Memórias de ...
Esta curva... Vão lá os anos de uma vida cheia de atropelos e era Carnaval. Já não lembro destinos, apenas a hora tardia em que seguíamos não sei para onde. Mandava a escuridão e uma fila breve a obrigar-nos a parar. Acidente!!! Naquela curiosidade parôla da morbidez saímos do carro em galope, rumo a um espectáculo pouco limpo, confrangedor. Tinha sido um choque frontal, os condutores estavam cá fora, tentando não descer da verticalidade, uma mancha enorme de sangue por eles abaixo. E um meu amigo, a um deles, no maior despropósito:
- Oh chefe!, você ultrapassou-me ainda há pouco!
A resposta obvia foi o silêncio de alguém que juntava forças para não cair, encostado aos restos de um Citroen, fazendo contas para saber de que lado estava: se de o de cá, se o de lá. A ninguém sobravam forças para a costumeira discussão das culpas. Eram dois homens, dois vultos corridos de vermelho e roupa rasgada, somente pedindo o mais elementar pedido - socorro!
Há décadas! Tantas quantas o tempo da ambulância a chegar. Doeu-me a dor daqueles azarados. Longe vinha o tempo das protecções de agora, os sinistrados curvavam-se às punhaladas dos frisos cromáticos, o estarem de pé só se deveria ao treino de antigos combatentes em África.
Nada mais soube. O mundo faz-se de desejos do melhor. Assim os acidentados dessa hora vivam agora uma memória perdida. Felizes.
Para mim, o Carnaval acabara ali. Diria até - os meus carnavais definitivamente volveram noutra onda.