Um minhoto na Capital
Era um inusitado movimento de gente desde o Largo de Camões. Pela Calçada do Combro abaixo, bandeiras vermelhas, bandeiras negras, ainda pensei fosse a claque do Olhanense, o Algarve inteiro, mas ela - ah!, sempre tão bela! - vindo de repente na esquina da Travessa André Valente, fez-me reconhecer a burrice da ideia, então onde é que as cores clubisticas se dividem em bandeiras separadas?
- Não, meu caro, é mais uma manifestação contra a maldita austeridade!
Recém-chegado da terra, aliás muito comiserado ante o desemprego grassando entre os meus patrícios, que buscam desesperadamente combatê-lo, ouvira já as notícias, na Capital é assim: a chatear a Polícia, à pedrada contra tudo, é assim se crê surjam do céu postos de trabalho. Distraidamente pensara até, ao ligar o televisor, ser a Monarquia, enfim, investindo contra a República em S. Bento, na sacrossanta reconquista da "Casa da Democracia". Fugaz lampejo... Ao ouvir o «filhos da p...» uníssono e ritmado, mais o estrondo dos petardos, ao perceber a "sopa de calhau" e o garrafame pelo ar, logo conclui não serem os meus. Eram os deles, os da macacada.
E lá lhe fui recomendando - sempre tão frágil... - não se expusesse. Assim como assim...
Mas qual! Foi uma enumeração prolongada de tribos, os sindicatos, os «indignados», os facebookianos, os estivadores, os marinheiros (essa malta fatal do fatídico Arsenal), a rapaziada do Bloco... Quase mais as tribos do que os barulhentos tribais. Não tardou a chuva de estrelas calcárias contra os agentes de segurança, cuja resposta sobre os propulsores dos ditos mísseis demorou umas horas mais.
Mas chegou, enfim. E foi então um ver se te avias. O largo vazou em menos de um instante e para a história ficaram umas bastonadas, mais um coro de insultos, algumas vidraças partidas e quaisquer detidos. Ocorreu-me, na confusão (e na prudência do nosso recanto de observadores):
- E se, para a próxima, montássemos aqui uma barraquinha de cerveja e de sandes de moelas?
- ?!?!?!
- ... de pipis...
Mesmo percebendo que a minha vida profissional não iria pelo melhor, a minha amiga - sempre espertalhona! - alvitrou:
- Sim, talvez, uma roulotte... Mas bem apetrechada de taipais rígidos e de rápido corrimento... Blindados!