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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

A correspondência particular de Sócrates

João-Afonso Machado, 29.04.15

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Assaltaram a malaposta! Entre Évora e Lisboa os vilões tolheram a estrada de bacamartes em punho e, entre o vazio dos cofres e a magreza das pilecas, resolveram compensar-se violando os sacos de correspondência. Nada como a sensualidade da escrita dos namorados, ter-se-ão resignado, já esquecidos do império das mensagens SMS. Só assim chegaram à carta de Sócrates para António Campos.

Muito bem redigida, diga-se. Dividida em capítulos, decerto provas a rever do romance do presidiário 44. Longa, pormenorizada, esclarecedora. Umas inexcedíveis memórias do cárcere...

E um abominável atentado à reserva literária, aos direitos de autor, este assalto na estrada de Évora. Sabe-se, entretanto, serão tomadas providências, redobrada a guarda, garantem as autoridades, outros roubos não se repetirão. O que, felizmente, significará só no final ficaremos a saber de que fonte brotava a massa abundantemente gasta por Sócrates em Paris. E por aí também...

 

 

 

Um foral de D. Sancho I, um concelho de D. Maria II

João-Afonso Machado, 28.04.15

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A História está lá, entranhada na terra e no sangue. De uma e da outra margem dos rios e tão à banda dos riscos postos nos mapas por quaisquer vontades circunstanciais. Há um todo de História e há os livros. Por vezes há ciência em demasia, monotonia ou o cansaço de uma escavação chegada ao fim. Enquanto um pouco ao lado ainda agora se está começando.

Ouvem-se falhas documentais no subir da escadaria da sede do concelho. Mas o eco do Passado é, em qualquer parte, o mesmo que as promessas do Futuro. Foi Sua Magestade a Rainha D. Maria II quem lhe renovou a vida dada pelo foral de D. Sancho I. A V. N. de Famalicão, durante séculos repartida entre não sei quantos termos vizinhos. Esses que já não sabem que mais História contar. A nossa, sempre entranhada na terra e no sangue, todos os dias aflora do antigamente e se constroi rumo a amanhã.

 

 

 

 

O jacuzzi

João-Afonso Machado, 26.04.15

Na sua habitual coluna no Expresso Ricardo Costa fez a sua apreciação política, em dez itens, do Plano salvífico apresentado pelos socialistas à beira de eleições. No sexto parágrafo, lê-se esta interessantíssima asserção: «O PS tomou finalmente um banho de realidade e assumiu que há problemas de fundo na Segurança Social ou no Emprego».

Está aqui muito. Até a inocultável simpatia de Ricardo Costa pelo PS, nunca saído do banho - em cálidas águas - da realidade por ele próprio criada. Vide os aumentos à Função Pública com a assinatura de Sócrates, em se aproximando a sua segunda corrida eleitoral,ou as suas ratadelas nos fundos e reservas da nossa "Previdência" quando já não havia onde ir buscar mais.

Vale o mesmo dizer - finalmente! - o celebérrimo Estado Social está exaurido. Sem eufemismos. O PS sabe-o há muito e agora... que remédio!, toca a levantar o rabo do jacuzzi e a contratar uns tantos artistas da Economia operando com engenheiros-financeiros. O recital parece começará com um solo de concertina, estende salários, encolhe pensões, estende pensões, encolhe futuros. O PS esquece-se que a concertina é o instrumento por excelência nas desgarradas. É na previsão dessas modas populares que se deseja sinceramente os socialistas ganhem as eleições...

 

 

A Rolinada

João-Afonso Machado, 25.04.15

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Há outros "25 de Abril" na nossa História, conquanto sem a força de um feriado. Como houve muitos outros primeiro-ministros, ainda que - alguns - de modo diferente designados e com marcas assaz diversas no rumo dos acontecimentos políticos. Do conjunto não seria desinteressante uma resenha. E na bissectriz dos dois temas - as datas e os homens - encontramos o Duque de Loulé e o pitoresco episódio da Rolinada.

