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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Uma novela desconhecida de Camilo

João-Afonso Machado, 25.03.18

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Estacou no vento, pregado entre duas ameias, a cartola enfiada quase na nuca. E ficou assim minutos intermináveis de silêncio de palavras. O génio não é de comentar, muito menos censurável. Depois Camilo fez, enfim, meia volta, como um militar em solenes exéquias, e jurou Jacques de Molay vivo, ele e os outros cavaleiros templários que conseguiram iludir Filipe o Belo e alcançar refúgio nos castelos da Terra Fria transmontana.

Era uma novidade. Seria a realidade. Foi Camilo, dissertando.

A minha mão ainda lhe segurou o cotovelo, temerosa de que tudo acabasse ali. Camilo repeliu o amparo, como se a pena já riscasse o papel.

- E assim, para todo o sempre, os abnegados homens do Templo escaparam às fogueiras da cobiça, juntando as forças estafadas no calor da nossa Ordem do Hospital. Mas não convinha fosse público onde se refugiara o Mestre e os seus próximos. Os confins da Europa eram os limites do Mundo. Ora, na falta de limites deste, quem escapa à morte morre jamais.

Estávamos em Algoso. Demasiadamente alto para o atormentar com Templários, cavaleiros de Cristo e Hospitalários. Fiquei-me por El-Rei D. Dinis.

- Pois, não eram estes tempos em que a humidade nos tolhe os braços e os franceses deixaram a sua prudência ao lume das suas fogueiras e das dos seus condenados...

Camilo farejava em todo o espaço aquela momentânea liberdade no cimo de Algoso. Já não via, mas sabia-os, os castelos vizinhos. O vento assobiou com mais estridência como se fosse uma ordem. Profetizou muio ouro e outros minérios preciosos escondidos nas margens do Angueira. A descida seria morosa, arriscada, a ponta da bengala ia à frente como uma escolta. Aceitou o meu amparo do seu braço, e simplesmente deixou fugir:

- Estes meus olhos, já frios, amortalhados no hábito dos franciscanos...

O regresso foi a vida toda de Molay e dos outros cavaleiros do Templo em Algoso. Páginas e páginas de novela galopando entre o Mogadouro e Vimioso. Camilo escrevia com a sua voz cava, escrevia em almaço de memória, a bengala sempre espadachim com o chão, não fosse dar-se o impossível, algum erro de grafia.