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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Caça ao Ministro

João-Afonso Machado, 30.06.12

Não custa avaliar o susto vivido ontem pelo nosso Ministro Álvaro Pereira, o infeliz detentor da pasta de uma Economia já quase só imaginária. É o episódio covilhanense da turbamulta a lançar-se sobre o seu carro, inédito, creio, pelo menos desde a oportuna agressão a Mário Soares nas Presidênciais de 1985.

A dúvida principal estará, porém, em saber o que se seguirá: o Governo ver-se-à impossibilitado de sair à rua? Vão prosseguir as injúrias, as bandeiras negras e vermelhas, os dísticos ofensivos, enfim, toda essa criativa e espontânea panóplia de artefactos sindicais? E a autovitimização, os gastos brados contra o «fascismo» sempre sequentes à necessária intervenção policial em tais circunstâncias?

Uma coisa é certa: vinte ou trinta pessoas não constituem uma multidão mas são as bastantes para o charivari. Os profissionais da agitação sabem disso e a CGTP-Intersindical está no terreno. Arriscaria dizer, com o maior entusiasmo: recordando, empolgadamente, os "bons velhos tempos".

(- Eh rapazes! E daquela vez em que sequestrámos os deputados da Constituinte?!)...

Azar nosso, a maré é realmente de crise. Senão - e com elevada participação, decerto - sempre se organizaria uma excursão a Paris. Revivalista, em preito de homenagem ao "Maio de 68"; e justicialista, em demanda de um certo estudante de Filosofia na Sorbonne, com bolsa e ajudas de custo pagas a expensas de todos nós.

Um rapaz de multiplos saberes, aliás, com obra arquitectónica de vulto precisamente na Covilhã.

 

"Matinal"

João-Afonso Machado, 29.06.12

Vagueando pelas avenidas

a cruzar tantas mil vidas

caladas dores desconhecidas,

 

faz nessa montra uma pausa

e inflama enfim a tua Causa;

 

duas moedas e uma compra banal

- talvez apenas o jornal –

e enche-te num assomo de Ideal.

 

Prossegue o devaneio depois,

tu e o teu querer ser, os dois.

 

 

"«No Princípio era o Mito»"

João-Afonso Machado, 29.06.12

Páris sentenciou a cidade

e o horizonte cobriu-se de velas guerreiras,

enquanto Helena fascinada

não chorou,

sequer pensou as negras cores da realidade:

 

amanhã famílias inteiras

reduzidas, senão a nada,

a si se contarão

muito aquém de metade.

 

 

Interpelação ao Ministério da Justiça (a segunda)

João-Afonso Machado, 28.06.12

Agora, quando o telefone toca, ninguém atende. Já nem aquela voz sumida mas simpática, desculpando-se imenso por ter ordens para não passar a chamada.. Não, o silêncio tornou-se absoluto no Instituto da gestão financeira do Ministério da Justiça.

Sabe-se porquê, começa-se a perceber com quem lidamos. Muito resumidamente - não há dinheiro para pagar as nomeações oficiosas de advogados; e não há cara nem carácter para reconhecer isso mesmo e pedir desculpas e apelar à paciência e à compreensão dos credores: os profissionais do foro que continuam a ser convocados e a trabalhar graciosamente.

Sem esquecer os gravíssimos contornos da crise, ainda assim, não parece seja modo de tratar os interessados. E não custará concluir este mutismo forçado resulte de ordens superiores. Da Senhora Ministra.

Daí o apelo: é com o Senhor Bastonário que a Senhora Ministra - caso escape à "remodelação" - tem o resto da legislatura para picardias que nada dizem aos advogados.

Estes querem apenas trabalhar e receber o que lhes é devido: sejam os honorários, seja uma explicação. Levar com a porta na cara é que não.

Por isso, direccione a Senhora Ministra o seu semblante, mais casmurro do que duro, mais mal-humorado do que decidido, sobremaneira e recorrentemente desagradável, para outros alvos, outros putativos adversários. Antes que os advogados em tal se transformem, realmente.

E não é só por si, Senhora Ministra - caso escape à remodelação. Tudo está como era. Atente, ao menos, no Governo e no Portugal em que afirma acreditar.

 

Vallis Longo

João-Afonso Machado, 27.06.12

Se não me trai a memória, saía-se do Porto pela velha estrada para Santo Tirso e Guimarães. Passava-se a infernal Areosa e ali, no Alto da Formiga, cortava-se à direita para Paredes, Penafiel, Amarante... Para um Minho ligeiramente menos minhoto ou, querendo, para a infinitude duriense.

Mas uns vinte minutos depois de terras de ninguém - paraíso de casas de alterne - surgia na curva a identidade própria de Valongo, uma pacata vilória, sede de concelho, creio que ainda não cabeça de comarca.

