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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Sem tempo para perder

João-Afonso Machado, 31.07.15

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A Polónia foi sem dúvida o país mais martirizado pela Guerra de 1939-45, entalada entre a barbárie das tropas nazis e soviéticas, superfície à mercê do expansionismo de ambas. Perante o desespero e incapacidade de Churchill e a ingenuidade ou, talvez, a doença de Roosevelt. Por isso o expressivo sentido da formidável anotação de Zbigniev Brjezinsky - «Hoje em dia, a guerra é um luxo a que só os fracos e os pobres podem dar-se».

Simplesmente porque os opostos - os fortes e os ricos - permanecem por demais ocupados em  construir e sustentar a sua força e a sua riqueza. Esses ingridientes da continuidade nacional depois objecto da inveja e da cobiça dos que se guerreiam - entre si ou com os seus congéneres; com armas ou com a vacuidade do discurso político; e sempre à sombra da corrupção, da demagogia, da improdutividade.

Tenha-se por exemplo o nosso Continente. Agora mesmo, quando as televisões usam a significativa menção da «invasão do Tunel da Mancha» no tema candente do conflito de interesses - de parte a parte atendíveis - a decorrer entre Calais e Dover.

 

 

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 31.07.15

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Foi há muitos anos numa terra perdida, um mapa em papel indecifrável, onde também havia filhos e mergulhões naquele lago secreto antes do sol poente.

 

 

"«Várzea Formosa - A cidade sonhada»"

João-Afonso Machado, 30.07.15

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Hoje falo de um sonho sonhado de dia e à noite, sempre em consciência e muita vontade. Um sonho transformado em percurso de vida e contado agora em livro intitulado Várzea Formosa – A cidade sonhada. O autor é João Cidade.

O livro é de uma leitura suficientemente rápida para formar uma ideia longa, consistente, tão ampla que nela cabem os passos todos da nossa vida, porque é inevitável o confronto, a comparação. Muito embora os destinatários iniciais sejam as crianças. E talvez o Várzea Formosa seja também um bom tema de conversa com elas. A gente da minha geração já se inicia regularmente no estatuto de avós. Passaram muitas décadas e o mundo cavalgou à rédea solta. Tudo é diferente agora, inimaginavelmente diferente para os mais novos.

Mas foi o sonho que baptizou João Cidade. Quero dizer, o meu bom Amigo Alcino Monteiro, nos idos recuados em que viveu a sua infância numa aldeia distante, lá para Resende. E ansiava por outros dias de mais fazer e conhecer. Em que construiria, muito desperto, o seu sonho, juntando os pauzinhos todos para o levar a bom termo, ele próprio, em vez de esperar que acontecesse mais coisa, menos coisa.

Era o sonho de vir, afinal, à cidade. Destemidamente, depois dos pedregulhos da caminhada a pé e da velha camioneta de carreira, do comboio – de tudo o que ainda nem sequer experimentara. Até esse dia em que o Destino o trouxe a V. N. de Famalicão.

Intervalo. Os leitores infantis da Várzea Formosa têm agora a oportunidade de tentar entender o que era viver sem electricidade, sem televisão, sem computador, poupados ao frio dos invernos apenas pelo calor da lareira. E sem brinquedos e sem o automóvel do pai para os levar ao hipermercado – que também não havia – ou a um singelo passeio. Seriam eles capazes de vencer este pesadelo e erigir o sonho de um quotidiano mais confortável?

 Prosseguindo. João Cidade deixou a sua aldeia no modo aliviado de quem acorda para uma realidade nova posta na sua frente. Ficavam lá os seus e as suas origens. Aceitou a vida que viveu enquanto se batia – pacificamente – pela vida nova que ia viver. É já o Alcino Monteiro famalicense adoptivo, um coração para sempre dividido entre S. Cipriano, e os seus vagares agrícolas, e Famalicão, o movimento todo de uma vila que já então se preparava para ser cidade.

Aqui chegou há trinta anos, decerto de comboio e na decidida expressão – apanhada por António Caseiro Cabral, o ilustrador do livro, também de parabéns, - de um Clark Gable e o seu bigodinho. Alcino Monteiro vinha para vencer. Assistiu ao crescimento da urbe e participou nele. Fez muitas amizades. Tornou-se, por assim dizer, o embaixador de Resende em Famalicão. Porque trouxe essas terras ao conhecimento dos de cá e levou muito daqui para lá.

