"Soldados da paz"
Nas circunstâncias de então, havia pompa nos bombeiros. Os seus quarteis eram lugares importantes das nossas terras. E, não raro, um súbito alvoroço matinal, e ei-los na rua, em desfile magnífico, e a vila toda parando o que estava a fazer para assistir.
Tambores e tamborins, o bate-pratos, tropetes e clarins, o hércules do bombo, com um avental semelhante a uma pele de leopardo, suando em bica, implacável na cadência... Era a banda, a fanfarra. O restante da corporação marchava à frente, em duas filas extensas, todos com as suas fardas azuis e os botões dourados - os botões dourados muito deitados sobre o ventre azul do Comandante, compenetradíssimo... - a machadinha ao ombro e a outra mão para diante e para trás, o passo acertadinho e curto e os capacetes metálicos, quase remeniscência dos arcabuzeiros. E, quando não, o aparato das viaturas, a ambulância, dádiva de um benemérito local, o auto-tanque, novíssimo, a estrear funções já no próximo incêndio...
Ser bombeiro era um estatuto importante e a antiguidade um posto e pasto para peitaças de condecorações. A hierárquia, da maior complexidade, carregada de continências, tudo incluia, desde bigodaças retorcidas a irremediáveis e lustrosas calvices. E o alto magrinho marchava ao lado do gordo baixinho, ambos com o mesmo garbo e distinção e uma expressão rigida de veterania, precedendo sempre os mais novos - a quem competia agora desenrolar as mangueiras e apontar as agulhetas no «teatro de operações».
E foi justamente o actual «teatro de operações» que deu cabo da antiga pompa dos bombeiros. Já não têm tempo para desarregaçar as mangas, sempre numa correria louca de catástrofe para catástrofe. Lutando contra fogos e inundações e falta de combustivel. Com os quarteis atulhados de «meios» e por isso trasladados para a periferia das urbes, onde a parada é maior, mas tão distante do entusiasmo logo suscitado aos primeiros sons da fanfarra dos «soldados da paz».