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A Feira do Artesanato já lá vai. Ficou-me na memória o sabor de uns frasquitos de compota e de uns bolos chegados de uma qualquer banda lusitana. Mais a promessa de umas sandes de leitão aqui perto, é o leitão famalicense a crescer para o rival bairradino, quero provar dessa bulha. Mais ainda o belo efeito de algumas peças talhadas à mão, às vezes vestimenta, roupagem para o frio oriunda de onde ele tirita mesmo a sério. O Artesanato é sempre uma tarde bem passada, muito embora em prevenção constante, não surja de repente o fungagá para cima do palanque. Há gostos para tudo, claro, e eu também tenho o meu – que não se conjuga com uns recantos abarracados, supostamente restaurantes de campanha, a bivacar no alcatrão esburacado do recinto. Que o mesmo é dizer, do parque de estacionamento de todos os dias. Talvez se possa fazer melhor, relvar a janta para outro local, sem a ameaça iminente do show musical e do público entusiasmado em aluvião.
Enquanto não, a festa prossegue em casa, tranquilamente, saboreando os frasquitos de compota e os tais bolos de parte lusitana incerta. Ao meu gosto, legitimamente, – como ora se acrescenta sempre – ao gosto de quem prefere jantar no sossego da tasquinha, com tempo para as azeitonas todas do pratinho que vem logo com o empregado e a ementa; ou então deixar-se estar no aconchego do lar.
Enfim, manda e faz quem pode o que pode. Eis agora que se anuncia a Feira Grande de S. Miguel. E sobre ela…
Fui aos meus arquivos fotográficos de há uns dez anos. Quando a Avenida de França vivia o reboliço das provas de trote travado. Aquele comício de garranos mais ou menos amestiçados que, com grande pena minha, parece ter ficado para a História. Porquê? Porque não reavivar essa disputa do tempo das máquinas analógicas nestes dias das digitais, e lançar um prémio para as mais conseguidas representações fotográficas? Avenida abaixo, avenida acima, parelhas após parelhas, naquele compasso nervoso, travadinho, muito suado… Com as corridas terminando invariavelmente junto à mesa do júri (já de cabeça em água…), em reclamações exaltadas, seja porque o vencedor havia de ser eliminado por galopar, seja por o eliminado jamais ter entrado no galope… Isso sim, era um barulho interessante de se ver!
Mas, afora o trote travado, subsistem as atrelagens, as demonstrações de alta escola equestre, a beleza portentosa dos concursos de gado bovino. Mais os petiscos, as desgarradas, toda a justíssima folia de quem se despede do Verão e entra no ano agrícola. Um ano, acrescente-se, muito mais honesto, discreto e sofredor do que os seus congéneres: o fiscal, o lectivo, o civil, o judicial… Um ano a incentivar e a proteger, portanto, – talvez criando o “Dia do Ano”, assim como já se descobriu o “Dia da Árvore”, ou o “Dia do Pijama”.
Volvendo à Feira de S. Miguel. Lá nos aguarda a garraiada ou a apanha do porco, quem lhe puser as mãos e não o deixar fugir leva o bicho para casa. A Feira (a Feira Grande, como sempre lhe chamámos) é o momento alto das festividades lúdicas famalicenses. Da já distante adolescência ficam os carrinhos de choque – em pista, não em arena – em que ensaiávamos a perícia de futuros corredores, os matraquilhos e as barraquinhas de tiro ao alvo, sempre de pontaria aos SG Gigante presos por duas fitas de serpentina. Eram as tentações do Demo, instaladas em Famalicão com quinze dias de antecedência, a esvaziarem-nos até à seca total os nossos já muito desertificados bolsos. Ainda haverá disso? – corridas, pontaria e bolsos desmoedados?
Havia – e continua a haver – as concertinas, a malga de vinho e o pão com chouriço, o gado todo enfeitado, umas tantas tardes em que me perco em visões e recordações. E as noites de cantorio e altifalante, as tais que eu passo, mas desejando sempre à comunidade, neste novo ano agrícola, – umas boas festas!
(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 22.SET.2016).