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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Arquivos

João-Afonso Machado, 10.04.15

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É um mito, o pó dos "arquivos". A língua pérfida de quem insulta a História de "Passado". Utilizando a linguagem jurídica, nela - na História - não há decisões, consequências, terminais, é de "processos de jurisdição voluntária" que se trata, da vontade e da mão dos homens. Porque esses "arquivos", os do pó, são somente uma paragem analfabeta no curso sem fim em que ontem, hoje e amanhã se confundem sistematicamente.

É um dogma, a ignorância generalizada ante a riqueza dos documentos antigos. E daí a mistificação. A leviandade. A faceta apenas curiosa dos papeis de antanho, como se a sua actualidade não fosse a sua maior riqueza e préstimo.

É uma infelicidade, cada "arquivo" tombado em mãos incapazes de o decifrar. Aliás, por isso a História é o que é - se não a imobilidade, o voyeurismo, apenas; se não o erro, a lacuna abismal. Em suma - e sempre - a indecifrável vida morta.

 

 

 

"A queda do gato"

João-Afonso Machado, 09.04.15

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Ouvem-se piares, miares e ladrares em quintais de antigamente, hortas, limoeiros e capoeiras. Quando não havia necessidade de elevadores, está tudo dito. Para o bem ou para o mal, em absoluta ignorância do anonimato entre vizinhos.

Ouvem-se histórias de animais de estimação, um designativo de montra de loja para fidelidades inquestionáveis, perdas choradas, quase gente da casa. Mais do que nunca nos dias de hoje, assolados pela carestia, o desemprego, a insegurança, um diabo de vida quantas vezes amaciada pela brincadeira do cachorro, o ronronar do bichano. Isto não é ainda uma selva, há sentimentos, e o inesperado aconteceu a semana passada, quando cheguei para o almoço – o gato escorregara e caíra da janela do primeiro andar.

Cá de cima recomendava-se-lhe calma. Lá em baixo um felpudo mini-canídeo incentivava-o à brincadeira. São os dois de tamanho idêntico… O felino resmungava, todo encostado a um canto da marquise e soprava a cada arremetida do inofensivo outro animalzinho. Assim não íamos a lado algum, a situação era gravíssima, tudo podia terminar numa fuga em pânico por esses muros fora, na incomensurável imensidão do mundo famalicense.

Deste modo, e nesta velhice, nos descobrimos no desespero de um, por assim dizer, ente querido em perigo. E todos os apartamentos do piso inferior sem vivalma, o eco das campainhas a furar-nos de angústia o espírito!

Também não havia por que chamar os bombeiros. Os bombeiros vêm sempre quando os gatos fogem para cima, para as árvores, varandas, ou outras inóspitas paragens nas alturas. Jamais quando eles descem ao logradouro da vizinha e miam pela gente e se eriçam à vista do pretenso atacante. A solução estava em bater à porta do prédio confinante, em busca de algum caridoso rés-do-chão, e depois galgar pátios até ao local onde o drama ia já no seu auge.

Abreviando agora, até ao exacto momento em que, o coração a sair-me pela boca, o gato me abraçou a camisola com as suas garras. E ao retrocesso, assim estafado, em mais uns cinquenta metros barreiras. Com muita vizinhança à janela, atenta, preocupada, a querer saber de que andar ele caíra, a contar histórias, episódios semelhantes, coitadinho do bicho!, estaria magoado?...

Era o anonimato lutando contra ele próprio. A solidariedade do prédio, da correnteza toda, um congresso de condóminos. Nada prejudicado pela ausência de nomes nestas linhas, mesmo o gato omite o dele, aliás em casa é assim, Ah gaaato!!!, ameaço eu quando o vejo guloso, de olhar fixo no canário.

Tudo como no tempo das hortas, limoeiros e capoeiras. Da pré-história do tal anonimato agora em luta com ele próprio. Afinal havia mais vizinhos do que portas! Coitadinho do bicho!, estaria magoado?

Não, não estava. E assim percebeu regressava a casa pela entrada da frente, não quis mais saber de colo e da malha da minha camisola e esgueirou-se pelo seu pé até junto da dona. Deixando-me nos derradeiros agradecimentos aos vizinhos com a aguçada marca vermelha das suas unhas na minha carne. Ah gaaato!!!

 

(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 09.ABR.2015)

 

 

 

Reaccionarismos

João-Afonso Machado, 08.04.15

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Escapou. Escapuliu-se para o lugar de onde nunca saiu. É um achado, uma peça rara de coleccção, no verbo excitado de qualquer leiloeiro. Porque não se trata de uma placa apenas, antes da rua inteira, sinuosa como um "S" de Salazar. A "Rua do Dr. Oliveira Salazar", em Santo Tirso.