Deixo-lhe, pois, as minhas sinceras felicitações. Ao Alcino Monteiro e ao João Cidade que é aquela em que o seu contributo continua a ser prestado. E a recomendação final para que não apenas os mais novos leiam o Várzea Formosa: às vezes esquecemo-nos como foi, o que desajuda a aceitar o que é.

 

(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 30.JUL.2015).

 

 

 

Incapacidades

João-Afonso Machado, 30.07.15

Afora alguns estragos materiais causados pelo clima tempestuoso da I República - coisa muito pouca, comparativamente - podemos dizer com segurança somos dos raros países europeus que, no século XX, não conheceram os horrores da guerra dentro de casa.

É certo, perdemos gente válida e perdemos imenso tempo, quer no primeiro conflito mundial, quer no anacronismo ultramarino.

E suportámos (já só os mais velhos se lembram disso) fome e privações e as senhas de racionamento nesses remotos idos em que a Europa endoideceu completamente.

A autocracia que vivemos - uma prolongada II República inteira - não foi mais feroz do que tantas e tão mortíferas que determinaram o arrasamento do Velho Continente.

Depois a Europa levantou-se, sacudiu o pó do seu esburacado fato e arregaçou as mangas. Mas a gente foi-se deixando estar na esplanada.

A adesão à CEE era importante, valiosa, e recebemo-la com entusiasmo. Até porque vinha aí dinheiro barato ou mesmo à borla. Analise cada um o destino dessas benesses supostamente para investir e criar riqueza.

A inclusão no Eurogrupo passou-nos - a todos menos à classe política - relativamente ao lado. Do muito que se pudesse dizer, fica apenas isto: ponto final nas políticas cambiais tão uteis às anteriores situações de aperto financeiro.

E agora o presente. A crise!

Deviamos, realmente, pensar o que somos e onde chegámos. Olhar à nossa volta e perguntar: porquê?, o que nos falta, o que tivemos a mais ou a menos.

Em minha modesta opinião, o regresso à moeda antiga seria uma solução - só não de ponderar porque as senhas de racionamento, a reconstrução de algo por fora de aparência incólume, mas pulverizado interiormente - nós mesmos - são impossiveis. Não estamos para isso.

Assim sendo...

 

 

Correio do Minho

João-Afonso Machado, 29.07.15

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Minha Madrinha querida:

Espero que esta a vá encontrar com muita saúde e com a boa disposição que por estas bandas é às mãos cheias. Vésperas de eleições e férias de praia juntas são os foguetes das nossas romarias, mas trata-se de listas de deputados. Eu explico: de escolher entre muitíssimos os muitos de que sairão os bastantes escolhidos pelos votos do povo. E há cada uma! Por Setubal, aqui ao lado, os do Bloco de Esquerda (esse dos três votos e do tonho que chamou beata à Madrinha querida), incluiram doutores, engenheiros, professores, empregados e um transexual. E estão todos muito contentes porque se ele (agora parece que é uma ela) for eleito teremos o quarto Parlamento mundial a incluir a novidade, quer dizer, a modernidade. E com esta, decerto, mais um passo para acabar com a pobreza de Setúbal, de que já o Senhor Bispo tanto falava.

De modo que a Madrinha querida não se escandalize. E como me disse uma vez que nunca tinha visto nenhum transexual, olhe aproveite, apanhe o comboio e venha até cá: num instante estamos em Setubal, almoçamos um peixinho grelhado ali para as bandas do Sado e depois vamos ao comício. Eu ver, acho que já vi, mas nunca ouvi.

A modernidade é isto. A Madrinha querida não esqueça - direitos à diferença, originalidade, são termos que convém usar agora. Extravagância, nem tanto, levanta sempre a suspeita da condenável caridade de um espírito antigo. Eu explico: é melhor explicar depois. Só não quero é que eles ataquem a nossa Paróquia de sempre e legislem sobre a catequese da Madrinha querida.

Mas se a Madrinha querida quiser assistir ao tal circo (isto muito entre nós) informe e combina-se tudo. Até lá despede-se este afilhado muito afeiçoado e sempre grato à Madrinha querida, a quem pede a benção e se assina,

JAM

 

 

A República em roda livre

João-Afonso Machado, 26.07.15

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Celorico de Basto é uma terrinha sossegada, um lugar próximo do Céu, onde por isso fazem mais ruído as pilhérias do Mafarrico. Como, por exemplo, esta última - desabou o tecto da Conservatória do Registo Civil; em cima da cabeça dos funcionários, uma das quais seguiu dali para o hospital.

