Um pouco de pesca
Ela não pescava - rebocava carpas esfaimadas munida de equipamento de enorme calibre, uma autêntica grua. A lagoa transformara-se na antecâmara de uma cozinha, a todo o momento podia ocorrer a limpeza das entranhas, o amanho do peixe, a frigideira ou a assadeira. E eu em passeio, desconhecendo o potencial daquelas águas...
Sentei-me num penedo, pescando em pensamento. Um caniço de carbono, 4 metros de comprimento, calculei, um carreto pequeno a desbobinar nylon em vez de uma corda de alpinista... Mais uma boia de bálsamo, sensivel ao menor toque, dois grãos de milho a esconder o anzol...
Lançamento feito, a picadela, o esticão da praxe e o peixe cravado, a cana já em arco e a certeza de que à bruta, fosse carpa, fosse truta, lá se ia tudo embora. Toca a dar linha, deixá-lo cansar-se, só um pouco mais de freio, cautela nas voltas da manivela...
Alto - que o bicho recuperou forças! Abre o carreto outra vez, é mais uma corrida para o largo. Muito bem! Agora puxa, a resistência já não é a mesma... Isso, ei-lo a revoltear-se quase à superfície, vê-lo? Atenção, ainda lhe restarão bofes para a derradeira fuga. Eu não disse? Não te precipites, mantém só a linha tensa, ele vai afundar, está esgotado. Olha aí, o anzol não se descrave...
Pronto!, começa a recuperar fio. Mas devagarinho, a cana a meia altura. Encalha-o nas pedras da margem, a boca fora de água. E apanha-o à mão, segura-o pela guelra, bem firme. Não tenhas medo, não morde. É carpa, não é? Então deita fora. Só espinhas e insipidez... Deixa-a crescer. Para o ano será outra, em tamanho e desconfiança. Mas virá ao anzol, muito mais combativa.