Porque a culpa é da chuva
Há em todos nós, portugueses, um acto de contrição a fazer. Seja no mundo da política, seja em casa ou no trabalho - onde quer que elejamos alguém - um outro qualquer - para apontar o dedo e a causa de todas as calamidades. A culpa, enfim. Porque cada um (em seu próprio ajuizamento), se não é perfeito, é quase. Como escrevia Lambert, «vivemos com os nossos defeitos como com os odores do nosso corpo: não os notamos e só incomodam os que vivem connosco».
Daí a nossa infelicidade e o nosso fracasso. O nosso sofrimento. A nossa fuga. Daí o eterno e imerecido triunfo dos fazedores dessa desgraça toda. Esquecendo-nos permanentemente que os «maus governantes são eleitos pelos bons cidadãos que não votaram», na expressão de George Nathan.
(Ou que votaram e depois esquecem ou omitem que votaram. E que elegeram por isso).
Assim não aprendemos a viver, ou assim nos ensinaram a fugir às dificuldades da vida. Descrentes, desmotivados, é no cantinho do nosso comodismo que condenamos o próximo e nos esquecemos de mirar o espelho. Insisto: nas relações políticas, familiares, profissionais, sociais...
Sendo, ainda por cima, geralmente implacáveis. Gandhi - um franzino... - notava que «o fraco nunca perdoa. O perdão é característica do forte».
Porquê este arrazoado logo pela manhã? Porque chove e não vai deixar de chover. Porque assim não vai dar prá pescaria... Porque vivemos o Outono e o Inverno a suspirar pelo Verão. Porque o mal está no frio, ou então na ausência de calor. Porque assim nos conduzimos na vida, de braços caídos e apenas com olhos e censura para as graves falhas de quem nos cerca. Apostando sempre na desistência, quando «quem abandona a luta nunca vence e quem vence nunca abandona a luta» (Paul Schmitt).
Acontecerá, por vezes, mentirmos a nós próprios e aos outros, não tendo sequer andado na luta... Mas ainda aí, justificando-nos com as atitudes de quem, ao nosso lado, é a origem dessa opção e desse mal causado.
Não vale a pena: somos todos assim, salvo os que não são e nos cavalgam de todo o jeito e feitio. Por isso, só a ninguém (em particular) podem ser dirigidas estas palavras.
Fim de citações.