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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Por aí...

João-Afonso Machado, 29.09.16

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Quero todos os garantidos cem anos da vizinha dos meus sonhos, tão constantes, desse dia em que a casa era finalmente minha e delas. O interior eram latidos e a soleira da porta o canário. Entre as caçadeiras e as perdizes nunca deixámos de negociar a paz com o bichano da velhinha. Não é outro, o sentido da vida.

 

 

Saudade da vila ao lado

João-Afonso Machado, 27.09.16

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Enfim deixo as ideias sem hora de regresso. No café do largo principal está a vida inteira para o boletim do totobola, hoje reuniu o conselho de ministros, todos participam na elaboração do orçamento. Ainda um dia seremos ricos, a concertação social bem sucedida depois do senhor abade dar o seu acordo, pois sim, mas nunca esquecendo as obras do adro, olhai a torre sineira...

Alguém lhe disse com o sino nada, nem as badaladas do relógio nem a má nova dos defuntos. Concordo. Porquê dar assim corpo às ideias sem hora de regresso? O orçamento quase pronto e desanuviado do déficite, haverá saúde, lazer, aforro, investimento... Está lá tudo rigorosamente a cumprir, e mais uma cerveja a selar a promessa do cumprimento. Traz também outra! E outra! E mais outra para mim!

São muito os ministros. O café não receia os estados vizinhos, a pizzaria e o supermercado, claro, o largo principal não escapa ao fenómeno da emigração, mas só os mais novos se aventuram, é para eles esse comer italiano, e os outros... parece desapareceu aquele vento frio que os levava tão cedo.

Por isso alimento as ideias sem hora de regresso. Era mais uma cerveja, se faz o favor! Para onde regressar da vila onde só toquei de raspão nos arredores? Obrigado... e, já agora, um saquinho de amendoins... é, desculpe lá!... Em que rua virar depois da primeira à direita e da segunda à esquerda, se me apartam do largo principal? Eu pedi uma cerveja, não uma fachada imensa, ajanelada, avarandada, a entrada no topo do escadório do lado de lá o muro. E queria ter ido aonde não fui, queria o coração da vila em vez da ponta dos seus pés com tampões nos ouvidos por causa do ruído dos automóveis.

(Fica para a próxima, meu filho, assevera o senhor abade, cheio de palpites para o totobola, subitamente um génio financeiro, uma alma caridosa, ó rapaz traz depressa mais uma cerveja para este amigo aqui).

 

 

Como o flautista de Hamelin

João-Afonso Machado, 23.09.16

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Num conseguidíssimo sktech no programa DDT, o humorista Manuel Marques (que não é fascista), parodiando Mariana Mortágua, soltou em dado momento um monumental e muito agressivo zurro, como resposta dela a uma qualquer interpelação.

Ao contrário do que se possa pensar, os burros não são estúpidos. Antes os caracterizam a obsessiva teimosia e, quando incomodados, a sua propensão para o coice. Mariana Mortágua, politicamente, é assim mesmo. Nem podia deixar de ser, estão-lhe no sangue os assaltos a bancos para financiar a "luta popular", o esbulho/cooperativização/destruição da Torre Bela e outras traquinices do seu pai.

Mas Mariana Mortágua em si mesma não é um problema. Nem ela nem o seu já célebre imposto. O problema é a total ausência de escrúpulos de Costa, de quem sobretudo se sabe pactuará com o diabo, se necessário (quanto mais com Mariana!), para manter a sua profissão de político.

E o problema - maior ainda - reside em ser cada vez mais perceptível Costa não cairá da cadeira do Poder tão cedo. Principalmente se a gente séria que há no PS não der uma ajudinha. Portugal, a propósito, lembra o conto dos Irmãos Grimm, O Flautista de Hamelin - esse encantador de ratos com a sua flauta. Não é que nós, portugueses, sejamos ratos - mas como podemos caminhar assim encantados, hipnotizados, para o precipício onde o gaita-de-foles Costa, apoiado numa Esquerda puramente anti-Direita, nos conduz?

