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O ribombar dos motores dá o mote, vindo ainda de longe da visão. É quando o cigarro acelera na boca e se fala em "cavalagens", "rotações", "espectáculo!". Há muita excitação no ar poluido, um frenesim de pernas. Ansiedade. A máquina não tarda aí, os olhos revolvem-se, brilham, e os prognósticos, os juízos técnicos, multiplicam-se. Quanto a indumentária, o colóquio não diversifica: o boné "à Lauda", o blusão carregado de dísticos automobilisticos, as sapatilhas... E um tratamento familiar com que se vai festejando a passagem dos concorrentes
(- É o Quico! Força, Quico! Dá-lhe gás!,
para invocar o malogrado Clemente Ribeiro da Silva, glória nossa da Década de 70, desgraçadamente morto por atropelamento em plena pista).
Os fanáticos das corridas de carros são assim. Eles e uma panóplia de gestos muito próprios, coisas de braços e esgares que pretendem exprimir a virtuose do maneio da alavanca das "mudanças", a música dos cilindros ou o baque das suspensões. A velocidade dos sonhos e dos bólides.
Depois é a linguagem e a sinalética. (O trabalho que me deu decifrar a expressão - "sacar uma faniqueira", concluido, enfim, quando soube desse outro designativo da corda com que se faziam girar os piões...). Mais a ciência e a avaliação dos dotes dos preparadores mecânicos, debitada sobre as pernas de quem ainda não viveu além da bicicleta ou da motoreta.
Um implacável tribunal, um juri constituido por assobios aos prudentes e por aplausos aos temerários. Porque as corridas automóveis são, sobretudo, o aparato, a batidela, o despiste. Gasolina e adrenalina.
- Vrum, vrum, vrum!...
soltam-se os pedestres com o "pé na tábua" a fundo em quimeras e megalomanias. Entre "bocas foleiras", incentivos aos heróis e gargalhadas alvares. Por vezes no circuito, em regra à mesa do café.