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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

O melhor restaurante

João-Afonso Machado, 09.10.13

Dispunha-me já a escrever panegirico cuidado sobre os elevados méritos do restaurante: a quietude do espaço, o seu silêncio, aquelas tantas mesas competamente vazias; eu a chegar e a ser logo servido, o comando da televisão confiado à minha pessoa, canal e som a meu inteiro gosto. Queria mesmo agradar à patroa, registar ditos suculentos sobre a vitela estufada, amavelmente sugerir-lhe comprasse também o Ponte de Lima seco e o adamado e não apenas o loureiro... Em duas palavras, pregar no peito do restaurante onde muitas vezes janto uma douradissima medalha de ouro, estabelecer com ele um pacto de fidelidade.

Mas depois, ainda a tempo, lembrei-me isso seria o fim. As minhas entusiasmadas palavras poderiam chamar a atenção de alguém. Todas as mesas que habitualmente me circundam talvez perdessem a sua discrição e se tornassem palradoras. O estufado demoraria mais a ficar pronto e o vizinho do lado iria preferir um qualquer outro qualquer estupido canal televisivo; o jornal não estaria sempre à disposição e eu acabaria por abalar em busca de outro poiso de comida.

Por isso, o anonimato presidindo a estes encómios. É o melhor restaurante cá da terra justamente porque costumo ser o seu único cliente nocturno. Uma mimalhice pegada, enfim. Oh minha senhora!, tenha paciência mas deixe as coisas continuarem assim.

 

 

Esperando o ribeiro retorne

João-Afonso Machado, 07.10.13

Ainda faltam uns meses. Para o desbaste das ervas altas, sufocantes, para a ressurreição das águas. Como elas surgiram um dia, galopantes, cheias de vida e sonhos, uma avalanche deles. Esse foi o tempo que ficou.

É certo, o ouriço-cacheiro entusiasmava, a vizinhança reuniu, de lanterna em punho, era noite, procurando-o nas moitas. E a cobra e as suas diárias investidas sobre os peixitos, aquela vontade imensa de a agarrar... Mais o sapo-bufo, a tentação imensa de o deixar à porta dos únicos ciganos que vivem nestas bandas... Ou as cachopas, brincando eternamente pelas margens, lançando-se ao lodo onde coaxassem as rãs... Tudo são imagens que não se esvanecem, tudo foi fé e sorrisos sentados sobre blocos graníticos do "vale perdido".

Ilusões. Uma mentira que se lia nos restos dos piqueniques pirateados, não imperasse a distracção, senão mesmo a ingenuidade.

A única verdade daquele ribeiro são as trutas inexistentes mas imaginadas e queridas, os dias frios ainda por chegar. As pontes parecendo ir atrás da correnteza e os salpicos das águas de encontro às penedias. Com a máquina fotográfica captando poços, curvas, cascatinhas. E as cachopas espreitando das margens as memórias de um passado que jamais existiu. Então, sim, o quadro será genuíno como o Inverno e umas botas enlameadas tanto quanto o pensamento se limpou.

 

 

No aproveitar é que está o ganho

João-Afonso Machado, 07.10.13

Houve boicote eleitoral no transacto dia 29, em Ourondo, Covilhã. Motivo: mais um protesto contra a fusão de freguesias. Acho muito bem, compreendo perfeitamente a revolta das populações assim despojadas da sua identidade (quantas vezes secular...) pelas tirnas regras da Administração Central e da burocracia.

O facto é que este último domingo se realizou novo escrutínio, tendo comparecido, dos  460 eleitores inscritos, apenas dez.

Ganhou a CDU...

 

 

Machado, Fm

João-Afonso Machado, 06.10.13

https://www.youtube.com/watch?v=VOgFZfRVaww

Os Beatles já lá iam. Separados, faziam as suas carreiras a solo, circunstância que nunca foi do inteiro agrado da maioria, creio bem. Mas houve hits inesquecíveis e, em tal matéria, sobressaía John Lennon. Como, por exemplo, com o seu inesquecivel Woman:  «I love you / Understand the litlle child / Is inside your man / Please remember my life is in your hand / And woman hold me close your heart...».