D. Nuno José Severo de Mendoça Rolim de Moura Barreto, o 2º Marquês e, em 1862, o 1º Duque de Loulé, pelo seu casamento com a Infanta D. Ana de Jesus Maria, era um radical setembrista - encurtando razões, um militante da extrema-esquerda de então - e o fundador do Partido Histórico. Um populista, não obstante Oliveira Martins sobre ele escrever (in Portugal Contemporâneo) que «foi entre nós o tipo mais perfeito, senão o único desses fidalgos democratas ingleses, que amam o povo abstractamente, mas não dão a mão à gente porque descem». Dirigiu ainda a Maçonaria portuguesa que não lhe regateou apoios na sua inegável e elevadíssima vontade de Poder. No qual, de resto se manteve como presidente do Ministério durante o fugaz reinado de D. Pedro V e o dealbar do de D. Luis.

Conturbados tempos de intriga partidária, já com o interesse nacional tratado do modo que hoje vamos sabendo. Mas a Rolinada (o termo deriva de um dos apelidos do Duque - Rolim) prendeu-se com questões mais comezinhas. O seu Governo resolveu implicar com os estudantes de Coimbra, negando-lhes o chamado "perdão do acto", uma espécie de dispensa de exames e de pagamento de propinas em homenagem ao nascimento do herdeiro da Coroa - neste caso, o Príncipe D. Carlos e no ano lectivo de 1863/64.

A Academia revoltou-se e a cidade entrou em convulsão. Foi preciso reforçar os contingentes militares com tropa vinda de fora e Antero de Quental, finalista de Direito, já muito tomado de cepticismo, acordou da sua apatia e assumiu o comando dos estudantes. A estratégia adoptada consistiu na retirada para o Porto, em comboios, de meio milhar deles.

O protesto surtiu efeito. O governador civil de Coimbra e o reitor da Universidade foram demitidos. Os revoltosos amnistiados. E o Duque de Loulé apeado do Poder alguns meses volvidos, ainda que por motivos mais centrados nas faenas da Capital.

 

 

 

"Rumo ao desconhecido"

João-Afonso Machado, 23.04.15

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A Famalicão das excursões é outro longo tratado de aventuras por mares nunca antes navegados pelos famalicenses. Encontro mapas e crónicas de viagens capazes de embatucar qualquer Pêro Vaz de Caminha. Como, por exemplo, a descoberta de Fátima e Lisboa, aí por 1956, em «esplêndidos autocarros» capitaneados pela Barbearia Gaspar. Ficaram nos anais as bizarras paragens alcançadas - «o Porto, S. João da Madeira, Oliveira de Azeméis, Curia, Luso, Buçaco, Coimbra, Condeixa, Pombal, Leiria, Fátima (pernoitar); Tomar, Castelo de Bode, Tancos, Chamusca, Aeródromo – Lisboa, visitando o Estádio Nacional e outros monumentos (pernoitar); Estoril, Cascais, Boca do Inferno, Sintra, Mafra, Torres Vedras, Caldas da Rainha, S. Martinho do Porto, Nazaré (pernoitar); Sítio, Marinha Grande, Figueira da Foz, Aveiro, Espinho». E, quatro dias depois, o regresso a bom porto, à calmaria do lar, no aconchego da família fascinada em redor de tantos e tão bravos feitos cantados.

Também eu, do sangue deste povo marinheiro, embarquei um dia. Também eu percorri a rota de Lisboa, a mesmíssima rota dos pioneiros do século passado, meticuloso como um romeiro de Santiago. A pé, - até Fátima – de carro, de camioneta, de comboio, à boleia, a pagantes… E mais tarde, chegando-se os clientes à frente, no impensável avião, aterrando (e depois descolando) no encantador «aeródromo» da Portela de Sacavém.

Também eu, enfim, visitei o Estádio Nacional, em jogos épicos da nossa Selecção, e visitei ainda «outros monumentos» menores da capital, como os Jerónimos, a Torre de Belém, o Terreiro do Paço, uma colecção de palácios e o Panteão de S. Vicente de Fora, onde repousam os nossos Reis.

E lembro, naquele cantinho com vista para a Praça 9 de Abril, a Agência de Viagens e Turismo Santa Filomena, Limitada. Na altura desconhecia bastante a sua utilidade, até um dia ler nela se obtinham «passagens aéreas, terrestres e marítimas, passaportes, bilhetes de caminho-de-ferro, reservas de hotéis, legalização de documentos, transporte de mercadorias», além das inevitáveis «excursões a Fátima (110$00) e a Lisboa», em frota própria de autocarros, a «mais completa do País». Corri então, desabridamente, à Santa Filomena, a mochila e as botas meio desapertadas, em demanda de uma bênção da santinha, um destino assim pró jeitoso, mas qual?!, tudo em vão.

