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MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

MACHADO, JA

A minha escrita, a minha fotografia, o meu mundo

Um minhoto na Capital

João-Afonso Machado, 19.09.11

Em plena Rua da Conceição, ainda não não sossegara a minha admiração. Aliás: valente susto o meu! Aquele aglomerado de gente, vozes sonantes, até alguns atropelos... Sempre a mesma coisa - pensei - cada vez que um velhinho sofre uma síncope. Raios partam os mirones!

Mas não, percebi depois, tal altercação desenhava vagamente os contornos de uma fila de espera. E quem entrava no estabelecimento, de resto tamanino, pouco se demorava e voltava à rua feliz, empunhando triunfalmente um sorvete lambido com ferocidade.

Ainda me ocorreu parar, encher-me de paciência, aguardar a minha vez... Mas logo sapateei as orelhas, era o que faltava, tanta maçada só por causa de um gelado! E abalei. Sem rumo e sem pressa em rumar.

Cá em baixo, quase à Madalena, dei de caras com ela na paragem. Sempre ela!, depois desse silêncio de lojas encerradas, muito já cobertas pelo véu espesso das teias de aranha.

(Porque será que os lisboetas ligam tão pouco à sua cidade? Apeteceu-me até mandá-los a Barcelos, à feira, ver o que aquilo é de galegos e outros forasteiros e de cores garridas. Enfim...).

Qual não foi o meu espanto, roía os últimos bocados de baunilha, os dedinhos muito esticados, a fugir do polegar e do indicador que brilhavam, escorriam creme.

Cumprimentámo-nos com a cerimónia do costume. Respondendo à curiosidade dos meus olhos, um telegrama apenas:

- Santini. Os melhores do mundo. Chocolate, baunilha, nozes, avelãs..

- Ah! Então é como em Itália?!

Não foi caso de engasganço, mas seguramente não esperava tanta sapiência. Com direito a suspensão do movimento maxilar.

- É, nunca vi lá melhor. E aqui... o Santini...

Pois, adiantei. Também na minha terra a Santinha (a nossa padeira) colectava um corredor de clientes das suas roscas de pão, depois da missa do meio-dia em S. Tiago de Gavião. Na sua furgonete, de porta alçada para a freguesia. Felizmente, as minhas irmãs dispunham-se a um lugar no compasso. Cá por mim, antes a broa de milho do que tanta seca...

Li uma fúria na sua expressão. Arrependi-me de não ter ficado calado. Porque nunca a ouvira dizer-se sem pachorra para esperar o eléctrico e marchar de seguida, sem um adeus sequer.

 

 

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