 

 

"Um mês de festas"

João-Afonso Machado, 22.09.16

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A Feira do Artesanato já lá vai. Ficou-me na memória o sabor de uns frasquitos de compota e de uns bolos chegados de uma qualquer banda lusitana. Mais a promessa de umas sandes de leitão aqui perto, é o leitão famalicense a crescer para o rival bairradino, quero provar dessa bulha. Mais ainda o belo efeito de algumas peças talhadas à mão, às vezes vestimenta, roupagem para o frio oriunda de onde ele tirita mesmo a sério. O Artesanato é sempre uma tarde bem passada, muito embora em prevenção constante, não surja de repente o fungagá para cima do palanque. Há gostos para tudo, claro, e eu também tenho o meu – que não se conjuga com uns recantos abarracados, supostamente restaurantes de campanha, a bivacar no alcatrão esburacado do recinto. Que o mesmo é dizer, do parque de estacionamento de todos os dias. Talvez se possa fazer melhor, relvar a janta para outro local, sem a ameaça iminente do show musical e do público entusiasmado em aluvião.

Enquanto não, a festa prossegue em casa, tranquilamente, saboreando os frasquitos de compota e os tais bolos de parte lusitana incerta. Ao meu gosto, legitimamente, – como ora se acrescenta sempre – ao gosto de quem prefere jantar no sossego da tasquinha, com tempo para as azeitonas todas do pratinho que vem logo com o empregado e a ementa; ou então deixar-se estar no aconchego do lar.

Enfim, manda e faz quem pode o que pode. Eis agora que se anuncia a Feira Grande de S. Miguel. E sobre ela…

Fui aos meus arquivos fotográficos de há uns dez anos. Quando a Avenida de França vivia o reboliço das provas de trote travado. Aquele comício de garranos mais ou menos amestiçados que, com grande pena minha, parece ter ficado para a História. Porquê? Porque não reavivar essa disputa do tempo das máquinas analógicas nestes dias das digitais, e lançar um prémio para as mais conseguidas representações fotográficas? Avenida abaixo, avenida acima, parelhas após parelhas, naquele compasso nervoso, travadinho, muito suado… Com as corridas terminando invariavelmente junto à mesa do júri (já de cabeça em água…), em reclamações exaltadas, seja porque o vencedor havia de ser eliminado por galopar, seja por o eliminado jamais ter entrado no galope… Isso sim, era um barulho interessante de se ver!

Mas, afora o trote travado, subsistem as atrelagens, as demonstrações de alta escola equestre, a beleza portentosa dos concursos de gado bovino. Mais os petiscos, as desgarradas, toda a justíssima folia de quem se despede do Verão e entra no ano agrícola. Um ano, acrescente-se, muito mais honesto, discreto e sofredor do que os seus congéneres: o fiscal, o lectivo, o civil, o judicial… Um ano a incentivar e a proteger, portanto, – talvez criando o “Dia do Ano”, assim como já se descobriu o “Dia da Árvore”, ou o “Dia do Pijama”.

Volvendo à Feira de S. Miguel. Lá nos aguarda a garraiada ou a apanha do porco, quem lhe puser as mãos e não o deixar fugir leva o bicho para casa. A Feira (a Feira Grande, como sempre lhe chamámos) é o momento alto das festividades lúdicas famalicenses. Da já distante adolescência ficam os carrinhos de choque – em pista, não em arena – em que ensaiávamos a perícia de futuros corredores, os matraquilhos e as barraquinhas de tiro ao alvo, sempre de pontaria aos SG Gigante presos por duas fitas de serpentina. Eram as tentações do Demo, instaladas em Famalicão com quinze dias de antecedência, a esvaziarem-nos até à seca total os nossos já muito desertificados bolsos. Ainda haverá disso? – corridas, pontaria e bolsos desmoedados?

Havia – e continua a haver – as concertinas, a malga de vinho e o pão com chouriço, o gado todo enfeitado, umas tantas tardes em que me perco em visões e recordações. E as noites de cantorio e altifalante, as tais que eu passo, mas desejando sempre à comunidade, neste novo ano agrícola, – umas boas festas!

 

(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 22.SET.2016).