Ora estes acidentes não acontecem por acaso, nem inopinadamente. As responsabilidades têm de ser encontradas no horizonte mais alargado do Regime inteiro, a largar lascas por toda a parte.

Guardadas as devidas distâncias, ocorre-me, a propósito, aquele episódio narrado por Costa Brochado (in Para a História de um Regime) sobre uma visita do Presidente da República ao Brasil, em 1921: viajou, não em um navio da Armada, mas «num paquete mercante, que parou algumas vezes no caminho por falta de carvão, rebentamento das caldeiras, etc». Isto porque, segundo o próprio Ministro da Marinha de então, não havia «um navio capaz de dar um tiro», sobrando, no entanto, «vinte e três almirantes», espécie hierárquica inexistente quando a Monarquia caiu.

Além da pronta recuperação da senhora funcionária atingida por mais uns bocados da República, ficam os votos de um tanto quanto possivel tranquilo desempenho dos seus colegas. Será necessário escorar os tectos da repartição e evitar a permanência de vibrações mais maçadoras e impertinentes. E, já agora, ler (ou reler) os profetas. Um dia virá... Para já aguardemos uma provável IV República, sem «ética» mas com a justiça possivel. De que modo chegará ela? Durante o sono dos parlamentares? Pelas armas, cumprindo a tradição das antecessoras?

O Regime está cheio de traumas e traumatizados mas, com boa disposição, é sempre caricato. E imprevisivel.

 

 

Tardes no parque

João-Afonso Machado, 25.07.15

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Entre o rio e o ribeiro as margens são os nossos olhos ou os dos outros. A terra - ou o rigor da indiferença pelas águas resgatadas à podridão e pelo parque emergindo do emaranhado das silvas. Com tal convicção que, sendo obra nova, já ninguém recorda como era antes. Assim decorre o Verão no Interior.

Repleto de pontes e açudes e mesmo ilhas, mera fraqueza de caudal para os tais outros. Há ainda o lago e as aves aquáticas. Às vezes gaivotas e corvos-marinhos.

E inevitavelmente os patos. Já nascidos no parque, a cidade lembra-os ainda bicando a casca do ovo, uns meses atrás. Permanecendo irmãos, ainda sem as cores da maturidade, no gozo diário da sua vilegiatura. Enquanto não engrossam o bando dos fins de tarde em voo circundante do lago, grasnado e muito chapinhado nas águas.

À espera do tempo de viagens maiores, outras fotografias, são ainda assim importantes estas facetas do quotidiano. Os patos do parque e a súbita percepção da sua imunidade ao impulso do tiro. Mas a ninhada era de seis, onde parará o sexto? Em cada dia que passa, vagueia-se entre a preocupação e a satisfação.

Há coisas extraordinárias! Mesmo no nosso pequeno mundo, o mundo de cada um, o impossivel nunca deixa de acontecer!

 

 

 

Diferentes atitudes que marcam

João-Afonso Machado, 24.07.15

Segundo o Governo, é uma possibilidade a devolução da sobretaxa de IRS no próximo ano. Se tudo correr bem...

Seria mais fácil a promessa fácil, eleitoralista, - e depois de 4 de Outubro se veria.

A Oposição vocifera - como vociferaria sempre: a) porque o Governo tenta aliciar os portugueses com miragens; b) porque mentiria descaradamente, se desse o facto como uma certeza; c) por inabilidade governamental, se nem sequer o admitisse.

E nós ficamos no exacto ponto em que podemos - hoje - ficar: talvez. Parece correcto.

***

Perguntado seis vezes pelo mesmo repórter sobre com reagirá o PS no caso de ganhar as eleições sem maioria absoluta, António Costa continuou a debitar um relambório qualquer, sorrindo sempre e ignorando a questão, para, a final, expressar apenas que não a contempla.

Mas ela existe e é muito provável. Não será legítimo queiramos saber como procederá o PS nesse caso? Em quem se apoiará se pretender formar Governo?

Ou é de permanecermos no escuro até à contagem dos votos e trâmites sequentes?

***

Assim calejados abstencionistas, "nulistas" ou "branquistas", gente longínqua das obediências partidárias, talvez se decida à maçada das filas para as urnais eleitorais.

