"Para quem goste de perdiz estufada"
A bem dizer, a gente hoje gasta mais dinheiro com a saúde dos nossos animais do que com a nossa. Penso às vezes, para veterinário não serviria; mas para psicólogo da bicheza… Dos cães (in casu, das cadelas), do gato, do canário…
E eles necessitam, realmente. Sinto-o assim numa das minhas, portadora de monumental barriga preste a esvaziar-se, das duas uma – ou de cachorros alentadíssimos ou de família numerosa, contrariando todas as regras do prudente planeamento, nem quero imaginar quantas bocas a pedir alimento! Este o ponto em que poderíamos derivar a conversa para os benefícios fiscais de que tanta gente fala já: isenção de IVA, deduções ao IRS… Enfim, políticas sociais. Mas não valerá a pena, cães são cães, não são «matérias fracturantes».
Para os proprietários – há que rever esta nomenclatura; proprietários? O esclavagismo já lá vai… - para, mais precisamente, os acompanhantes destes amigos inseparáveis, nos seus frequentes passeios pela Devesa, aqui fica a indicação do signatário, o maior Karamba da Zoologia. Especialista em beagles e labradores, fulminando todos e quaisquer mal-olhados.
Entretanto, compõe-se a minha trupe de perdigueiros portugueses devidamente inscritos no LOP e com provas dadas em codornizes, galinholas, perdizes… e até faisões! À boa e antiga maneira das estirpes que os caçadores mantinham para as suas lides e obséquio dos parceiros. Muito como os de Fradelos na minha infância, sempre atentos às suas matilhas de podengos, aos seus galgos, a alegria que eram aquelas batidas às raposas! Ou as aflições volta e meia vividas, a função interrompida, aqui d’el-rei por um veterinário, não havia então veterinários além do Dr. Anacleto Pinguinha, e, já idoso, pesado, cegueta, o Sr. Raposo espetou dois zagalotes no pescoço do Gris, a galgo dilecto do Sr. Moreira. A caçada não foi além e ainda demoraria um pouco a chegar aos meus clandestinos quinze anos quando, munido de uma calibre 16 do meu bisavô, principiei também nessa «adrenalina» das raposas, sem que alguma, dia algum, se atravessasse diante de mim. Salvo quando já tinha idade e juízo para as apontar apenas com máquina fotográfica.
Ainda haverá caça em Famalicão depois destas décadas de ignorância e demagogia? Tenho algumas dúvidas. E a maior pena… O Tempo tudo mudou. No inverno transacto estive em casa do Sr. Moreira (que Deus tem há muito) mas a sua descendência deixou-se disso, dos galgos e dos podengos e das raposas. E a restante Fradelos? Ainda averiguarei.
De modo que estamos sobretudo em cães de companhia – com toda a «legitimidade» (a palavra da moda este Outono…) – mais do que em companheiros de caça, estamos em quadrúpedes e fieis amigos, animais da família. Aliás, como já referi, de uma família tendencialmente «macro», eu não sei para onde me virar, tal o advento deste simulacro de netos. Os filhos da minha Tareja.
Não há como não perceber, o recado fica dado.
E o mais certo é quando estas linhas vierem a público a ninhada tenha já arribado à luz do dia. Depois virão as semanas, os meses, a escolha do que fica e do que parte, que se dane a modéstia mas ninguém encontrará em Famalicão perdigueiros como os desta casta. Atenção, pois, ao Parque da Devesa, a nossa Fátima das aparições caninas, lá para o início do próximo ano.
(Da rúbrica De Torna Viagem in Cidade Hoje de 12.NOV.2015)