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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Retrato-robot

João-Afonso Machado, 30.01.13

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E o final foi assim: afinal não era. Num sorriso macaco, dicção nada convincente.

A seu lado (à sua direita) um olhar divertido, gaiato, de quem pregou a partida; na outra banda (à sua esquerda) a pose meditativa, atirada para o firmamento, de outro profissional das manigâncias.

A Imprensa não se coibiu de frisar o vendaval em mais uma conspiração política intra-muros.

Nitidamente com os dedos escorregando na humidade do musgo, a figura central do enredo balbuciou palavras pouco firmes sobre a recandidatura à Câmara Municipal. Parecia envelhecido. Triste e vergado ao peso da traição que o atingia.

Nada foi digno de crédito.

Crê-se ser um retrato fiel. De quem?

Achega: o cenário é actual. Nele não intervém Bernardino, Costa (Afonso) ou os seu sequazes. Mas alguém invocou a famigerada trilogia Liberdade-Igualdade-Fraternidade...

 

 

"Espelho"

João-Afonso Machado, 30.01.13

Meu fogo de queimar

o atear o jogo das ideias,

minhas palavras meias,

 

susto, dor, vã alegria,

amanhã

sem noite e sem dia.

 

Fúria sã,

espuma incolor, lamúria

em transe de louvor

passos de aleijado, incúria…

 

Amargurado!

 

Ao sabor das horas,

paredes minhas, veias de que vivo

e se esvaem em demoras,

crivo negligente, mentiras esguias

passando rente

e a gente jurando

 

eu não chorava

e tu sorrias.

 

 

 

A discrição dos lugares

João-Afonso Machado, 29.01.13

Deve haver quem não goste ou já não se consiga adaptar. Mas a comparação revela um abismo, e a sonoridade dos dias não cessa de diferenciar as duas realidades:  a grande cidade e a provincia urbana.

Do amanhecer ao anoitecer, a marca é cada vez mais distinta: na fluidez do tráfego, nas distâncias entre onde se está e para onde se vai, no ritmo de trabalho medido minuto a minuto, enfim, na disposição anímica de quando se reentra em casa.

Antes das drásticas decisões, a modesta opção por um mundo simultaneamente longe e perto. Perto, sobretudo, de nós próprios; longe, essencialmente, de estéreis confusões e perturbações.

Algures entre a pacatez provinciana e o bulício das metrópoles sem alma é onde deverá ficar a alternativa radical da emigração. Por via de regra, um amontoado maior de implacabilidades, de onde os sobreviventes regressam com o seu pé-de-meia ou a heróica menção de uma carreira triunfal. Evidentemente, o que se deseja é que quem vá - retorne convicto de que valeu a pena. Não se trata de apologética, somente de recordar existe vida para além dos grandes desígnios profissionais.

 

 

 

"E depois do adeus"

João-Afonso Machado, 27.01.13

O título é bem escolhido. A série, quase excelente (não ficariam mal umas imagens de arquivo sobre a destruição das sedes do CDS, já que à do PCP em V. N. de Famalicão foi dado o maior enfase...).

Mas o drama dos retornados - afinal, como eles sempre sublinhavam, refugiados do Ultramar- é muito conseguidamente desenhado. A perda dos seus bens, as longas filas de desespero ante o Banco de Angola, o nada que se fez para lhes dar emprego e subsistência, vem lá tudo. Confirmadamente, após dois episódios, na RTP1 aos sábados à noite.

Foram muitas centenas de milhar de portugueses as vítimas de Rosa Coutinho & Cª. A sua integração, tortuosissima, na nova vida a que os obrigaram, uma vez mais um dos expoentes altos do E Depois do Adeus.

Acresce o salutar e oportuno olhar sobre os lados mais ridículos e caricatos da Revolução, mundo insano de kamaradas.

Há-os - dos mais responsáveis - ainda vivos e impunes. Bem falantes, bem instalados, bem consigo e com as suas consciências a quem não pesam as muitas mortes e a muita miséria de que foram causa.

Ainda assim, tudo poderia ter sido pior. Não triunfasse a coragem de homens como Jaime Neves, que hoje partiu e está numa vida melhor. A quem deixo, por isso, uma obvia palavra de homenagem.

