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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

O couce de Marco António

João-Afonso Machado, 30.01.14

Em recente entrevista ao Jornal das 9, na SIC, Mário Crespo interpelou o vice-presidente do PSD, Marco António Costa, além do mais, sobre os incómodos e malefícios da carga fiscal. Um tema muito em voga, mesmo porque os mais afectados somos todos nós, os que não se alimentam na mangedoura do Estado. Corria a conversa animadamente quando Crespo (que não é insuportável) lembrou, a propósito da despesa pública, a Presidência da nossa honorável República ser cinco vezes mais cara do que a Chefia de Estado espanhola.

Foi onde Marco António escouceou, picado pela mosca. «As ditaduras custam sempre menos, eu prefiro uma democracia que custe dinheiro a uma ditadura barata»!

A única coisa que Marco António prefere é não pagar pela batata-palha de que se alimenta e o dispensa de saber distinguir entre ditaduras e democracias. Não fora assim não seriamos obrigados a ouvir zurros desagradáveis e muito próprios de quem, além de, desde pequenino, circular livremente dentro do Estado, nem consegue discernir a Nação acima, e a legitimidade de quem a representa. Ou então, de quem, no nervosismo dos destituidos de razão e liberdade, confunde os rigidos rituais maçónicos com a livre expressão da vontade popular.

E assim omite a incontornável verdade: manifestem os espanhois não quererem mais o Rei e veja-se se este teima em se agarrar ao lugar. A Monarquia não dança o bailarico dos esfaimados por cargos públicos. Nem dispõe de quartos traseiros para apontar aos seus rivais.

Pelo menos é o que se diz nos países nórdicos, na Holanda, na Bélgica e... em Espanha. 

 

 

 

Quando havia Academia...

João-Afonso Machado, 29.01.14

A dita «recepção ao caloiro» não era coisa de que se falasse então. Havia, é certo, a obvia curiosidade de conhecer os recém-chegados à Faculdade - sobretudo as recém-chegadas - e umas inofensivas ameaças sobre os horrores da colher de pau; tudo cessava quando as jovens estudantes aceitavam como protector um colega mais velho, que era o que se queria. E depois tudo se processava pacíficamente. Lá para Março, dois meses antes da Queima das Fitas, o bando - uns trinta ou quarenta, oriundos dos mais diversos cursos - juntava-se à noite na cervejaria do costume, onde permanecia mais ou menos tempo, conforme as posses. Seguiam-se as serenatas, debaixo de qualquer desses lares que acolhiam meninas estudantes de fora da cidade, entregues à vigilância das freirinhas. Ninguém via mal nisso, nem mesmo a vizinhança, cantava-se fado, dizia-se poesia e era-se prendado com cestinhos descidos das janelas por cordas, e contendo cerveja, fatias de bolos, recadinhos em papeis espetados em peluches...

É claro, no dia em que se descobriu as saliências na parede por onde alcançar o primeiro andar e foi iniciada a escalada e, de gatas pelo patamar, já havia quem entrasse nas varandas amorosamente abertas pela ala feminina da brincadeira - nada espantou a visão das luzes azuis do carro da polícia aproximando-se velozmente. Foi só o incómodo de saltar abaixo, galgar o muro do quintal e correr e dispersar pelas sucessivas esquinas da rua. A Natureza fora escrupulosamente respeitada: os guardiões da ordem pública contentaram-se com a debandada, porque também eles já tinham passado pelos vinte anos; a rapaziada talvez ainda partisse para a cantoria em outro estabelecimento congénere; as religiosas, refeitas do susto e cumprido o ralhete às suas pupilas, recolhiam à cama; e as pupilas, rezadas em silêncio as devidas pragas às religiosas, à cama se resignavam também, esperançosas no dia seguinte.

A Queima das Fitas, na primeira semana de Maio, constituiria a apoteóse, recheada de acontecimentos interessantes como o "baile de gala", a "sarau cultural" (que rendia sempre uma namorada, vá lá saber-se porquê), o "rali paper" e outras bizarrias obsoletas. Um "queimódromo" era algo de impensável e perfeitamente dispensável segundo os usos da época.

