Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Pobre Portugal!

João-Afonso Machado, 30.09.14

Por fatal infelicidade, é provável a maioria dos portugueses não se tenha apercebido do profundo significado da campanha eleitoral a que ultimamente assistiram - a das ditas "primárias" do PS.

Ela conteve todos os condimentos: a travessia do País, as bandeiras e os hinos, o apoio dos dinossauros, os comícios e os discursos e a maledicência. Ligando a televisão, sem antes nem depois, era como se estivessemos em plena pugna pela chefia do Governo entre partidos e - supostamente - programas diversos. Afinal, tratava-se apenas de uma questão interna dos socialistas; mas ninguém diga amanhã não sucederá o mesmo com outro partido qualquer: um precedente é sempre consequente. Ao que parece, Morais Sarmento já afirmou publicamente dever ser assim...

(Entrementes: Seguro foi apunhalado nas costas por Costa. O mundo redutor da partidocracia em que sempre viveu obrigou-o a fugir para a frente, à míngua de condições pessoais para bater a porta e mandar a outra parte, menos limpa, os vilões que o atraiçoaram. Esquecendo não serem os elegíveis a perseguirem os eleitores, mas o contrário. O resultado foi uma derrota contundente, uma humilhação, a premiar semanas de pose estadista e retórica triunfalista. Com óculos, como Constâncio...).

E no dia da contagem dos votos, Costa apresentou um quartel-general hoteleiro, sondagens, manifestações cá fora e o discurso do vencedor. Tal qual ganhasse umas Legislativas quaisquer.

Ganhou apenas as "primárias". Quer dizer, o passo inicial para se abalançar às "secundárias": a governação do País.

Doravante será assim: os partidocratas guerrear-se-ão entre si, dentro de si, antes de partirem para o combate final com os seus congéneres das demais facções. Dirá a modernidade - à boa maneira americana...

Se isto não significar o fim da sua hegemonia, a emersão das candidaturas locais, é caso para dizer definitivamente: pobre Portugal!

 

 

Cena de um quotidiano improvável

João-Afonso Machado, 28.09.14

Lisboa mundana, imprevista, matinal. Convergindo para a Baixa, babel, a fervilhar de turismo, exotismo. Quase atarantada entre espectáculos e momentos de única beleza espreitando as esquinas.

Lisboa sem saber para onde se voltar tal a grandeza de tantos mundos. Mesmo sob a chuva e o vento, trovejava, no recente esgueirar dos tuc-tuc's.

E Lisboa subitamente marialva. De jaleca e chapéu à mazantini, muito gingona. Como se no Terreiro do Paço ou na Praça da Figueira as estátuas acordassem o regresso ao Tempo. Correndo campinas na Rua do Ouro.

 

 

"Máquinas Antigas"

João-Afonso Machado, 25.09.14

 

Imaginem os mais novos a Rua Adriano Pinto Basto com dois sentidos de trânsito, o estacionamento permitido em ambos os lados, os automóveis movimentando-se vagarosamente, fluidamente, e espaço sempre, mais aqui, mais além, para parar, encostar como é devido e registar um totobola na Casa Voga…

Era assim, vão lá umas quatro décadas! Quando a Estrada Nacional Porto-Braga ainda percorria aquela artéria!                                     

Depois, de um modo galopante, tudo se modificou. Restou apenas esta memória de tranquilidade e das mais usuais viaturas da época. Os Carocha, Fiat  600, 2 CV, os Taunus, Cortina, Peugeot 404… Esses que agora já tem honras de classicismo e vão aparecendo em exposições ou nos desfiles de automóveis antigos.

Encontrei-os, muitos, em visita recente ao Museu do Automóvel, em Ribeirão. Percorrer os arruamentos desvitalizados do Lago Discount não é uma aventura particularmente entusiasmante. Uma coisa é a quietude das terras, outra a fantasmagoria das portas mudas e das janelas cegas. E só do lado de lá das paredes de um desses imensos armazéns parecendo dormir a Eternidade, recuperámos as necessárias cores da vida. Quando uma panóplia inteira de obras de arte surgiu, cheia de peripécias estradais, ante nós.