O primeiro momento de uma viagem demorada mas agradável. Valongo não descobrira então o fascínio da construção em altura, ia apenas numa história orgulhosamente tentada restaurar desde os romanos, desde Vallis Longo, através da Idade Média... de que, fatalmente, resquícios quaisquer haviam sobrado. Mas a gente acreditava e, olhando em redor, via alguns edifícios com o seu quê de apalaçados (nestas terrinhas morou sempre um "capitão" setecentista a fazer a ponte entre os lavradores ricos e os fidalgotes mais arremendados), umas capelinhas onde se adivinhava imensa devoção e culto, o café, palco dos mais empolgantes feitos - leia-se: discussões, discursatas - políticos da região, o restaurante famoso pelo seu bacalhau, pelo seu cabrito, os biscoitos tradicionalíssimos...

E a gente ficava contente e saciada com tanta simplicidade. Valongo fazia parte de nós, era o lado menos monumental do Noroeste, um quase esvair na fronteira marcada pelo rio. De bom grado se parava lá e bebia uma cervejinha, antes de retomar a direcção dos grandes e muitos amigos de Paredes e mesmo de Amarante.

Há quantos anos plantaram a A4 sobre os dedos dos pés de Valongo? Já não recordo. Foi o tempo de uma mata de cogumelos crescer serra acima e serra abaixo, sem nexo nem respeito, num atropelo ganancioso e desvastador. Restou quase nada depois das rotundas, dos prédios modernissimos mas já podres na dentição, e daquela desmedida galeria comercial, no centro, cínicamente chamada "Vallis Longo"...

 

 

As mil e uma pontes

João-Afonso Machado, 26.06.12

Há três ou quatro dias vou estando atento. A ocasião era de estalo: o sacrossanto S. João, a proximidade das "Autárquicas". Luis Filipe Meneses ordenou a primeira carga da cavalaria. O "castelo" da municipalidade do Porto é o seu objectivo.

Meios: nada mais - crisis, what crisis?  - do que a construção de três pontes (uma pedonal) e um túnel entre o Porto e Gaia. Administrativamente falando: é da fusão entre as duas cidades que se trata. Uma joia do seu ideário que larga no ar, qual balões, uma treta, enfim.

A muitos terá passado despercebido o rastilho. O JN encarregou-se de o bufar até hoje, não deixando a mecha apagar.

Evidentemente, não há suporte económico que justifique o programa. Financeiramente, então...

Aproveitei a oportunidade para ir falando com as gentes aqui do bairro. Por unanimidade - Porto é Porto, Gaia e Gaia. Parágrafo.

E reflectindo um pouco sobre o tema, sempre se dirá, não é um decreto que apaga diferenças provenientes do início da Nacionalidade. Tão menos o decuplicar das pontes. Com que cidade futura está Meneses a sonhar? Porto-barra-Gaia? Porto-traço-Gaia? Portogaia? Gaiaporto? Porto - só? Vilanovenses encolhidos?

O tema terá continuação. Para já, se Meneses quer maximizar as potencialidades turísticas do conjunto, promova o fecho do trânsito automóvel no tabuleiro de baixo da Ponte D. Luis. E, de caminho, tire de lá o rótulo «Ponte Luis I». Primeiro porque só houve um monarca assim chamado; depois porque os nossos Reis nunca perderam o tratamento de "D.".

Arriscaria ainda, a terminar: não é convocando o festejo elitista que a ideia se pega às populações. Arquitectos de nomeada, artistas de todas as artes, políticos oposicionistas, representam-se apenas - e muito bem - a eles próprios. Daí aos votos...

Ou talvez nada mais seja senão um passeio de Meneses a Barda... - perdão, a Budapeste.

 

 

 

 

Serralves

João-Afonso Machado, 25.06.12

Há um muro alto, há uma história, um passado. E décadas de vida trotando ao lado, sequer curiosas de ver, no andar cimeiro dos autocarros. Eram as árvores, um bosque, vagamente, e os ecos de riquezas faraónicas, decerto já desbaratadas. Até surgir um projecto e uma obra, o museu e um espaço amplo rodeado de cidade, quase a fazendo esquecer.

Serralves é o derradeiro recurso. Um sucedâneo. A Natureza nunca seria tão polida e simétrica, tão destituida de imprevisibilidade. Mas é uma dádiva do céu, isto de um homem poder deixar o apartamento por umas horas e correr os jardins e as sombras, ou o sol e uns campitos cultivados. E espreitar as rolas e as gaivotas e as pêgas e os melros. Sonhar, por momentos, numa estadia rural. Compreender o gosto dos urbanos pela leitura em um banco do jardim. Ou no namoro ou na sesta na relva. 

