Uma autobiografia que é muito mais
O menino que nasceu pobre, mais velho do que eu, já não sei como foi. Somente lembro o homem assisado e integrado entre os seus. Poderia ser diferente, poderia dar-lhe para o revolucionarismo. Estávamos numa época onde os homens sofridos tudo reclamavam aos céus: a paga das dores, a "injustiça" de outros não se esganarem assim.
Amadeu Peliteiro, um meu conterrâneo, caminhou um doloroso trajecto. E corajosamente, contra a fome que indigna. Neste seu livro - O Menino que Nasceu Pobre - vai a pormenores, narra os furtos de laranjas, uvas e quejandos, o seu modo de sobreviver. Deixando claro, a fruta, apenas pendurada nas árvores, é alimento, antes de ser propriedade. E eu, da sua freguesia, lamento a idade que nos separa, quanto lastimo a pobreza próxima da minha indiferença.
As históris sucedem-se. São muitos capítulos de privações de uma família numerosa a quem a boa vontade dos pais não chegava para aliviar um dormir encravado. No dia após, mais recolha de pinhas e lenha para a lareira, mais fruta afanada das árvores da vizinhança.
Lê-se a sua escrita simples e compreende-se. Respira-se de alívio ao saber do seu primeiro emprego. Vamos, com ele, nos dias da esperança.
Há o casamento, os filhos, um tempo melhor. a casa própria, o carro, os estudos dos filhos. Um saudar breve à vitória. E muitos anos de malandrice, as mais ousadas partidas, fosse a quem fosse. Esse é o capítulo da sua veneração pelo F. C. do Porto. Enfim, a reforma por via da idade. Mais o triunfo profissional da sua prole.
Hoje, com 80 anos de idade, Amadeu Peliteiro é feliz. Só o passado não é esquecido pelo presente, nos caminhos de um futuro que será o dos seus também.
O Sr. Amadeu Peliteiro faz o favor de ser meu amigo.