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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

O Grande Congresso das Bruxas

João-Afonso Machado, 01.05.11

Decorre cá em Portugal, à porta fechada. Mesmo nós, da Comunicação Social, apenas temos acesso ao parque de estacionamento. No Grande Congresso das Bruxas (GCB) a complexidade dos temas não está ao alcance das gentes. Sempre assim foi, e é-o sobretudo este ano.

Por razões de segurança, explicam os encartados em feitiçaria. Não vá algum leigo sair dali transformado em sapo ou a rabiar como uma cobra. O ambiente é pesado e escuro como uma noite de lua nova. Trocam-se acusações mútuas de prática impune de magia negra, todos se querem arautos da magia branca. Salvífica.

Ninguém sabe para quando o fim dos trabalhos. Sobretudo depois das mais recentes intervenções dos convidados oriundos das castelanias onde o vento uiva e a neve se acumula. Ao lado dos quais os nacionais, nossos, cumprem o simplório papel de aprendizes de feiticeiros. E, resmungando embora, acabam obedecendo servilmente ao jugo da fatalidade. Isto é: dos efeitos das varinhas de condão que apontaram aos próprios pés.

Assim os comuns mortais escapem à previsivel guerra de raios e coriscos em que possa acabar o GCB. Sem maçãs envenenadas e com uma sopinha inocente a confortar-nos o dia-a-dia. Abracadabra.

 

Linha do Norte

João-Afonso Machado, 01.05.11

...

Mas eis que tudo se transforma no instante de uma curva da ferrovia. Regressam as estradas marginais, os automóveis a par com o comboio, tão a par que os seus ocupantes quase familiarmente se empenham em conquistar-nos uma qualquer meta, além mais. Voltam também as fábricas, o casario, gados domésticos, renques de eucaliptos. As cores produzidas pela imaginação das gentes… Em resumo, retalhos, a maior parte dos quais de nenhum proveito para a vista. E a tesura dos ciprestes previne a proximidade do cemitério onde jaz, e de onde não volta, a magnitude da lezíria. Estamos chegados a outro planeta.

Ou, numa primeira impressão, a um filme de ficção científica. Multiplicam-se os carris, alargam-se as linhas sem continuidade, dispersas nas décadas. Vai esmorecendo o feroz ritmo em que seguimos, o bastante para sentirmos o esquecimento, a humidade ferruginosa reinante. É o retorno ao caos. Ao luto de tantas carruagens, tantos vagões, apodrecendo nas redondezas. Na envolvência de oficinas que talvez já nem o sejam. Uma lanceta a cravar-se-nos no coração, a do abandono, deixando um rasto oxidado na memória dos viajantes. Porque em quanta daquela sucata não nos assentámos, sabe-se lá quando, confortavelmente instalados, a percorrer o País?