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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

A procissão

João-Afonso Machado, 26.07.19

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O terreiro povoado de barracas de comes e bebes, além do enigmático quiosque, fechado, calado, um morto que nunca foi vivo, ainda por cima em lugar de destaque, é impossivel não esbarrar na sua inutilidade. Entre um pão com chouriço e uma mini, vou tentando perceber o que sucede: estou na minha terra onde nunca assisti à procissão do Senhor dos Aflitos.

Já não são muitos os meus conhecidos. Os membros das bandas musicais deambulam por ali, em breve cerrarão fileiras de instrumentos em riste. Ao fundo, na capela, os andores aguardam quem lhes pegue, e os fieis entram e saem, deixam as suas esmolas. Hoje serão muito poucos os que trabalham na freguesia.

O silêncio das devoções mais compenetradas anda absolutamente arredio. No cimo das escadas do cemitério, o povo posiciona-se para ver melhor. Surgem dois militares da Guarda infelizmente Republicana a cavalo, envergando a farda de gala. Irão eles na dianteira das solenidades.

Assim a procissão parte da capela, e à capela regressará, depois de um percurso a incluir um troço de estrada nacional. Sob o pálio os dignitários da Igreja, os responsáveis autárquicos vão na sua peugada. À passagem do andor do Senhor dos Aflitos, sente-se, finalmente, um murmúrio de emoção.

A procissão entrou já em casa. Não demora, os guardas trancam os cavalos no camião e abalam para o quartel. O terreiro esvazia de gente, anoitece, é a hora da janta. Das bandas fica sobretudo a saudade de algumas carinhas larocas de executantes suas.

Luzes multicoloridas são acendidas, recheando a capela toda. A animação está de volta e culminará com estrondosa sessão de fogo de artifício.

Mas, claramente, a minha terra não leu A Procissão do António Lopes Ribeiro...