 

 

 

Não vale a pena, será sempre assim

João-Afonso Machado, 23.07.15

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Mesmo os menos argutos já compreenderam que nas actuais circunstâncias qualquer governo de iniciativa presidencial nunca teria mão na condução dos negócios da sua esfera. E o mesmo se dirá de um Executivo não apoiado por uma maioria parlamentar.

No fundo, a esta constatação - que, insisto, é do mais elementar bom senso - se resume a mensagem de ontem de Cavaco Silva. Um infeliz amordaçado, ainda assim tanto escandalizando a Oposição inteira, muito comadre, muito arrepiada com o seu pretenso apelo ao voto na coligação PSD/CDS.

A História presidencial recente está repleta de rasteiras que Eanes, Soares e Sampaio pregaram a governos do agora chamado «centro-direita», Suscitando a indignação dos visados, tal qual ontem e hoje os partidos de Esquerda têm prodigalizado acusações e críticas a um Cavaco Silva que - penso eu - já só não quer acabar o seu mandato às voltas com equações impossiveis de resolver.

O mais importante nisto tudo é a verificação do óbvio: o «presidente de todos os portugueses» nunca passará de uma miragem. A Direita e a Esquerda fizeram-se para andarem desentendidas e o Centro (de Freitas do Amaral...) e o Centrão, nem carne nem peixe, esboroam-se sempre pelos motivos mais fúteis.

Talvez esse atávico desentendimento pudesse ser apenas ideológico. Civilizado, portanto. Infelizmente, o genuíno político português respira intriga, maledicência, mentira e teatralismo. Não sobrevive sem vitimizações, mudanças bruscas de discurso e encostos de conveniência. É um mãozinhas, um leva-e-trás. Um melga que não há meio de ir embora.

 

 

Das "Memórias de um Átomo"

João-Afonso Machado, 22.07.15

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«O Conselho de Ministros reunira de emergência dado o despropósito das massas, a galgarem o escadório de S. Bento. Presentes, António Costa, o Chefe do Executivo, e os titulares das pastas do Trabalho, Emprego e Colectividades, Jerónimo de Sousa, e da Igualdade, Solidariedade e Direitos dos Animais, Mariana Mortágua. Invocando cada um a sua justificação, os restantes 22 ministros haviam-se escusado comparecer.

Não obstante os falsos rumores levantados pela Imprensa, verificou-se uma convergência unânime de opiniões: era absoluta a divergência de opiniões entre os parceiros da coligação. Essa a razão porque o 1º Ministro se vira obrigado a convocar os camaradas...

- Perdão! O tratamento de «kamarada» é exclusivo dos militantes do PC!

- Mas eu tratei-o apenas por «camarada»...

- Ah, está bem! Eu pensei ter ouvido «kamarada»

- Camarada e kamarada, o descontentamento popular resulta apenas das medidas austeritárias contra os direitos dos animaizinhos. Acabemos já com as touradas...

- Mas, camarada...

- Outra vez?

- Camarada: eu disse c-a-m-a-r-a-d-a!

- Bom...

- Camarada, se extinguimos as touradas lá se nos vão Santarém, Évora, Lisboa, talvez Setúbal, Portalegre...

- E Pirescoxe, kamarada, avante! com outros temas. Olhe mas é o salário minimo, uma vergonha! Os ricos que paguem a crise!

- Pois kamaradas - digo camarada e kamarada - verifico agora que as mulheres se encontram em minoria nesta reunião. Proponho o seu adiamento até que alguma camarada ou kamarada compareçam e desempatem esta desigualdade.

- Já agora há de pedir ao seu kamarada ministro da Fazenda, o Luis Finanças, isto é, ao contrário, o Fazenda das Finanças para vir também.

- Camarada e kamarada, os direitos dos trabalhadores são inadiáveis!

- Também os dos bichinhos, kamarada, mas os meus secretários de Estado dos Animais em Cativeiro, o Dr. João e a Dra. Catarina, não há meio de se entenderem e apresentarem o seu Livro Negro do Zoo...

- Então, camaradas, suspendamos os trabalhos por hoje. Aliás, tenho um almoço com o subsecretário de Estado das Auto-estradas dos Sul, o camarada Pedro Silva Pereira.

- Kamarada, não, camarada, camarada.

- Sim, sim, c-a-m-a-r-a-d-a...».

 

(Com a aquiescência do meu bom Amigo J. da Ega, a quem mui grato sou).

 

 

 

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