E outra surpresa também: o Amadeu Melo, o insigne director do Museu, foi colega na primária e no liceu e é um reencontro após quase uma vida toda. O funcionamento da instituição ficou logo devidamente explicado: ali repousam automóveis e motas pertencentes a clubes e a particulares – a coleccionistas, portanto - que os levam e trazem, ou substituem por outros, assim lhes apeteça. A fila de espera para mais internamentos é grande, exíguo o espaço para os acamar. Porém, graças a esta rotatividade, as novidades sucedem-se e a “casa” ganha outra dinâmica.

Enfim, a história desse dia começou (por ordem cronológica) em dois Ford T, um Dodge, alguns Citroen, outros Austin Seven. E por aí fora nas estradas da memória. É claro, a gente não abdica já do conforto da actualidade, não vamos lá sem ar condicionado e alta fidelidade, nem o computador de bordo ou o GPS. Somente os carros de agora são mais feios, menos burilados. Todos iguais. E as motas também.

Resta o outro lado das boas (ou más…) recordações que são as nossas, as que guardamos connosco e pertencem aos primórdios da contemporaneidade de cada um. Aí pontificam os carros em que éramos levados à escola ou viajávamos para férias – e, se não nós, o vizinho rico, o tio bem sucedido. Máquinas que integraram o nosso quotidiano e ressurgem agora no Museu de Ribeirão, num sorriso saudosista de jantes de lata, pára-choques cromados, volantes de massa, painéis minimalistas, inumeráveis botõezinhos e chapa, muita chapa. Como se, neste instante, o Kadet branco da Avó arrancasse pacatamente (depois de uma arranhada marcha-atrás), a Casa Voga a findar-se na rua e, no meu consolado bolso infantil, a absoluta convicção do grande prémio Totobola singularmente ganho já no próximo domingo…

Era assim, pensamos, como se acordando de uma longa letargia. Com todas as histórias da vida – porque sem histórias não há vida – fazendo ponto de embraiagem diante dos nossos olhos.

 

(Da rúbrica De Torna Viagem, in Cidade Hoje de 25.SET.2014)

 

 

Outono longe da reinação dos camaradas

João-Afonso Machado, 24.09.14

A televisão, hoje de manhã no café, não se fazia ouvir, tal a algazarra dos presentes, mas as expressões faciais do Tozé e do Tony não deixavam ponta de dúvidas. Depois, à tarde, os jornais forneceram uns tantos pormenores e, sim senhor, naquele ar de fúria insultuosa, a peixeirada será o termo mais ameno para descrever o que se passou em mais este debate entre os dois candidatos a 1º Ministro do PS. Lá na reinação dos camaradas.

E quando voltar à escrita (depois da apresentação de mais um livro em Lisboa) a eleição terá já decorrido e conhecer-se-á o novo chefe do Executivo do PS. Claro, lá na reinação dos camaradas.

Nada disso importa, pois. Muito mais conta a estonteante velocidade do Verão e esta nova meta a que chegámos - o Outono. Maré em que andamos mais recolhidos, salvo quando soarem as trompetas da caça e o Alentejo começar a chamar. E Trás-os-Montes também. E elas, as pequenas, fazendo coro e as perdizes ginasticando as asas. Há uns estudos para fazer, entretanto, umas consultas de biblioteca, uns escritos em curso. Os dias amarelecem e a máquina fotográfica não parece querer deixá-los em paz. 

Tudo muito apartado da vilania que vai lá na reinação dos camaradas.

 

 

É tudo o mesmo entupimento

João-Afonso Machado, 22.09.14

ANTÓNIO SANTOS.jpg

A Baixa lisboeta inundou por entupimento e o edil-mor está no Porto Canal a dar uma entrevista seguramente contra - Seguro. O qual, já todos perceberam, estará noutro canal qualquer contra - Costa. Talvez acusando-o de não andar no terreno bombeando as águas. Tudo isto é caricato e, com alguma sorte, didactico. Se a turma nacional mantiver alguma atenção à aula.

Por uma simples razão: o que fetidamente se passa nos intestinos do PS não diverge do que acontece cá fora, num ambiente só de aparência mais saudável. A lógica (ou o pandemónio) partidário implica um confronto em que os interesses individuais ou de grupo (sendo o grupo algo sempre oscilante e resultante apenas de uma conjuntural reunião de interesses individuais) se sobrepõem ao bem nacional. Pela exacta razão de que a política há muito não é um serviço - antes um ofício.