Isto dito, percebe-se o que a "praxe", de que tanto e fala, não é. Não é, minimamente, a emanação do espírito académico de sempre. Não é mais do que uma repugnante e selvática demonstração de estupidez, ordinarice e falta de graça e imaginação.

Qualquer coisa que se baralha entre a prodigalidade de estabelecimentos de ensino superior e, sinceramente, explica em muito o desemprego a que está destinada parte substancial dos estudantes que o frequentam.

No mais, associar a tragédia na Praia do Meco à "praxe", ainda assim parece absurdo e matéria apenas para vender jornais.

 

 

"Maria Moisés"

João-Afonso Machado, 27.01.14

Voltemos aos lugares devidos no Panteão Nacional.

Camilo Castelo Branco, esquecido no - amável e generoso - jazigo da Família Dias Fortuna, como ninguém sobre interpretar a alma das gentes do Minho, a mais genuína provincia portuguesa. A sua obra parece sem fim, quase toda ela esvoaçando sobre esta terra onde nasceu Portugal.

Em Maria Moisés (in Novelas do Minho), o retrato atinge a plenitude. Estão lá todas as classes sociais do primeiro quarto do século XIX. Está lá a violência, a intransigência que todas vitima. Dos mais ignaros aos mais poderosos. E o mesmo se diga quanto à bondade ínsita em tanta gente de tão diverso nascimento.

É corrente os seus escritos terminarem no campo aberto da fatalidade. Foi assim a sua vida. Finais felizes, despojados de ironia - muito poucos, além de Maria Moisés...

O Minho é o que é. Melhor dizendo: foi o que foi. Esperançosamente: será o que foi. Quando voltar a ser a provincia que a regra e o esquadro administrativos dissiparam em distritos, mesclaram ao sabor sabe-se lá de que interesses.

Ficam, entretanto, as memórias.

E, neste aspecto, cumpre realçar o extraordinário trabalho do Grutaca - Grupo de Teatro Amador Camiliano. Ontem, no Solar de Pouve (Lagoa, V. N. de Famalicão), inexcedivelmente, dando eco à genialidade de Camilo em falares que superam a escrita do Mestre e fazem lembrar a terminologia que ainda conheci, a comunicabilidade dos minhotos, os apartes e e os códigos desta gente entre quem nasci e vivi e agora já não revejo entre os meus contemporâneos.

Espero claro fique, não se trata de falar mal português nem manter o obscurantismo. Apenas de salvaguardar uma alma que se esvai em construções em altura e numa mescla cultural a significar nada, além da perda de identidade de um povo.

No mais, prossigamos a globalização... Com Camilo no Panteão.

 

 

 

Os IOSNA e o meu querido filho

João-Afonso Machado, 26.01.14

Formalmente convidado e com asssento na primeira fila, fui ouvir. No Centro Comercial de Cedofeita, aproveitando a anual Feira da Música, onde até doi olhar para tantas memórias dos bons velhos tempos do vinil. Enfim, o momento não era de recordações, antes de apreciar esta nova banda. Dois guitarristas, o baixista e o baterista... e o vocalista. Sobre quem me pronunciarei principalmente.

A rapaziada sabia tocar. São os IOSNA. Da voz cantante ficam lembranças de Kevin Ayers, qualquer coisa dos Velvet Underground. Talvez Bob Dylan no seu Slow Train Coming... Enfim, algo de bom. Por acaso, o meu querido filho mais novo Bernardo.

 

 

Saudade

João-Afonso Machado, 23.01.14

Lembrarei sempre essa ida ao mar deixada em terra. A promessa e o sonho. As fotografias que não tirei a bordo, a praia um formigueiro lá longe... E as redes lançadas às águas, a dureza do remar. Não havia que duvidar: o arrais garantira lugar, a tarde inteira enchia-se de azul e do sono das ondas.

Por isso a conversa prosseguiu no areal, a corvina imensa, ainda com laivos de vida... E esta minha mania de ver e explicar o que vejo... Acordou-me o brado dos homens mais a norte, o barco galgara já a rebentação!