Ainda na casa dos 20, todos acreditávamos isto fosse possivel. Se calhar, vezes houve em que foi!

 

 

 

 

À Tareja

João-Afonso Machado, 06.10.13

Não correu bem, minha amiga! A brincadeira andou de mistura com a obrigação. O metier. É certo, levantaste as perdizes todas, mas... sabes a que me refiro, não? Quantas vezes te chamei à ordem?

E o pior! O bocar! Então aquela perdiz que caiu na água e tão habilidosamente descobriste? Porquê a mastigação? Confundiste-a com uma canja? Esqueceste a minha hérnia? O que me custou descer lá baixo para colocar um ponto final no festim?

Não, Tareja, assim não. Seja esta a última vez!

E, já agora, repara na Mécia. Cachorra, andou sempre atenta e bem disposta, e que maravilha, na perdiz da tarde. Sem medo do estampido dos tiros, volteando no terreno em busca da bicha... Põe os olhos nela, não vá um dia ter de lhe perguntares como é...

 

 

 

 

Quase lá

João-Afonso Machado, 05.10.13

È amanhã, cachopas! As perdizes vão estar lá e quero-vos bem cientes do nosso primeiro dia. Vai haver tiros, vamos a ver se alguns tombos, caídos do céu, também. Tareja, tu és a mais velha, irás à frente com toda a atenção que já te conhecemos. Mécia, caçoila, prometo vou buscar-te depois. Quero-vos estátuas antes, foguetes telecomandados a seguir. A boquinha mole para não rlhar as perdizes. E o biquini para, se necessário, ir tirá-las da água.

Tudo como vos ensinei. Brilhai, minhas cachopinhas! Até porque na ala dos canídeos serão só vocês. Esta malta já nem cães tem, e os meus quero-os escritos a letras de ouro na História.

Vamos lá a isso, então. No final há feijoada...

 

 

Mais cinco... de Outubro

João-Afonso Machado, 05.10.13

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O republicanismo de Ramalho Ortigão é apenas mais uma mentira da República, ela própria. A circunstância de, logo em 1911, o escritor ver a sua casa devassada por um bando de caceteiros do Partido Republicano, sob a suspeita de esconder armas para a reacção é absolutamente verídica e... mais uma omissão da História do actual Regime.

De resto, as três Repúblicas apresentam, todas elas, um factor comum: a propaganda, a emulação. Disso mesmo dá conta Ramalho, nas suas Últimas Farpas (1911-1914), na seguinte forma magistral, quando alude ao Governo:

«Reproduzindo-se tão prolificamente, por meio da fotografia e associando assim a humanidade inteira às intimidades da sua existência, é indubitável que está o Governo, dia a dia conquistando um considerável relevo de simpatias aos olhos do mundo e sobretudo aos seus próprios olhos. É este, sem questão alguma, um dos mais relevantes serviços prestados à causa democrática, ao ressurgimento da nacionalidade pelo gabinete verde e encarnado».

E logo após:

«Além das felizes inovações introduzidas nas artes decorativas e sumptuárias (...) ao gabinete (...) cabe ainda a glória de estar, por meio de lavor intenso de reportagem, enriquecendo copiosamente a cacologia nacional com preciosos neologismos, entre os quais não quero perder o ensejo de registar o vocábulo homenagear,  (...) do qual é sujeito o povo (...) e complemento objectivo o Governo».

Afonso Costa, Bernardino, Salazar, Marcelo, Soares, Cavaco... Quantos deles não viveram quase só da propaganda do Regime? Da mentira transformada em verdade sobreposta a um sem-número de crimes e e golpes baixos, como recomenda a «ética republicana»?

Por isso desabafava Ramalho, ainda na mencionada sua obra: «A República Portuguesa continua dando ao mundo o mais espantoso e inacreditável espectáculo - existe!».