Os portugueses tendem a maioritariamente perceber o drama em que assim vivem. E por isso abstém-se nas eleições em quantidades que envergonham a República. Mas é sempre bom acreditar em algo. Volto invariavelmente ao mesmo - este país só poderá ser reconstruído de baixo para cima. Isto é, começando nos municípios, onde a boa vontade e a despartidarização (ou a desparasitação) ainda são viáveis.

 

 

 

O grande tribuno

João-Afonso Machado, 21.09.14

Do político Marinho Pinto só por infelicidade lusa há muito a dizer. O seu sucesso político é apenas outra expressão da sua passagem pelo mais elevado cargo da Ordem dos Advogados e a anunciada renúncia ao Parlamento Europeu é, também, resultado dos seus dizeres e do tom de voz em que os diz.

O deputado Marinho Pinto percebeu, rapidamente, em Bruxelas andaria em absoluto anonimato. Os mandatos passam a correr (como tudo, à medida que os anos se sucedem...) e o regresso à Pátria não seria triunfal. Entre a escolha de uma família ideológica e a substância de um discurso oco ou preenchido por contradições, a carreira política de Marinho Pinto estaria à partida sempre condenada...

Acresce ser hoje inquestionável a sua falta de vontade em retomar a advocacia, abrir mão das entrevistas televisivas e reduzir a sua truculência à barra, ante magistrados, colegas e funcionários judiciais. É pouco, muito pouco, para quem andou este tempo todo nas parangonas dos jornais em guerra aberta com ministros.

Quanto ao mais, entre uma palavrinha de apreço a Sócrates e outra a Margaret Tatcher não há qualquer tolice, antes o jeito lampeiro de agradar a todos e manter a indefinição que lhe vale a sobrevivência à tona.

Por isso um partido que vem aí - Marinho Pinto costuma cumprir as imprevisibilidades que anuncia - e a sua provável eleição nas Legislativas. A áurea mantem-se, ninguém o pode acusar de nada ter feito porque só então é o momento de ele começar a fazer.

Mas, entretanto, viveu do ordenado europeu que se apressou a condenar por excessivo? Ora, se isso contasse, já neste País toda a gente se tinha decidido a trabalhar. Além do mais, os grandes tribunos nasceram para incendiar multidões e Marinho Pinto capacitou-se (sem qualquer rebuço) de tal predestinação.

 

 

 

 

Tudo como dantes

João-Afonso Machado, 19.09.14

CLÃ.jpg

Uma minoria significativa de portugueses acompanhou encarniçadamente a campanha referendária na Escócia. O outra parte, a da esmagadora maioria, seguiu o seu desenvolvimento apenas interessadamente. O que é o mais recomendável.

Mas não assim à esquerda, porque a Esquerda, onde lhe cheire a estilhaços, está lá a atirar pedras; e, à direita, em certas alucinadas franjas ultra-direitistas que rejeitam a Família Real britânica, dizem-na herege, de origem semita - circuncidada, sob juramento, foi escrito! - e, como tal, uma Escócia soberana é o que há de (etnicamente?) melhor.

Felizmente os escoceses, decerto por distracção, não atentaram na exaltada solidariedade dos tugas. E, numa histórica lição de civismo - que os ditos tugas não terão aproveitado - trocaram argumentos em campanha e votaram fleumaticamente nas urnas. O "não" ganhou por margem superior às previsões das sondagens.

Nada disto nos diz respeito. Todavia, o filme não acaba aqui. Em 5,3 milhões de escoceses, 500 mil ainda se declaravam indecisos no dia do referendo. O Reino Unido, em boa verdade, tremeu, assustou-se, e Cameron prometeu já alargar a autonomia do Parlamento da Escócia. Mas a Coroa nunca foi posta em causa e, havendo juizo, não tombará.

No restante... como procederia a Escócia sem libra, fora da UE e sem exército? Necessitada de imigrantes por carência de população activa e sofrendo, porventura, um acentuado fluxo de emigração?

O mais provável é ter realmente prevalecido o bom-senso.

