Regimentalidades
Em plena década de 80 do passado século, frequentei, durante 14 semanas, um "curso" de "Jovens Empresários Agrícolas" que me habilitou à candidatura de um apoio financeiro visando a instalação de um plantio de kiwis. O qual, por acaso, continua lá no sítio, em vez de se ter transformado, como a abóbora da Gata Borralheira, em algum automóvel da gama média...
O facto é que no dito "curso", vivido no Sameiro (Braga) e na Apúlia, os participantes dormiam dois em cada quarto, se calhar por contenção de custos, propaladamente para contrariar o espírito individualista dos minhotos e abrir as portas ao associativismo e ao cooperativismo. Essa a explicação de tão indigesta comunhão.
Talvez compreendam: o meu parceiro nunca deixou de manifestar a sua incompreensão face aos meus hábitos de leitura antes de adormecer e ao acordar, pela alvorada; no que me toca, espantavam-me as tainadas de salpicão e vinho imediatamente antes de fechar a luz e ferrar o galho. Sem falar já no duche matinal, um comportamento que eu, nessa idade, desconhecia ser não pavloviano...
Os anos correram e cada um seguiu o seu rumo. Recentemente encontrei um dos comparsas desse "curso". Em cima de um tractor, vendia melões na borda da estrada. Foi um grande abraço amigo e a conversa óbvia na circunstância: que é feito de cada um?
Todos (quase todos) tinham mudado de vida. Trocado a lavoura pelo emprego. Muitos (muitissimos) roçavam os males da penúria. Valia-lhes a nossa resistência no desenrascanso.
Eu só quero todo o bem, o melhor, para os meus conterrâneos, colegas e amigos. Essa a principal realidade. A seguinte é uma constatação: esta tropa que legisla nunca será capaz de compreender o país real. E lava as mãos, qual Pilatos, inventando parcerias do aludido calibre. Cumprido o regimento, o resto que se lixe.
E o resto - que é tudo - lixou-se. Amén.