 

 

 

Cedofeita

João-Afonso Machado, 25.01.13

Ao longo das décadas o percurso de milhões e milhões. A guardar na memória bem viva desses outros tempos dos eléctricos, para cá e para lá, uma enfiada de carreiras vindas dos quatro pontos cardeais, confluindo na Cedofeita que se esvai esquecida. Como o mundo era mais largo! Com ambos os sentidos, todos os sentidos, e um espaço onde se circulava, estacionava e calcorreava. Prenhe de lojas e comerciantes vergados ao peso de gerações de comércio. Cedofeita encarnava o Porto, desde que ele transbordou das muralhas da cidade.

No inverno, as luzes, a boa guarida num cafezito qualquer. Crescendo os dias, aquecendo o ar, a visão de sempre no fim da tarde: o burguês posto na janela, já desengravatado, envergando qualquer coisa parecida com um casaco de pijama. A mirar o trânsito e os transeuntes. Era o merecido relaxe, após um dia inteiro de balcão no andar inferior.

As vidas não iam além disto. Desde a juventude, por todo um corredor terminando só nos dolorosos anúncios dos falecimentos. A igreja não ficava longe, nada era afinal muito demorado. E, como escrevia Ruben A., os eléctricos continuavam tangando via Carvalhosa... Enquanto os doidivanas dos estudantes riam e cantavam, esses estarolas!

 

 

Correio do Minho

João-Afonso Machado, 24.01.13

Ex.mo Senhor:

Dr. António José Seguro

Largo do Rato - Lisboa

 

Ex.mo Senhor:
Era, de Aquiles, o ponto fraco o seu calcanhar. (Nós, minhotos, como se aperceberá, somos ainda muito ledores do Camões épico). E, de V. Ex.cia, inócuas, as sobrancelhas. Esse arquear indiciador de ciência e evidência, quase uma ogiva por onde pretende fluam argumentos irrebatíveis, um imenso saber académico, litradas de bom-senso. Como se o quotidiano político fosse uma mesa-redonda a abarrotar de retórica. E é, mas não é só. Assim o vão ensinando os seus próprios correligionários.

«Qual é a pressa?» - indagava V. Ex.cia, ontem ainda, sentindo-se ultrapassado por quantos dos seus foram à frente e cavalgam já a monção benéfica.

É, V. Ex.cia descurou o histórico episódio do Samorim de Calecute. E vê-se, repentinamente, entre a parede e o punhal da traição. Aturdido pela surpresa, repete a interrogação - «qual é a pressa?». Mesmo sentindo picar-lhe no externo o aço frio e conspirativo, insiste ainda - «qual é a pressa?». Com alguma dose de heroísmo, reconheça-se. E não menos propensão para mártir às mãos dos de Mafoma.

Por tudo, será o lugar que a História lhe reservará: o das vítimas inocentes, crédulas, quiçá inuteis. Decididamente, não pérfidas. Mas, santo Deus, não arqueie mais as sobrancelhas: antes abra bem os olhos.

E veja quem o cerca...

 

De V. Ex.cia,

um evidentíssimo e leal opositor que já não sorri, mas lamenta,

sempre ao dispor de V. Ex.cia,

atento e respeitador,

 

JAM

 

 

Era o que mais faltava...

João-Afonso Machado, 22.01.13

A notícia é de hoje e deve assinalar o dia em que Luis Filipe Meneses disse adeus ao galarim porque esperou todos estes anos. Ou seja, o PSD comina com a expulsão os seus militantes que apoiem outros candidatos à Câmara Municipal do Porto.

Não é que a parada fervilhe de excelentes opções. Rio deixará saudades, fatalmente. Mas entre Meneses e Rui Moreira... a escolha é obvia ou o independente ficaria em casa. E desta vez não fica.

Será até essa a razão para a imposição do costumeiro voto de fidelidade partidária, essa rematada estupidez que obriga ao silêncio na rua e suscita a vingança na urna. A traição, afinal; dessas em que o atraiçoado é sempre o último a saber.

Portanto, Meneses, conte lá com um voto a menos, desde já. Lamentavelmente não serei punido porque felizmente não sou PSD, e recuso qualquer filiação partidária.