A corvina, o meu entusiasmo, a voz de então junto de mim. E a minha distracção: longe iam os tempos dos bois e da força braçal. Tudo fazem os tractores hoje em dia. E os motores à ré. Perdi o embarque, o arrais enrubescia de pressa. Aliás, como o mundo em geral. Esvai-se no tropel o suave sabor da saudade.

 

 

A geração sacrificada

João-Afonso Machado, 22.01.14

Ainda sobre a coadopção (todos sabem de quem e por quem) li de mais um intelectual de bancada, dos muitíssimos que pululam por aí, um comentário verdadeiramente extraordinário, capaz até de me tirar do silêncio que esta temática me merece.

Sustentava o aludido erudito (em resposta exaltada a alguém que se pronunciara contra), se duas mulheres partilhassem a mesma casa por meras razões de economia de vida, ninguém veria mal em terem com elas crianças; mas envolvendo a dita convivência cama (sic), já para esta trupe de fariseus - a que eu também pertenço, claro, - a maternidade pretendida se afigura escandalosa!

Evidentemente, com gente assim inteligente, a menos idiota ideia é não contrargumentar e deixar correr.

Evidentemente, também, o referendo votado pelo PSD é uma tolice. A coadopção vai conseguir a maioria e o mais é perda de tempo e dinheiro.

Evidentemente, enfim, a coadopção almeja sobretudo o degrau superior da escadaria que os "não homofóbicos"vem subindo, esse degrau onde aguardam (já não sentados...) a adopção plena por casais homossexuais.

Sendo tudo apenas possivel devido ao paupérrimo nível cultural, bem evidenciado pelo pensador acima referido, e à tosca ideia de modernidade característica da malta fixe que são a maioria dos portugueses.

Portanto o melhor é não fazer ondas. Dar a rédea toda ao legislador e à sua reverência face ao activismo do lobby gay. Deixemos a geração ora criança crescer e demonstrar os resultados dessas manigâncias.

Dirão que será uma geração sacrificada aos caprichos da cruzada gay. Pois será. Tal qual o foram outras gerações de crianças, no Vietname, em Angola, no Afeganistão, na ex-Jugoslávia, na Síria... O mundo é isso, é o que os homens fazem dele.

 

 

 

"Reviver o passado" em Penaventosa

João-Afonso Machado, 20.01.14

Talvez uns tantos ainda se lembrem e parem aqui, neste pontinho dos nossos anos de juventude. O local de encontro era junto ao liceu Carolina Michaelis... Depois da tormentosa viagem pela antiga estrada para Paredes, Penafiel, Casais Novos, Amarante... com desvio para o enrabioscado serrano que levava à Régua, a camioneta quase cedendo às vertigens a desviar para Baião, o caracol final, muito devagar, a tropa já toda num levante... e Penaventosa, quis o Senhor chegássemos!

A festa estava reservada para uma sala e um pátio voltado às traseiras. O lanche era substancial e com direito a cerveja. Uma camioneta inteira deles e delas dançava pela tarde fora, inocentemente, alegremente, ao som do Daddy Cool dos Boney M, já não sei de que êxito de Stevie Wonder e de outras coisas inconcebíveis. Porque viviamos então sob a pata feroz do disco sound.

Ficaram as saudades. A viagem nocturna na camioneta onde, bem vistas as coisas, tudo era permitido: abrir as janelas, enjoar, vomitar e até fumar e namorar. Além de, obviamente, implicar com o motorista.

A cabeça da eleita no ombro adequado, o discreto encanto da penumbra... Não era muita a ânsia de chegar... E Steve Harley e os Cockney Rebel, Come up and see me, make me smile, despontando nos tempos, uma nova era se avizinhava. Três ou quatro anos volvidos seria o entusiasmo imenso de o ouvir na praça de toiros de Espinho. Como se já numa outra vida.

