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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Esta noite choveu cá...

João-Afonso Machado, 31.08.11

Um breve carreiro levava ao pátio acima do sopro de espuma da água na enseada. À noite, não antes, quando as orquestras de grilos afinam no breu do arvoredo.

É onde um grupo avantajado consegue produzir um silêncio de paz e maresia. Um silêncio musical, suave de vozes e do deslizar das ondas, a faiscar escamas dos cardumes à tona, o prateado do mar sob a lua cheia.

Ouviu-se uma guitarra e alguém cantou: «Country road / take me home / to the place I belong / West Virginia / take me home / country mamma». Pura e obvia, melodiosa brincadeira...

A madrugada deixou-se estar. Amenamente. Como uma pastilha para a ansiedade, desse remédio chamado Caloura. Fabricado em S. Miguel.

Imaginei-me no tom de fala e na temperatura de olhares de camisa desapertada que hei um dia de gozar nos Açores. Com quem eu cá sei.

 

A expectável governação da Direita

João-Afonso Machado, 31.08.11

O artista chinês Ai Weiwei, um critico acérrimo do regime autocrático de Pequim, escreveu recentemente acerca da grande tensão social existente neste País imenso. «Um pesadelo constante», nas suas palavras.

E adianta: «Pequim são duas cidades. Uma é feita de poder e dinheiro. (...) A outra é uma cidade de desespero». Ou seja de pobreza e opressão.

É bom que tenhamos sempre presente esta realidade. Ela é, em si mesma, a Esquerda governante.

Por isso a minha esperança no actual Executivo português. Por todas as medidas - insaciavelmente criticadas pela Oposição - que tem vindo a tomar, sobretudo no sentido de dignificar a administração dos negócios públicos. Se são, muitas delas, de escassa relevância financeira? Talvez. Mas traduzem um contributo inocultável para pôr cobro ao distanciamento entre a classe política e as populações. E incutem a indispensável noção da reaproximação, ou do não alheamento, daquela aos dramas existenciais destas.

Aguardemos os próximos dias. Creiamos em novidades porventura "revolucionárias" no combate ao despesismo do Estado e do Poder Local, apanágio da Direita sã e escorreita. Civilizada.

E não esqueçamos: o futuro de Portugal está, essencialmente, - e infelizmente - nas mãos de não nacionais. Com maior precisão, estreitamente vinculado aos designios da UE. Por muito que a Esquerda berre o contrário. Que ninguém espere milagres, por isso.

 

 

A última

João-Afonso Machado, 30.08.11

Partiu hoje, soube-o por um telefonema de agora. Presente do padrinho para a sua afilhada Joaninha. Era a mais pachorrenta da ninhada, espera-a uma vida decerto pouco ligada ao campo. Mas vai ser bem tratada e feliz, palavra de Joaninha!

Para a semana vou visitá-las: à afilhada e à cachorrinha, a baptizar urgentemente.

 

 

Porque a vida é assim

João-Afonso Machado, 30.08.11

Ia-se lá. Contra os protestos da assistência, os avisos dos prudentes, o escarcéu das vendedeiras nazarenas. Ia-se lá.

O olhar fixo da gaivota parece pedi-lo. Medo? Paralisia? Fome e sede?

Ia-se lá.

Não é impossivel a pedra esteja doente, salitrada, sabe-se o quê da força com que a terra a agarra?! Fuas Roupinho, dez séculos de lenda, a escarpa muitas e muitas dezenas de metros a pique. Uma morte certa, tão no fundo, estilhaços caindo sobre a praia.

Debaixo do azul carregado do sol dessa tarde - ia-se lá!

Talvez a medo, rastejando sobre a esponja empedernida, joelhos ensanguentados, os dedos de alguém tacteando os tornozelos estirados, derradeiro elo de segurança, obviamente um símbolo, tudo muito vagaroso para não irritar a pedra, não assustar a gaivota... Ia-se lá...

E com meia sardinha na mão, a chamá-la, a modos de quem cativa um gato. O braço esticado, o corpo sempre colado à aspereza daqueles nódolos. Ia-se lá!

Mas antes de lá chegarmos, um bater de asas piado, lúgubre, indolente. Mal-agradecido. Um voo curto e o poiso na amurada, em outra saliência rochosa, talvez. Mesmo ao lado. Com igual expressão parada e curiosa, impassivel. Afinal não amedrontada.

De nada valeria praguejar. Nem dar o tempo por perdido. É assim a Natureza. Apenas se tinha ido lá... escusadamente.

  

 

Cai o pano

João-Afonso Machado, 28.08.11

Já está. Mais um veraneio que termina. Como sempre, à velocidade de um foguete lançado, e com o mesmo assobio da sua passagem, o mesmo estrondo no culminar da sua trajectória. Mas sem pranto nem ranger de dentes.

Agosto tem, entre outras, essa vantagem: é o tempo de arrumar as gavetas da nossa mente, nos intervalos dos costumeiros programas de festas. Ora o meu armário tinha, ainda por cima, sofrido fortes sacudidelas.

