Esperança
Foram séculos assim. A fatia maior da nossa gente arava a terra, semeava o milho, mondava-o, festejava a sua colheita e rejubilava na malha. Um bocado de eira e moinho e o pão nosso de cada dia assegurado. Mais um pedaço de sardinha, a lareira acesa e… saudinha. Era-se feliz. Analfabetamente feliz, saciados os instintos mais básicos. Na exacta medida em que o espaço para a esperança era irremediavelmente curto.
Tempos há muito fora do Tempo. A fasquia, entretanto, subiu em flecha. Sobrevieram os Toyotas e os electrodomésticos. Conhecemos, enfim, o bem-estar. Acomodados, continuámos arredados da esperança. Somente o dia-a-dia era mais confortável.
Lá fora, o mundo conhecia novas perspectivas. A produção dividiu-se em sectores primário, secundário e terciário, sendo o catálogo pouco abonatório para com quem agricultava com vista ao auto-sustento. Com a industrialização da lavoura – algo que nos passou ao lado – fomos vivamente incentivados a abandonar o campo. E a Estatística registou, muito ufana: já só 3% dos portugueses vivem do que a terra dá.
Por isso comemos hoje o que nos vendem os outros, membros ou não da UE. Num contínuo encolher de ombros ante a fatalidade.
É onde retomo o tema da esperança. Que é feito de nós? Do que somos nós capazes?
Aparentemente, de protestar apenas contra o aumento do custo de vida.