 

 

É provável Nessie se abstenha

João-Afonso Machado, 17.09.14

J:\FOTOS\EUROPA\GRÃ-BRETANHA\ESCÓCIA\NESSIE.jpg

A brincadeira hoje lida algures sobre «em quem vota o Monstro de Loch Ness?», no referendo escocês, faz todo o sentido. A dissolução do Reino Unido, pese embora todo o historial "independentista" da Escócia, é uma obra magna na desestruturação da civilização ocidental. Já lá iremos... A referida "boca" é pertinente na exacta medida que Nessie já não é um mero símbolo do Norte da grande ilha, mas de toda ela, a Grã-Bretanha. Nessie deve estar, efectivamente, confusa e hesitante.

Estavamos, pois, na fragmentação do Reino dito "inglês". Esse tal que aguentou as cargas mais fortes da avançada germânica nas duas guerras mundiais, puxou as orelhas ao desvario argentino nas Malvinas, bate o pé aos excessos unionistas da Europa e vem ajudando os americanos no que nos é útil e desobriga de intervenções bélicas.

Conforme parece, o resultado do referendo é incerto. Na política, em caso de dúvida, deve entregar-se o ouro ao bandido. Seja, pois, a Escócia um Estado soberano. Até ver, a Coroa não é posta em causa - e uma vez mais na Coroa reside o derradeiro argumento de agregação. O resto, o tempo dirá. Ou então é mentira a verdade vir sempre à tona.

 

 

O "Estado" Islâmico

João-Afonso Machado, 15.09.14

A  declaração de guerra de 20 países a cerca de 30.000 homens armados é algo de juridicamente incorrecto. Mesmo dando de barato que a tão entusiasticamente propalada "globalização" despreza as sacrossantas fronteiras, tende a entender-se numa só lingua e incentiva a moeda única, deste modo pondo em causa toda a teoria do Estado e do estatuto de beligerância. Mesmo assim, até ver, o auto-denominado Estado Islâmico (EI) não existe como tal, resumindo-se à mais rica e sanguinária agremiação de terroristas de que provavelmente reza a História.

Sem embargo, o mundo está em guerra. Pelo menos enquanto acreditarmos esta forma de banditismo que nos presenteia com assassinatos ao vivo - e, qualquer dia, em directo - terá jamais o tratamento complacente que outros crimes (como a corrupção) vêm gozando.

O mundo está em guerra. Consigo mesmo, é o mais certo. Quem diria, as gentes, como que fartas de nada fazer, se guerreassem a si mesmas! E a brincadeira está sendo levada longe de mais. Não há efeitos sem causas e resta-nos esperar a Palavra do Papa Francisco seja ouvida pelos destinatários. Uns mais, outros menos - todos nós. Os 30.000 homens do EI, que os 20 países perseguem, são simultaneamente muito poucos e muitissimos. Um caso de polícia - ou um rastilho sempre pronto a mais uma tragédia ao dobrar da esquina. 

 

 

 

Das "Memórias de um Átomo"

João-Afonso Machado, 13.09.14

«E esta foi a minha escolha. É claro, podia ter optado por um qualquer Ferrari, chegava para isso e para muito mais. Mas, por amor de Deus, o meu novo-riquismo é selectivo, polido, cheio de cromados. Dispensa esses tiques germânicos ou italianos, seja nas marcas de automóveis, seja na fatiota, e elege o tweed e o Jaguar. Em tempos de crise, um XK140, porque o SS100 talvez fosse demasiadamente ostensivo. 

(Narrava eu esta mudança da minha vida, e logos os rapazes quase me entalaram na sua curiosidade - se eu recebera alguma herança e de quem, já muito amigos, compinchas, todos íntimos. Não, meus caros - expliquei - eu sou um empreendedor, não fico à espera do dinheiro caído do céu. Invisto, senhores, invisto. E gozando o mercado financeiro momentos áureos, apliquei os meus primeiros fundos em acções da Santa Casa da Misericórdia, as mais seguras desde o tempo da Raínha D. Leonor. Garante-o a CMVM e é só consultar o PSI20... De modo que arrebanhei uns lotezitos de Totoloto e Totobola e o resultado está aí à vista! Melhor dizendo, estará aí amanhã, à tardinha...)»

 

(Com o assentimento do meu prezado Amigo João da Ega, a quem mui grato sou).

 

 

Pág. 1/2