A Agência sumira, de Santa Filomena e dos seus miraculosos autocarros ninguém sabia, a Internet monopolizara as reservas, a aquisição de passagens, o passaporte é prerrogativa da Loja do Cidadão e a inflação deu cabo daqueles preços e o euro da nossa velha moeda!

Foi neste estado de desânimo que o meu Amigo Alcino Monteiro anunciou as suas carreiras rodoviárias nos mais inóspitos recantos da portugalidade e dos galegos nossos semelhantes. Partidas ainda no ressonar do sol, uma fatia de auto-estrada antes da primeira paragem para o pequeno-almoço… Depois uma jornada toda e visitas. Invoco terras descobertas ou revisitadas: Montemuro, Viseu e a Estrela, Montemor e Tentúgal, Monção, Valença, a Serra da Arga, Pontevedra e Vigo, quantas mais!... E talvez não cheguemos a Goa, Damão e Diu, mas de Zamora pelo cabo de Bragança o Amigo Alcino já não se livra de nos levar. Tão certo como eu me chamar Bartolomeu Dias. Além, é claro, de todas as pantagruélicas romarias anuais à Gralheira: uma camioneta a estoirar de famalicenses amantes da boa posta de vitela. Avante Minho!!!

 

(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 23.ABR.2015)

 

 

 

O "cenário macroeconómico" de Costa

João-Afonso Machado, 23.04.15

António Costa tirou, por fim, qualquer coisa da sua cartola eleitoralista. Sem surpresa para ninguém, um programa relativo ao grandioso «cenário macroeconómico» que perspectiva para a sua vitória, supostamente dourado com a chancela de uns tantos vultos académicos de saber indiscutivel. Algo a aniquilar - no espírito das suas gentes - a política do Governo, a indignante política da Direita.

Com uma certa graça, José Adelino Maltez veio dizer achar salutar este confronto de concepções - a da "austeridade" vs. a do "despesismo" (sic).

O problema dos portugueses, salvo melhor opinião, reside na desatenção com que contemplam a alta rotatividade dos olhinhos de Costa. Aquela permanente atitude de quem impinge relógios contrafacionados jurando serem verdadeiros. Costa venderia a alma ao diabo por um qualquer objectivo político seu; como Costa não acredita na alma, aí o temos a vender o que não sente possuir.

E logo no arranque as reacções no seu próprio partido parecem não ser as melhores. São já conhecidas críticas ao programado quanto à TSU, à legislação laboral... Foram também suscitadas dúvidas sobre a constitucionalidade de algumas medidas...

Em suma, Costa não divergiu daquilo que sabe verdadeiramente: falar e gesticular comicieiramente. No mais, o seu «cenário macroeconómico» é um oceanário (de 90 páginas) que até poderá dar para tudo, no remoínho das palavras, mas apontará para os fundos do tal «despesismo», tão ao gosto de Sócrates e dos seus apaniguados.

 

 

O "sistema"

João-Afonso Machado, 21.04.15

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Agora, enfim, que uma fornada de 950 almas se perdeu no fundo do Mediterrâneo, a imigração clandestina alcançou foros de primeira página na Imprensa. Não há quem não tenha vindo dizer isto mesmo: que todos estiveram calados em face da tragédia instante e de umas quantas macabras travessias, um sorvedouro de desesperados em busca de um futuro suportável. Aqui na Europa e, vai-se lendo, com pesadas culpas da Europa. O tal capítulo menos bem explicado.

Porque ninguém se lembrou de culpar também a Europa rica pelo afluxo de portugueses pobres do tempo dos bidonvilles. O Velho Continente envelhece cada vez mais, e cada vez mais será uma miragem somente. Ou um lugar de acolhimento dividido entre razões humanitárias, que o obrigam a não fechar a porta, e problemas económicos e sociais a desaconselharem a abram.

Percebe-se por aí, muito se fala, pouco se diz. "Em casa onde falta o pão todos ralham, ninguém tem razão"... Aproveitamentos da Esquerda à parte - a Europa na mão dos neoliberais... - certo é o Mundo cavalgar e o Homem marchar. Enquanto isso, é como se fossemos ao banco ou às Finanças (ou à famigerada EDP) e viessemos de lá sem o problema resolvido, a questão adiada por um tranquilo encolher de ombros do zeloso funcionáro - «é o sistema...», costumam justificar-se eles.

