A marcha da indignação
Entendamo-nos: a marcha da indignação que eu apoio não vocifera contra o Governo, nem sequer contra o sistema político, nos pilares que basicamente o definem. Outrossim, não põe em causa o Regime.
Também não será uma caminhada barulhenta participada por uma geração muito mais nova do que a minha. Cabe lá, na marcha da indignação, toda a gente, de todos os credos e proveniências. Aliás, ela estender-se-á muito além das nossas fronteiras, se é que ainda as temos.
Não, o que está em causa é o logro a que, durante décadas, fomos conduzidos. Essa espécie de canto da sereia a fazer-nos gozar o presente descurando absolutamente o amanhã. Enquanto, do lado de lá do planeta, outras economias floresciam e riam à socapa da obsolescência da nossa. Da do mundo ocidental, para ser mais claro.
Venho de uma família que tem terra, e da terra viveu, nunca sabendo o que é ter dinheiro. Desse dinheiro que se gasta em automóveis precoces (até ao final do curso universitário, foi sempre a bicicleta…), em férias mirabolantes e em tontices congéneres.
Já a faixa etária dos meus filhos nem espera pelos 18 anos para se abalançar à carta de condução… Isto para não mencionar os telemóveis e toda a restante parafernália tecnológica da actualidade. Apesar do seu comprometidíssimo futuro, os meus filhos, os filhos de todos nós, dispõem de muito mais facilidades materiais do que as ao nosso alcance na sua idade. E quem, senão os pais, as proporcionou, sem querer saber de consequências, sem sequer acautelar a trivial recomendação de estudo, trabalho, aplicação?
Gostámos de gastar, habituámo-nos a gastar, nem nos ocorreu que nem tudo são inundações: a seca surge também, como neste Outubro terrível.