 

 

O convento perdido

João-Afonso Machado, 20.09.16

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Depois desses anos todos de andarilho, sobravam ainda no papel da fotografia os muitos séculos do convento esquecido. Onde teria sido? E a memória negava-se, foram quase outros tantos séculos, talvez uma década de uma vida só, sem localizar, sem sequer uma ideia de qual caçada, nas Beiras sim, mas aonde?

Deu-se a ressurreição, enfim. É para isso que servem os jantares com os amigos. Tornou a luz das ideias e desse bocado da manhã, provavelmente depois dos tiros, ao longo de uma estrada para sítio nenhum, nem uma motorizada, uma bicicleta, são agora bem presentes os dois burricos pastando junto ao murete de pedra. Castelo Rodrigo, Santa Maria de Aguiar! E o silêncio absoluto das portas fechadas.

Uma festa! O reencontro das minhas pegadas. Mais a súbita lembrança de uma AVNI (ave voadora não identificada) - não identificada nem atingida - demasiadamente rápida sobre a copa das árvores, o disparo, o único do dia, a escorregar no penedo, quase caindo, a caça fugira toda, faltava somente a penosa subida até aos carros e o almoço de que nada sobrou, sequer a ementa, o lugar, a conversa, o regresso. Nada, a não ser o eco mudo da minha deambulação pela estrada de ninguém em Santa Maria de Aguiar, Castelo Rodrigo.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 18.09.16

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Há-de ser da agitação de uma partida com ponteiros do relógio, rigores da vida, que o regresso jamais será feliz. Resta então por companhia a inconsciência do Tempo. Ou a sua inconsistência, como se migalhas fosse.

 

 

Uma ideia deste tamanho

João-Afonso Machado, 17.09.16

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À procura de uma ideia descobri o NSU em volta de algo também. Ligeirinho, o motor num tom de voz de outros tempos, outras paragens. Havia-os mais acelerados, da cor das laranjas, recordo-os perfeitamente, uma ou duas gerações depois, em plena maré deste Verão que é como se já tivesse ido. Também os NSU partiram. Alguns seguindo com os seus donos o norte dessa estranhíssima rosa-os-ventos, hirta, infinita e desconhecida; outros somente por força de uma explicável transfiguração em que acordaram Audi um dia.

Estava eu nestas congeminações quando a ideia surgiu inopinadamente. Amanhã viajo. Com destino e prazo certo e só por umas horas irreconhecível - vou a um casamento; preciso ir buscar o fraque.

 

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 14.09.16

PUEBLO.JPGSim, sim, jamais esquecerei essas horas tórridas, a infernal noite e o silvo de uma poeira de água incapaz de assentar em nós, padecentes. Valeu-nos a cerveja e a vontade de não morrer. Apenas porque havia razões para regressar.

 

Resposta em duas rodas

João-Afonso Machado, 12.09.16

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Ali muito perto da sua tragédia a perguntar-me, camilianamente, onde está a felicidade? E a pensar, se calhar nem foi preciso mais do que alcançar a fugitiva reforma...

A motorizada vinha com ele a rolar certinho desde a Década de 70, à chuva ou de mangas arregaçadas, debaixo do sol. Coisas talvez não deste milénio em que as décadas ainda não têm personalidade nem a autoridade da História. E damos connosco insistindo em perguntar onde está a felicidade?

Os anos pesam mais uns quilitos. Não sendo um conhecedor, apostaria numa EFS com motor Zundapp que agora já custa a limpar, as costas doem quando a gente se verga e não é fácil mantermo-nos de cócoras, o desperdício - ainda se usam "desperdícios"? - de volta do cilindro, da vela, do carburador. O resto é a polidelazita de todos os domingos, um colher de óleo pelos amortecedores abaixo. Assim, sãos e salvos, chegámos a hoje.

Onde está a felicidade? Provavelmente nessa tarde soalheira de sábado, queimando os últimos cartuchos do Verão. Ele e ela a gozarem a reforma, em passeata com outros muitos como eles. E ela a dar nas vistas, nem uma grama mais, mas que belo porte!..., quase não se lhe nota aquela ruga ali, alguma flacidez no rabo, acolá.

 

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 09.09.16

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Assim as tuas cores naturais contrariam as leis da Natureza. E o teu inocente tagarelar, lago fora, também.

Por eles não dispararei. Vai, sob condição de voltares.

 

 

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