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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

De um momento brilhante de escrita

João-Afonso Machado, 25.01.17

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Quando li, de Mia Couto, «pescar é um verbo muito longo. Tão longo e fundo como um rio», ouvi finalmente, em palavras assim simples, o segredo fascinante das águas. Tudo o que somos nós mesmos, a nossa fonte e a nossa natureza. Não há como não explicar deste modo a minha cana de pesca aos dez anos, um olhar sempre curioso da margem para o mistério de onde vimos e onde não sobrevivemos. O enigma da massa líquida, o ânimo de não ressequirmos, «verbo muito longo», muito, pouco ou nada em movimento.

A expressão da acção. A sua distância e profundidade, a descoberta do berço - «tão longo e tão fundo como um rio» - e da nossa identidade.

Por isso, o mar, os lagos, os deltas e os riachos. Com toda a relatividade que pode equivaler um atum a uma truta. Por isso, também. o justo temor das albufeiras, precipícios de sinal contrário em que vagueiam restos antigos de vida, talvez o fantasma do arvoredo de outrora, ávidos da ignorância ou da ingenuidade dos que neles imergem. A enrodilhar-se-lhes nas vestes.. Desorientando o peixe que é o sustento da carne. Matando aldeias e os seus mortos e hortas e culturas, sejam estas o pão para que forem.

«Pescar é um verbo muito longo». Decerto como "espelhar", na infinidade dos seus reflexos.