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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Será equívoco?

João-Afonso Machado, 26.05.11

- How do you do, Mr. Anderson?

avançava eu, já quase a estender a mão. Um clarão de luz susteve, porém, a gaffe. Não, o tempo não permanece estático, como as capas dos discos de vinil. Ian Anderson pertence à minha juventude e ao que dela mantenho e tenciono conservar. Os Jethro Tull deixaram de editar, nem mesmo sei se ainda tocam. Quando muito, eis-me perante um neto do grande Ian, talvez o mais velho. O seu sucessor naquela genial arte da flauta transversal.

Embora o rapaz empunhe a gaita-de-foles... E está em Compostela, o malandro! Fugiu de Stonehenge! Em que Heavy Horses? Too Old to Rock & Roll Too Young to Die, será? Pernas para que vos quero Songs From the Wood! Bardo fajuto! This Was, pronto!

Mas depois reparei no ar triste do siberiano, atrelado ao portal, nem por isso apreciador da melodia. Encolhido, quase a pedir um trenó, antes a corrida, as patas enterradas na neve. E percebi, enfim. Estava ali um refugiado político, um monárquico exilado em uma das maiores capitais da Fé protectora.

E, obviamente, deixei-o sossegado e incógnito. Retirei-me discretamente, certo de que encarara, a meia dúzia de metros, um descendente de Nicolau II.

No regresso do passeio ele desaparecera. Qualquer dia encontro-o em Braga. Aposto!

 

 

Os "Bolinhas", antigos "carros de praça"

João-Afonso Machado, 26.05.11

«O Sr. Lopes, um nariz maior do que um repolho sanguíneo, como um tomate maduro, reformara-se já de "chofer de praça". Deixara há muito o seu Austin A40 (um "Bolinhas"), onde, quantas vezes, transportara a minha avó, a minha tia, a minha mãe - e eu com elas -, e sustentava a velhice a vender carrascão e nicotina aos da sua idade e à ganapada. Sobretudo aos de mesada mais comprimida. Um dia reconheceu-me, neto da minha avó, sempre minha, e alto e bom som proclamou este seu achado. Que não, redargui, "está enganado". (Apressei o pagamento dos dois cigarritos que comprara). - "É, é" - teimava o Sr. Lopes. - "Não sou, não sou" - insistia eu. Sim, sim; não, não, - até que disparei pela porta fora, ávido de sol e envergonhado como S. Pedro. Porque, como ele a Cristo, repetidamente renegara, tal o medo de uma denúncia por fumar, a avó com que o Senhor fora servido agraciar-me».

 

(in Famalicão - Recordações de uma Vila, ed. Círculo de Cultura Famalicence)

 

O filme e a "espiga"

João-Afonso Machado, 26.05.11

O circuito é sempre o mesmo: principia na Internet, curva nos jornais e acelera na vasta recta das televisões, até voltar a passar pela zona das redes sociais e dos blogs. De onde eu relato agora.

As imagens da jovem de 14 anos a ser agredida - a pontapé, arrastada no chão pelos cabelos - são de arrepiar. Aquela sova inquestionávelmente deixará marcas para toda a sua vida.

O ódio e a crueldade das que lhe bateram e dos mais, rindo e comentando enquanto fotografavam, é a outra faceta deste apocalíptico percurso.

Mas será desnecessário prosseguirmos nos caminhos do notório (e público): a selvajaria campeia. Entre "meninas" também.

Uma testemunha do sucedido - cinco pêlos sobre o beiço, outros tantos no queixo, o eterno boné de pala, comentava alvarmente perante as câmaras: «filma-se para mostrar depois; a maior espiga foi pôrem na Internet»!...

Pois, não fora esse percalço...

E do lado de quem são expectáveis providências adequadas?

A resposta é simples: os Tribunais de Família e Menores, intervindo numa das mais sensiveis áreas do Direito, são o que são - encurtando razões, de uma impreparação confrangedora; o Ministério Público, já veio esclarecer, não dispõe de meios para detectar crimes divulgados pelas redes sociais; o legislador é brando, excessivamente brando, e tortuoso na tramitação processual por si congeminada; e as instituições de integração social espantosamente irresponsáveis.

Contas feitas, não faltarão atenuantes ou obstáculos à realização de justiça. Conforme-se a vítima com o previlégio de ter sobrevivido - sem sequelas físicas.

E até ao próximo "caso", então. O assunto do dia amanhã já será outro, com certeza.