E nela, como é de bom tom, a velha esquadra da Polícia. Feita de janelas em madeira e grades de ferro, o dístico como mandam as rigidas regras da Autoridade. Não estivesse desactivada, seria um vaivém de pançudos agentes fardando de cinzento e boné de pala maior do que a de um almirante. Um santuário de autos lavrados com o rigido arado de teclas, aquele bater metálico de horas a fio e muito papel quimico.

A pedir uma romagem do saudosismo almoçado em cada 28 de Maio... Mas assim a edilidade se mantenha distraída (ou sempre bem-humorada...). Estes fenómenos têm o seu quê de turistico, no quadragésimo primeiro ano da Revolução. Santo Tirso, segundo os guias da região - famosa pelo seu Mosteiro beneditino, pelo licor de Singeverga e os jesuitas da Moura... e por um fóssil, a Rua do Dr. Oliveira Salazar.

A manter. Como recordação da nossa juventude, dos tempos académicos, do Manual de Direito Administrativo (2 vols.) do Prof. Marcelo Caetano.

 

 

 

 

Dia da Cruz pelas ruas

João-Afonso Machado, 06.04.15

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Os bombeiros em formatura esperando o compasso pascal, a multidão em volta também e a Cruz a chegar, enfim, numa adaptação de ambulância onde sentados cabiam alguns - a Cruz logo de seguida dada a beijar a cada um dos presentes no quartel.

Gente de fé. Uma visão súbita do mundo bom, empenhado, generoso. A boleia na dita ambulância não foi negada, urgia chegar ao local onde todas as cruzes se reuniam para a entrada conjunta na igreja e na missa paroquial.

Centenas de pessoas. Sem dúvida, milhares de sorrisos. O caminho da Cruz, um percurso de sol e esperança ao longo das ruas da cidade. A máquina fotográfica ajuda sempre a não esquecê-lo. A reviver esses momentos de comoção, há um nó na garganta, os desconhecidos não o são tanto quanto se possa pensar.

 

 

 

Boa Páscoa!

João-Afonso Machado, 04.04.15

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Saiba cada um renascer imagens, ideias, sentimentos. Como cada qual. Julgo que a Ressurreição será isso, e por isso a perpetuação da Cruz de Cristo na nossa procura de um espírito sempre vivo.

Uma boa Páscoa para todos!

 

 

 

Verdades do 1º de Abril

João-Afonso Machado, 01.04.15

Este é um dia - o primeiro de Abril - em que apetece recordar de quantas mentiras se compõe a verdade. O PPD/PSD nasceu social-democrata mas, nos seus conturbados tempos escolares, o bullying marxista-leninista alcunhou-o e injuriou-o de "fascista", "burguês", "capitalista", etc, etc. Mandavam então os próceres da assim chamada "democracia popular" (do que eles são capazes de se lembrar, santo Deus!), até o PS sentia dificuldades em se manter em cima da sela e as concessões ao pluralismo não iam além da Jugoslávia de Tito.

Volvidos 40 anos, a história é a mesma, com algumas nuances. Ainda sobrevivem alguns berradores do "fascismo nunca mais" mas a retórica, de um modo geral, evoluiu. Andou lendo, refinou. O PSD, no dizer da magistratura política da Esquerda, é "neo-liberal". Aliás, se fosse social-democrata seria, curiosamente, de Esquerda. O PS, é claro, teve de criar o seu Muro de Berlim para salvaguardar algum espaço ideológico, espingardando sobre tudo o que lhe possa fazer sombra.

Contas feitas, ninguém é qualquer coisa. Até porque os rótulos ideológicos são apenas isso - rótulos. A governação faz-se por cá e pela Europa em geral sempre do mesmo modo: para sobreviver menos mal. E por cá, particularmente - e infelizmente - para engorda de quem a faz, a tal "classe politica".

Em suma, são os homens, a sua idoneidade e a sua eficiência, o realmente importante. Os antecessores dos actuais - neste pobre Portugal - serviram-se à saciedade dos negócios públicos. Agora, com muita asneira pelo meio, acrescente-se, sempre se vai tentando remediar males antigos. Bom é sermos livres o bastante para apreciar, avaliar e separar com isenção o trigo do joio. É neste sentido que se pode dizer -  de Massamá aos boulevards parisienses ainda assim vai uma distância muito grande. Por maior que seja o alarido contra o neo-liberalismo... 

 

 

 

 

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