 

 

 

 

 

Jantar de Reis

João-Afonso Machado, 19.01.14

Casa cheia no já tradicional Jantar de Reis, este ano na Colunata Eventos, no Bom Jesus do Monte, em Braga. Convidados de honra, SS. AA. RR. o Senhor Dom Duarte de Bragança e a Senhora Dona Isabel de Herédia, bem como o Arcebispo D. Jorge Ortiga. Presentes também inúmeros edis e um sem-número de confrarias oriundas de todo o País.

Mais de 400 convidados encheram a sala. A receita das insccrições reverteu a favor da Confraria de N. S. do Sameiro, assim como diversos objectos artesanais leiloados.

A festa terminou com uma sessão de fados de Coimbra. Um sucesso certamente a repetir no próximo ano.

 

 

O traçado republicano

João-Afonso Machado, 16.01.14

Agatão Lança foi primeiro-tenente da Armada e deputado já na recta final da I República. Enquanto parlamentar, legou à História algumas curiosas intervenções como, por exemplo, esta: «Prevejo grandes dissabores, se for levada a efeito a projectada viagem ao Brasil do venerando Chefe do Estado, como se anuncia na declaração ministerial. S. Ex.cia o Presidente da República será conduzido num navio de guerra do Brasil ou então irá a bordo de qualquer paquete mercante, como qualquer caixeiro viajante. Que vergonha para o País e que tristeza para a sempre honrada armada portuguesa!». Isto porque, ainda segundo o mesmo, «a marinha de guerra, conforme está, é uma coisa inútil, que deve suprimir-se ou, então é absolutamente necessário remodelá-la profundamente».

(Parece que, efectivamente, o PR atravessou então o Atlântico num navio mercante, numa viagem assinalada por paragens por falta de carvão, rebentamento de caldeiras, etc...).

Sobrevindo a II República, Agatão Lança manter-se-ia fiel à sua irmã mais velha, razão porque conheceu a deportação e o exílio em Angola e Paris e, por fim, a clandestinidade e a prisão em território nacional.

Era natural de  Viariz, no concelho de Baião, e um não desprezivel proprietário. Designadamente de uma alentada casa e de toda uma quinta a circundá-la.

Maçon iniciado em 1913 na loja A Revolta, com o nome simbólico Robespierre, terá sido ele a transformar a capela do seu "palacete" em qualquer coisa onde literalmente se depositariam o pão e o vinho. Um celeiro. E, enquanto a construção aumentava, o seu templo de outrora amesquinhava-se e hoje dele só temos a percepção resultante de umas peças graniticas ainda conservadas na beirada do telhado. Uma cruzita lá deixada por esquecimento...

A casa não é uma ruína. Mas é igualmente tristonha, estranhamente calada, parecendo dormir o sono de uma maldição. Marca indelével de que a República passou por terras de Baião.

 

 

Dói muito, a ruína

João-Afonso Machado, 14.01.14

Encosta abaixo, aquelas pedras mudas, vestígios de um tempo que foi. Foi o quê? Que somatório de alegrias e tristezas, deste modo cobertas pelas silvas, em esquecimento sem telhas?

Quanto desta vacuidade o País não guarda em todo ele?! Quantas paredes, assim perdidas, a cair como os dentes das idades mais desprotegidas?

Vemo-nos adivinhando dramas. Famílias numerosas e incapazes de prosseguir. Outras caducas de continuidade. Impasses entre desentendidos. Economias impotentes. Um mundo ultrapassado, incapaz. A vida, enfim.

No desenho das construções adivinha-se muita gente de outrora. Quem mandasse e quem obedecesse. Comunidades feitas de dias rurais, porventura costumes a roçar a barbaridade. Mas, em vez da adaptação, a dor da ruina. Não subsistiriam alternativas?

Portugal não responde à pergunta. Não sabe como. Os portugueses também não. E a nossa existência assim se arrasta. Sem rumo e sem destino à vista. Enquanto isso, o uivar do vento é o que antigamente era o mau presságio do uivar dos lobos. Agora, quase em extinção, à última hora protegidos - os lobos -  como peças de museu da história biológica.

 

 

 

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