De modo que a novela, bem suportada em factos e no meu acervo de proposições escritas, será a fria expressão - tão fria como a tinta da caneta que a redige - de um dos maiores logros por mim presenciados e (azar dos azares) vivenciado. Sem atingir alguém, ninguém mencionando. Nem seria necessário. Os costumeiros anónimos (ou os seus valetes, igualmente anónimos) não deixarão de comparecer, sempre insultuosamente. São conhecidas as regras do jogo: campo aberto, terminologia à medida. Aqui é assim, a milhas do "socialmente correcto". Venham de lá, então, os "Maneis".

Porque continua a ser mais grave lançar um "fdp" à cara de outrém do que a comunidade saber da prática dessa proeza. Não acham?

Isto no domínio das racionais lavagens da alma.

No mais... sábado já acorreremos às codornizes. Moncorvo espera por nós. Há-de estar calor. E só gente sã. Tenho saudades.

 

O fim de férias.

João-Afonso Machado, 28.08.11

Assim todos os anos o sol se põe sobre a época balnear: com uma eucaristia, desta feita em concelebração presidida pelo Padre Vasco Pinto de Magalhães, SJ, no miradouro de S. Martinho.

Excepcionando - quanto à minha aversão pela apologética (siga cada um o seu percurso...) - não consigo deixar de testemunhar aqui a elevação da cerimónia, tão amplamente participada. Nos tempos conturbados que vivemos, a homilia havia de versar a liberdade, esse curioso estado de graça usualmente a sair-nos da pele. Algo por que nos devemos bater, quiçá sofrer, em vez de jogar no totobola em demanda do desafogo, ou de largar mundo fora em busca de caminhos sem barreiras nem escolhos.

A liberdade... uma conquista, não um colchão de molas. Foi isso que todos ouvimos. O que tantos já sabemos - todos quantos, nos momentos de aperto, não optam pela retirada e se refugiam em palavras e escusas desavergonhadamente contraditórias das promessas ou dos propósitos proclamados à lareira, com a chuva a molhar apenas a vida dos outros.

A certeza no amanhã, a liberdade. De mais um dia e mais outro e outro mais, sem discursos moles e incoerentes, na imprescindível construção de relações de confiança. Ao alcance dos capazes de vencer o medo, só deles.

Tudo a propósito da felicidade, já me esquecia.

 

 

Uma feira como deve ser

João-Afonso Machado, 28.08.11

Quando isso sucedeu, achei que estavam atentando gravemente contra a minha liberdade e reagi de forma muito desagradável. Porque não tenho por hábito obrigar quem quer que seja a acompanhar-me a feiras de velharias ou antiguidades, mas não existe poder no mundo capaz de me afastar destes momentos mágicos. De fascínio a tocar as raias da loucura, se quiserem.

A de hoje decorreu em S. Martinho do Porto. Principiei comprando uma miniatura automóvel que já possuia, porque já possuia toda a colecção respectiva. Simplesmente... faltava-me a caixa de origem daquela e o feirante não a vendia separadamente.

Mais à frente, transaccionei a miniatura em outra banca, guardei a caixa e comprei uma Peugeot J7, viatura de apoio no Tour de France.

Depois... Também me questionei se uma velha balança décimal não faria jeito (mas temos uma ainda, operacional), planeei regressar ao Norte de Solex, zero de portagem, pouco mais de combustivel (o pior é o risco de chegar atrasado à diligência judicial de quinta-feira, no Porto...) e mantive-me prudentemente afastado do sector alfarrabista.

Resisti com galhardia às canetas de tinta permanente, aos relógios, às molduras, aos postais antigos, às facas e espetos, à armaria remendada, irremediávelmente peças raríssimas, nos dizeres dos seus proprietários, por vezes quase convincentes.

A tudo resisti. Já sem forças na carteira, é claro.

 

Exposição de pintura em S. Martinho do Porto

João-Afonso Machado, 27.08.11

É hoje a inauguração. A exposição decorrerá até 7 de Setembro próximo na Casa da Cultura José Bento da Silva, em S. Martinho do Porto, e as obras apresentadas inspiram-se aqui na terra. O tema é sugestivo: «Um desafio aos sentidos».

Os quatro trabalhos acima figurados são da autoria da minha sobrinha Margarida de Saldanha. Por isso, caras Amigas e caros Amigos, façam favor. Há que estimular as artes pictóricas nacionais.

 

"Agosto"

João-Afonso Machado, 27.08.11

Seria o vento,

o azul, a maresia,

seria um sorriso,

disfarçado lamento.

 

Seria tudo

o que pudesse ser,

seria um animal

sem o  ver, irreal,

incapaz de acontecer.

 

Talvez uma ilusão,

uma cama, um vício,

moléstia, coração.

 

Talvez um fogo posto.

 

Mas hoje sei:

esse outro ano

não houve Agosto.

 

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