Tamel - notas de um estado de choque
De manhãzinha, com as dimensões de um moderno atentado à facada, tão em moda nessas capitais todas, mas não por radicalismo religioso; antes familiar e judicial. Quatro infelizes degolados mortalmente, mais um bebé perdido a dois meses do seu nascimento - este o fruto espremido do que as televisões transformaram numa monumental melancia a render o dia inteiro. Se estive lá? - Estive, sim senhor, mas só a observar os que estavam.
Desde a paragem da camioneta, coalhada de mulheres de telemóvel em punho; até ao início da Travessa de S. Sebastião, que a GNR mantinha entrincheirada - lá no topo, a parte visivel de uma das casas onde ocorrera um homicídio, e a água descendo a sarjeta, garantiram-me, ainda tingida do sangue das vítimas.
Marcaram presença todos os emblemas televisivos e jornalísticos. As câmaras, aos molhos compactos, apontadas com precisão à GNR entrincheirada. Ai do soldado que ousasse levantar a cabeça, dar um passo à frente!...
O presidente da Junta acossado por entrevistas a sucederem-se umas às outras, dando já manifestos sinais de exaustão... - Esta gente é cá da freguesia? - perguntei a um circunstante. - Não, não conheço a maior parte das caras. Souberam pela televisão e vieram....
E foram ficando... Nos quintalórios em volta serviam lugares sentados à sombra. O Tamel hoje era só ali. Sem hipóteses para o trânsito automóvel. Num insaciável fervilhar de comentários, ouvi enfim, ajuizadamente, - A nossa terra logo havia de ficar conhecida por isto!
Vim embora ainda a buscar outra imagem da terra deles, dos do Tamel. Encontrei-a numas pedras antigas caladas - tristes mas com futuro pela frente. Por esse mundo fora não há só tiros e navalhadas, também haverá boas e oportunas obras...