A ameaça
Foram uns tantos dias. Falava-se, comentava-se, estava para chegar ruindade das grandes. Muitos eram os que já se refugiavam entre as suas paredes, de olhar nos buraquinhos das persianas, quem viria lá?
Não era de aceitar viver no medo. Ainda menos na subalternidade. Por isso se proclamou livre e independente. E foi aos seus afazeres, como se nascesse outra vez, perseguido embora por esse choro estranho de que foram tantos dias.
Tantos dias lodosamente escorregadios de palavras, repetidas, embrulhadas, sem rumo, tudo querendo, nada contendo. Desesperadoramente insistentes. Tantas horas do mesmo, e um nevoeiro cerrado, traiçoeiro. Conhecia a história do canto das sereias, seguia atento aos sinais. E mesmo na borda do abismo, surgiu-lhe como um semáforo a flor sanguínea, de uma natureza generosa e prudente. Stop!
Deste modo contornou a ameaça. A ruindade era, realmente, das grandes e o estado de emergência foi declarado logo de seguida. Mas já a salvo estava.