhadas, espingardas, os cães e o pão e chouriço, o vinho mais a água da fonte. (Uma fonte, ambrosia!) Seria outro planeta, ou este começado do início. Mas seriam pessoas, animais, a pureza do ser, o ameno regresso a casa e antes a benção do Reverendo Abade a ofertar a mesa, chá e torradas, ladrilhos de marmelada. Tudo "derivado" (como sempre escreve Lobo Antunes) ao gamo, jovem mas já a querer pôr-se nas burras, o malandro.

Lá longe, ao cair da tarde...