 

 

 

Tempo de mudanças

João-Afonso Machado, 19.04.15

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Como terá corrido o fim-de-semana transmontano de pesca? De que cor correm as águas políticas? Apenas a II Grande Guerra não terminou ainda, vai agora no quarto livro de Martin Gilbert. O que foi possivel salvar destes alucinantes dias de mudança.

(Escravizante mania, a das colecções. Nada como a Net, apenas, e um desses aparelhos completissimos e à medida da nossa algibeira! Assim o Google tivesse o formato de uma primeira edição qualquer, em boa pele e letras douradas na lombada...).

Contra todos os sonhos e planos, a mudança não foi de retorno às várzeas e matas da meninice. Antes para a cidade, na Provincia, o apartamento até é bem dimensionado, o canário gostou e o gato vai-se habituando à sirene das ambulâncias, a vizinhança comenta - há-de ter sido coisa feia na auto-estrada - porque a auto-estrada não é longe e o gato, decerto com o susto, abre a gaveta das meias durante a noite e remexe a caixa de cartuchos, hoje nada como andar prevenido, a cidadezita ainda assim prima pela calmaria, tem parque e um rio ressuscitado, na fase de aprender a conservar o seu peixe.

Não sobra muito a acrescentar. A vida é isto e o fundamental reside em que residamos e vivamos na nossa independência. Quer dizer, na não dependência, obviamente de alguém. O mais a gente adapta-se, já nem espantam as sirenes das ambulâncias, foi outra vez coisa feia na highway. Corre-nos aos pés o mundo inteiro, outras pescarias transmontanas surgirão, vamos pela highway, a velha star de Ian Gillan e Ritchie Blackmore, lembram-se? A mini-aparelhagem chegou entretanto e já toca, "smoke on the water/fire in the sky"... Velhos tempos, alguém tem aí uma garrafa vazia de Old Parr para um candeeiro, aproveitando um abat jour sobrante?

Uma boa luz essa. Para prosseguir a II Grande Guerra e reler o que Ortega y Gasset escreveu sobre o homem-massa, «sem entranhas de passado».

 

 

O que somos

João-Afonso Machado, 15.04.15

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Fique o intervalo em tantas tardes de sol. A trovoada em vez da política passeando ao longo das nossas horas, como se de política apenas fossem os nossos dias. Escândalos, melhor dizendo, porque a política quase não é mais. Fique a natureza, notícia mais grandiosa do que as falas.

O anoitecer trará outras novidades. Talvez já não a oratória. Com um pouco de sorte, sequer a desgraça. O tempo vacila, não caminhamos assim depressa para os meses eleitos nas margens da unanimidade. Alguma tempestade, a esperança na espera. É o momento das ideias e das escritas. O gato sorna, ouve-se música e a fé na tarde ganha ante os primeiros passos matinais. Pelo jantar, um presente - o futebol.

Somos mais do que isto?

 

 

Melões e a melancia

João-Afonso Machado, 12.04.15

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O cartoon de António, no Expresso, é digno de menção pelo muito que diz e historia, desde o barrete frígio ao verde-rubro da indumentária republicana. E também pela expressão das sementes, mais bochecha, menos olhar, todas em desmembrada pose de ovo de Páscoa. Caricatamente, como não podia deixar de ser.

A inspiração do artista é de um realismo surpreendente. Estão ali as tintas evidentes do que é a actividade política - um rego mal estrumado e uns tantos melões ou melancias desenxabidos. Razão de sobra para não se ir ao mercado.

E os tempos refinam a leviandade desta lavoura. Até no Facebook se dá já à luz um partido! Ou um candidato seja lá ao que for - quantos não pregam em altíssimos berros a legitimidade dinástica deste ou daquele, senão mesmo dos próprios. Quando o Facebook se faz maternidade de monarquias electivas talvez se torne alcançável o volume do disparate transportado para uma dimensão habitualmente disparatada, a da política profissional.

Já só vai além da porta da rua quem gostar a sério de carnavais. A Nação e os seus muitos séculos preferem assistir ao corso na varanda sentados. Importante é que se acredite - rindo exuberantemente...

 

 

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