Miraculosamente, um século volvido, enxovalhada por toda a vergonha republicana, a Nação Portuguesa continua a existir também...

 

 

 

Na lezíria

João-Afonso Machado, 04.10.13

Corri a leziria despida, dada, num sussurro demorado, vivi-a, amei-a, senti a sua carne fértil, o seu sabor, toda a beleza das suas formas sempre jovens. Ouvi o silêncio do seu sol, o uivar do vento sobre o seu corpo deitado, plano, nocturno. Presenciei o frio a enregelar-lhe os ossos em manhãs de chuva, escorrendo água, avolumando-se de água como qualquer mulher em vésperas.

Qui-la sempre assim. Assim a revejo e continuo a querê-la.

Não fora a súbita mudança do tempo, capricho tão belo quão volátil. A lezíria, aclarando renovada, partiu. Ficou a bonança num já longinquo adeus à tempestade. Como se o arco-iris não necessitasse de alguns relampagos, uma forte bátega de chuva, primeiramente - até à almejada quietude das cores e das mãos dadas.

 

 

Do Costa, fresquinhas

João-Afonso Machado, 04.10.13

O sumo edil lisboeta falou ontem. Dirigiu-se ao povo socialista - aparentemente - a quem, em suma, anunciou a grande desconfiança que separa o eleitorado dos partidos políticos. Algo de que ninguém se apercebera ainda. Nem mesmo ante o sucesso dos movimentos eleitorais independentes e do elevado percentual abstencionista...

Por tudo, preconizou o sumo edil lisboeta, o PS deverá envolver-se mais nas lutas sociais, isto será, não as deverá deixar em mãos comunistas, sob pena, presume-se, de perder o comboio da revolta popular, o passaporte para a grande vitória que almeja em 2015.

E mais disse: o Ps tem ainda muito caminho a fazer até ser alternativa ao Governo do PSD, quer dizer, muito trabalho pela frente até...

... até o quê? Até conjugar um punhadozinho de ideias coerentes e plausiveis, que convençam e garantam uma mudança para melhor?

Ou até ao piparote em Seguro e à liderança do sumo edil, desta feita transformado em chanceler da República?

Num caso ou noutro, o que pensar deste programa e desta figura?

 

 

Avieiros

João-Afonso Machado, 03.10.13

A explicação simplesmente encantou-me. Avieiros!!! Eu não calculava, mas... gente oriunda da Vieira de Leiria, gente da pesca, necessáriamente. Parece que, ou por comboio - foi em finais do século XIX - ou mesmo via marítima, chegaram ao Tejo, onde se fixaram nas margens até à Azambuja. O que teria sido a passagem do Búgio a bordo! O mundo inteiro há-de ter sofrido... Eles também, é claro, registos de acidentes é o que falta para estabelecer o entoar próprio da migração. O certo é que a pesca não chegava nos longos meses do mar mais rebelde.

Os pescadores trazem consigo sempre as cores próprias do infortúnio e da esperança. Trazem devoção e esperança e uma vida parca. E habituados a uma existência madrasta, invocam santos e a Mãe Santa. E sobrevivem.

Fui encontrar os derradeiros vestígios desta saga na Póvoa de Santa Iria. Numa extensão da Lisboa cidade das fábricas e armazéns, algures entre dois mamarrachos, entre os caminhos bravos que levam ao silêncio do Tejo acossado. Como se um carreiro e uma transfiguração. Eles estavam lá!

No silêncio do cenáro fotografei. Amanhã poderá ser tarde. Tudo é tarde neste Portugal que desconhece a alvorada seguinte.

Agora, é um prazer saber que há ainda quem viva do rio. De um "mar" imenso que o juizo não garante se não transforme noutra imensa porcaria. Muito se pode fazer, porém. Até deixar que nada se altere...

Atentemos na sorte dos descendentes dos pescadores de Vieira de Leiria. Os avieiros.

 

 

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