 

 

 

Ecos do tempo bravio

João-Afonso Machado, 21.01.13

A força e a dimensão das águas dão o mote e abrem caminho à tempestade. O mais é o uivar do vento e todo um ambiente que verga à sua força. A natureza pega finalmente nos instrumentos e a orquestra entra em fúria. Principiou o fim, pensamos, confortados pela beleza do espectáculo. A raiva dos elementos lava-nos a alma de outras perorações, da vacuidade das imprecauções diárias.

Não que a tempestade não mate por vezes. Mas não é contra ela que se revoltam os sobreviventes e os filhos das vítimas. A árvore tombando fatalmente será sempre o rosto visivel da imprecaução dos homens. Outra tempestade em outro formato, o da guerra palavrosa e permanente entre a nossa espécie.

Agora discutir-se-à porque foi como foi. Esgrimir-se-ão culpas. Os argumentos humanos são maçadores e a natureza aproveitará para repousar um pouco. Em plena época alta, ainda há muito para alagar, quebrar ao ritmo da ventania, senão mesmo das trovoadas. Enquanto os humanos não se previnem.

 

 

Vem aí outro "centenário"

João-Afonso Machado, 18.01.13

O PCP vai comemorar grandiosamente o centenário do nascimento do seu inigualável líder Álvaro Cunhal. Nada que nos deva admirar, conhecidos que são os costumes comunistas de mumificar os seus heróis. A festa é para eles e ninguém lhes retira o direito de nela participar longe de quaisquer  perturbações, dessas muitas que constam da habitual panóplia de esquemas com que a Esquerda gosta de interferir nas iniciativas que não lhe são simpáticas.

Ainda assim, ficam-nos nos olhos imagens confrangedoras, inexplicáveis. Como, por exemplo, a da fotografia de Cunhal abraçando a mãe de Catarina Eufémia, em pleno cemitério de Baleizão, em emocionada expressão prestes a verter lágrimas.

Que à sua volta se urrasse a plenos pulmões e de punho ameaçadoramente erguido - «morte aos fascistas!», não estranha. "Eles" não sabiam, "eles", alentejanos nunca saídos do Alentejo, limitaram-se a acreditar  - como muita outra boa gente - na patranha. Mas Cunhal sabia.

Cunhal, nascido em 1913, acompanhou todo o mortífero percurso de Estaline. Conheceu, in loco, a sua imensa capacidade de aniquilar. Não podia ignorar a gelada eficácia do KGB: décadas e décadas de gelada eficácia do KGB. E o quilométrico rol de balas assassinas com que se inscreveram os seus agentes na História.

Sendo assim, qual a sua autoridade moral para se pronunciar acerca dos excessos da nossa GNR?

Quantas Catarinas Eufémias eslavas (e inconformadas, também) não terá desprezado durante a sua estadia na URSS? Justificando homicidios atrás de homicidios, decerto, com o rótulo de "reaccionários" atado ao dedo do pé das vítimas...

Ninguém sente, em todo este processo, um cheiro imenso à mais revoltante impunidade?

 

 

De Ponte de Lima

João-Afonso Machado, 17.01.13

A gente vai vagueando por ali, entre o granito e a solenidade das fachadas, e é como se de repente levasse com um pedaço rubrissimo de Revolução em cima. O Che Guevara por estas bandas? E quase se teme pela vida, pavorosa visão de fuzilamentos em massa.

Mas não. É só o Rampinha, uma cervejaria de um aficionado do velho Ernesto, um espírito pacato, alma de excêntrico, infelizmente esta semana levada à presença do Criador.

Luis Tavares trazia o seu estabelecimento forrado a fotografias do seu ídolo. E, em lugar de destaque, essa célebre que ele tirou ao lado de Camilo Guevara, seu filho. 

A vila lamentou e sofreu a morte de Luis Tavares. Lia-se ontem no JN, curiosamente, ser o Rampinha «uma ilha num município rodeado de democratas-cristãos por todos os lados». Ah!, a argúcia e o saber imenso dos nossos jornalistas! O que eles conhecem da vida e da história e da  civilização e de tudo!

 

 

 

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