E ouvir o silêncio, agarrando o vácuo com unhas e dentes, a imaginar ser possivel não haver sempre filhos e enteados.

 

 

Regata de rabelos

João-Afonso Machado, 24.06.12

No culminar dos festejos do S. João, a regata de rabelos - representando, cada um, uma das principais marcas da famosa pomada duriense.

A partida é dada no Cabedelo, já quase na Foz; a meta fica na Ribeira. E este ano o pódio foi ocupado pelos Vinhos Cruz (1º) e pelas Ferreira (2ª) e Warre's (3ª).

Um momento de inusitada agitação no rio, de súbito avassalado pelos concorrentes, pela Marinha de Guerra, pelas embarcações turísticas e de recreio, por um enxame de motas-de-água. Quase fazendo temer o engarrafamento - porventura óbvio, tratando-se, como é o caso, de matéria vinícola...

De todo o modo, uma experiência que merece ser vivida. Creio mesmo, para o próximo ano terei lugar a bordo, num ângulo manifestamente mais favorável ao retrato dos acontecimentos.

Já quanto a uma outra regata - ou regadela, como se diz cá para cima - que Luis Filipe Meneses pretende promover: uma regadela de três pontes e um túnel no Douro, a fusão de duas cidades numa apenas, eis um tema para muito breve. No fundo, os candidatos ladram e as eleições passam. Rio abaixo...

 

 

S. João

João-Afonso Machado, 24.06.12

De repente, a noite transfigurou-se num caos de galope generalizado para as margens do rio. Já pouco faltava para as doze badaladas. E a cidade corria à frente dos ponteiros do relógio, de martelo sanjoaneiro em riste, escorregando escadas abaixo, no metro, galgando Santa Catarina, a Batalha, afunilando no Governo Civil, junto ao elevador dos Guindais.

Na fila de entrada, não conseguira, finalmente, vencer o tempo. Ouve-se troar no exterior, o fogo começara já, e a cidade esmorece - não fora lesta o bastante...

Mas reaje de imediato. Ainda é o começo, há muito para ver! O elevador inicia o seu trajecto, primeiro o tunelzito, depois aquela golfada sobre o rio, quase à altura do tabuleiro superior da Ponte. Quem veio preparado não deixa escapar o colorido sobre a negrura do céu, toda a ciência pirotécnica despejada naquele instante.

A cidade aperta-se na proximidade das águas, não pára de crescer e de se espremer ali, naquele cubículo, não sem uma pontinha de inveja de outros poisos só ao alcance de alguns. E a noite assobia apontada à lua, ribomba, estraleja, desfaz-se em miríades de tonalidades. Durante quinze minutos ameaça desabar sobre o mundo dos tripeiros e gaienses, até à girândola final: a dos morteiros e a das palmas da cidade delirante.

Depois é o regresso às rusgas. Ainda haverá muito arraial para todos. Os martelos atentam agora nas cabeças dos transeuntes. A sardinha assada povoa outra vez o ar denso das ruas.

É o S. João. Sem outra explicação. E sem distinção de sexo ou idade. O lugar próprio de todo o desajuizamento; para tantos, o contraponto de um ano inteiro de siso.

(Para outros, um caminho. Ao lado da cidade transfigurada, a busca do azul na escuridão. S. João e a tontice lado a lado com a crença nos milagres.)

 

Conferência na Lusíada (V. N. Famalicão)

João-Afonso Machado, 22.06.12

Decorreu hoje na Universidade Lusíada (polo de V. N. de Famalicão) a conferência organizada pelo Núcleo de Estudantes da Faculdade de Ciências da Economia e da Empresa, tendo por tema «Educar para a Cidadania no Século XXI» e orador o Prof. Doutor Manuel Monteiro. Foi convidado S.A.R. o Senhor D. Duarte, Duque de Bragança.

Em breves linhas: o anfiteatro encheu. Muitissima gente nova, aliás trajando, quase toda, capa e batina. Especialmente tocante, a chegada do Chefe da Casa Real portuguesa e o cumprimento que lhe dirigiu um estudante timorense. «Compatriota», assim o tratou S.A.R., num abraço em que a conversa se afastou da compreensão da maioria dos presentes, ou seja, de tantos quantos desconhecem os dramas vividos nesse longínquo ex-bocado de Portugal. De onde provinha, como fora lá, e a família?, e o futuro?... A emoção estendeu-se a toda a gente. Antes assim. A bem da História e do que há-de vir.

Uma nota ainda para o excelente apontamento biográfico sobre o Duque de Bragança traçado pelo Vice-Chanceler da Universidade Lusíada, Prof. António José Moreira. Pleno de respeito e verdade, sucinto mas rico, a levantar a sala em aplausos.

Ponto final. Prossiga a República, s.f.f. 

 

 

 

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