O outro Natal
Sofrera recentemente um grande desgosto e creio não fazia segredo - o Natal para ela acabara, com quem festejá-lo? Reservara um quarto num hotel para dois dias e, longe de tudo e de todos, aguardaria o fim da comemoração maior da família. A sua eram os seus colegas de trabalho.
Ouvi respeitosamente, sem quaisquer comentários. As pessoas gostam muito mais de se sentirem compreendidas do que de conselhos e incentivos que ricocheteiam sempre nas suas mágoas.
E fui pensando em presépios. Nesses das ruas sem vozes nem passos, perdidas entre uma multidão voltada para si mesma, onde não se vislumbra a estrela dos Reis Magos, nem outros indicadores de um caminho, aliás, sem destino.
O Natal também é assim. O contraponto dos avós, filhos, pais e netos deliciados entre rabanadas e mexidos, saciados de bacalhau. Não, aqui era um hotel, um quarto, a televisão a massajar as dores e uma vontade enorme de retomar o quotidiano. Só para que não fossem tão relevantes as diferenças, só para recuperar a fala, a companhia de alguém no cafezinho matinal.
Escrevo estas linhas pensando gratificantemente muita gente dirá hoje - o pior já ficou para trás. Segue-se a passagem de ano, no fundo uma garraiada apenas. Aonde vai quem quer.